Guerra
no Iraque
Pesquisadores mostram opiniões divergentes sobre a guerra
Miguel Glugoski, do Jornal da USP
Debate realizado nesta quarta-feira (2) no Itaú Cultural, em São Paulo,
sobre as consequências da guerra no Iraque ficou polarizado em duas tendências.
De um lado, argumentos do professor Braz José Araújo, sociólogo integrante
do Núcleo de Estudos de Política Internacional da USP, que tem posição
favorável aos Estados Unidos, e, de outro, a historiadora Maria Aparecido
Aquino, o físico Mahir Saleh Hussein, ambos professores da USP, e a psicanalista
Maria Rita Kehl, que condenaram a guerra e os motivos apresentados pelo
presidente George W. Bush para iniciar o conflito, apesar da oposição
do Conselho de Segurança da ONU.
Braz Araújo está convencido de que "o que ocorre agora é apenas uma etapa
da luta do governo norte-americano contra o terrorismo", uma reação natural
aos atentados de 11 de setembro em Nova York. Para Maria Aparecida, a
guerra no Oriente Médio dá continuidade a uma estratégia de dominação,
nova na aparência, mas que obedece à orientação que, historicamente, vem
desde o século 19, traçada agora pelos "falcões da Casa Branca", uma guerra
preventiva que certamente representará "um desastre para o mundo".
Maria Rita entende que os ataques terroristas prestaram um desserviço
à paz mundial, aparentemente conferindo certa legitimidade às ações do
presidente Bush, mas considera que bombardear cidades e tirar do poder
um chefe de Estado (Saddam Hussein) é uma péssima forma de combater o
terrorismo e ainda revela "uma visão infantil do mundo".
O professor Mahir discorda de que se trata de guerra ao terrorismo: "O
plano foi escrito pelo atual Secretário de Defesa dos Estados Unidos,
Donald Rumsfeld, e apresentado ao ex-presidente Bill Clinton que o rejeitou.
Foi depois reapresentado ao presidente George W. Bush, que o aceitou e
pôs em prática." Portanto, segundo o professor do Instituto de Física
da USP, o plano de ataque ao Iraque é anterior aos acontecimentos de setembro
de 2001.
O debate, produzido pela STV - Rede SescSenac, foi dividido em três blocos
e teve platéia numerosa, especialmente de estudantes, e a participação
do jornalista Américo Martins, chefe do Serviço Brasileiro da BBC de Londres,
que falou da sede da emissora. Sobre a posição dos ingleses em relação
à guerra, inicialmente contrária depois favorável, Martins disse que se
explica pelo fato de as famílias terem filhos soldados e, iniciado o conflito,
passaram a apoiá-los, embora ainda haja grande contingente de pessoas
que continuam contra. Os ingleses, disse, têm tradicionalmente forte ligação
com as suas forças armadas. O professor Mahir, que nasceu em Bagdá mas
é naturalizado brasileiro, interveio para dizer que "os soldados ingleses
foram arrastados para a guerra, mas, em princípio, os ingleses são contrários
a ela".
Em outro momento do debate, a psicanalista Maria Rita considerou um precedente
perigoso que, em nome da soberania nacional, os Estados Unidos tenham
passado por cima da democracia, representada no caso pelos países integrantes
da ONU. O equilíbrio imposto pela força, segundo ela, é sempre precário
e a partir da guerra do Iraque todos os países podem temer ações do mesmo
tipo. "O ato de desmoralizar a ONU é pior do que o de matar milhares de
pessoas em campo de batalha."
Braz Araújo disse que não se pode ter visão tão catastrófica do futuro,
pois as guerras, embora todos as condenem, fazem parte da história, e
que as opiniões costumam mudar quando a guerra acaba. Assim será, segundo
ele, no Iraque depois da queda de Saddam Hussein, quando a população terá
consciência de que foi libertada do jugo de um ditador. O professor defendeu
ainda, para estranheza do público, que a democracia pode ser imposta à
força, e citou os casos da Alemanha nazista e do Japão, derrotados na
Segunda Guerra Mundial, mas agora com formas de governo democráticas.
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