São Paulo, 26/09/2003


Professor Alfredo Bosi fala de seu ingresso na ABL


Do USP Online

"Não há maior crítico que o tempo: as coisas que não valem, morrem mesmo". A frase é do crítico literário Alfredo Bosi, professor da USP que na próxima terça-feira (30) toma posse da cadeira de número 12 da Academia Brasileira de Letras (ABL), já ocupada anteriormente por França Júnior, Augusto de Lima e Dom Lucas Moreira Neves.

Em entrevista exclusiva ao USP Online, Bosi revela porque se candidatou à ABL. Fala de seus planos, comenta a imortalidade e descreve o papel do crítico literário. E conta ainda quem são seus autores contemporâneos favoritos. Paulistano e com 67 anos, Bosi formou-se em Letras Latinas pela USP e logo depois se tornou livre-docente desta universidade em 1970.

Sua produção bibliográfica é vasta e nela destacam-se obras como O Pré-Modernismo (1966), História Concisa da Literatura Brasileira (1970), a antologia O Conto Brasileiro Contemporâneo (1975), Reflexões Sobre a Arte (1984) e Os Melhores Contos de Ferreira Gullar (1983). Bosi foi vencedor do prêmio Jabuti pelo livro Dialética da Colonização (1992).

USPonline - O senhor já se sente imortal?
Alfredo Bosi - Eu é que sempre faço essa pergunta! Quem foi que inventou essa história de imortalidade? Suponho que se trata de megalomania francesa. A Academia francesa, que influenciou a criação da nossa ABL, foi fundada pelo Cardeal Richelieu, em pleno absolutismo monárquico. Ele tinha a idéia de que a instituição deveria conter pessoas que transmitissem a cultura francesa de geração em geração, de maneira que essa cultura nunca mais desaparecesse. Logo, os acadêmicos começaram a achar que eles próprios eram imortais. Tempos depois, Napoleão assumiu o poder e, considerando muito comuns as roupas dos acadêmicos, criou o tal fardão, com o espadim ao lado, além do chapéu, que eu pretendo não usar jamais.

USPonline - Ao se candidatar para a cadeira número 12 da ABL, o que o senhor buscava?
Alfredo Bosi - A Academia Brasileira de Letras representa uma instituição importante, que desde o tempo de Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Veríssimo, tem abrigado boa parte da intelectualidade brasileira. Como professor da USP, busco estreitar os laços entre a academia a qual pertenço desde a década de 60 e a ABL. Dada a extrema importância e a densidade cultural da USP e de São Paulo, ficamos um pouco afastados do que está ocorrendo na vida cultural do resto do país que ainda é, em boa parte, centrada no Rio de Janeiro. A minha idéia inicial foi fazer - o que talvez seja muito ambicioso - , uma ponte entre a USP e a vida cultural do Rio de Janeiro, especialmente a da Academia.

USPonline - Como o senhor pretende fazer essa ponte entre USP e ABL em termos práticos?
Alfredo Bosi - Trata-se de um grande desafio. Acho que ela já começa a ser feita. O atual presidente da ABL, o embaixador Costa e Silva, um dos seus secretários, o poeta Ivan Junqueira, e crítico Eduardo Portela têm um grande interesse em fazer essa conexão entre a USP e a Academia. Eles têm convidado sistematicamente professores para fazer conferências e palestras na ABL. É importante que o público carioca e o da Academia conheça os nossos intelectuais, não só de Letras, mas de todas as áreas. O contrário também é verdadeiro: grandes críticos cariocas devem vir ministrar cursos e palestras aqui em São Paulo. Cada um dos nomes que lá estão devem se aproximar da universidade, mas para isso é preciso que haja um contato. Pretendo, na medida das minhas possibilidades, estreitar essas relações.

USPonline - Como o senhor se sente agora, ao lado de outros críticos literários? Já trabalhou com a obra de algum dos atuais imortais?
Alfredo Bosi - Os maiores críticos brasileiros fizeram parte da ABL, começando por Silvio Romero e Jose Veríssimo, que são os fundadores da crítica brasileira. Romero escreveu a primeira grande história da literatura brasileira em 1888, quando a Academia ainda não tinha sido fundada. Mas, depois ele continuou escrevendo obras de críticas, algumas muito boas, outras ruins e outras péssimas. Depois dele, José Veríssimo, o segundo na ordem cronológica. É melhor do que Romero porque foi um homem ponderado, crítico, que estudava a fundo as obras, não fazendo juízos apressados e não se deixando levar por paixões; enfim, era um homem que procurava entender um texto. Ele escreveu uma história da literatura brasileira em 1916. Aí a Academia já existia e ele já tivera participado da criação desta como um dos seus fundadores. Mais recentemente temos o crítico carioca Afrânio Coutinho que foi um dos fundadores da crítica estilística no Rio de Janeiro. Atualmente temos Eduardo Portella, ou seja, não faltam críticos na ABL. Escrevi História Concisa da Literatura Brasileira na década de 70, então me ocupei menos dos vivos e mais dos que já possuíam uma obra completa. Nunca fiz uma interferência direta nas obras dos atuais acadêmicos, mas se você verificar com atenção, alguns dos escritores que já estavam escrevendo no final dos anos 60 estão representados. Cito João Cabral de Mello Neto, o Guimarães Rosa, o poeta Cassiano Ricardo. Agora dos atuais acadêmicos, as menções são menos raras.

USPonline - Por que, na opinião do senhor, as eleições da Academia despertam cada vez mais a atenção da imprensa?
Alfredo Bosi - Isso mereceria um estudo sociológico: como uma instituição, que por sua própria natureza, tende a se fechar num universo e fiar-se à tradição, desperta o interesse dos veículos de comunicação de massa. Jornais, emissoras de TV, revistas precisam do fato imediato. A Academia se transforma nisso. Outro ponto é a visibilidade midiática que alguns nomes que pertencem à ABL, ou entraram recentemente possuem. Roberto Marinho faleceu recentemente. Também não faz muito tempo, foi eleito o Paulo Coelho.




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