"Agora será preciso estabelecer uma
lista de pacientes aptos a receber o transplante de ilhotas e a Central
de Transplantes deverá credenciar a UIPH do IQ/USP, o que já está
sendo providenciado." |
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Instituto de Química (IQ) da USP vem realizando pesquisas em que ilhotas
pancreáticas - onde são encontradas as células beta, produtoras de
insulina - de doadores cadáver estão sendo isoladas para tratamento
do diabetes tipo 1. O trabalho, iniciado há oito anos, vem sendo desenvolvido
na Unidade de Ilhotas Pancreáticas Humanas (UIPH) do IQ sob a coordenação
da professora Mari Cleide Sogayar. "Já coletamos e processamos cerca
de 100 órgãos, aproximadamente", afirma a professora. Segundo ela,
"existe a possibilidade da realização de testes em humanos até o final
deste ano".
As ilhotas isoladas são implantadas no fígado do paciente, através
da veia porta. Experimentos realizados na UIPH em ratos, nos quais
o diabetes foi induzido quimicamente, mostram que alguns destes roedores
tiveram a doença revertida. "Alguns pesquisadores estrangeiros implantam
as ilhotas na cápsula renal dos camundongos, mas nós não obtivemos
bons resultados e adotamos o implante no fígado de ratos imunodeficientes
do tipo "nude", explica Mari Cleide.
Inicialmente as pesquisas foram realizadas com pâncreas de cães. A
partir de 1997, a Unidade começou a trabalhar com pâncreas humano.
O isolamento destas ilhotas é feito em um laboratório GMP (Good Manufacturer's
Practice) que possui padrão internacional de qualidade e foi especialmente
instalado para este projeto.
O processo é complexo, pois as ilhotas representam apenas de 1% a
2% do total do pâncreas, sendo o restante (98% a 99%) formado de tecido
exócrino, responsável pela produção de enzimas digestivas. Após o
isolamento, as ilhotas podem ser mantidas em nitrogênio líquido, a
uma temperatura de 190 graus negativos.
Para iniciar os transplantes em humanos, Mari Cleide explica a necessidade
de elaborar um Protocolo de Pesquisa, que descreve, em detalhes, os
critérios de inclusão/exclusão de pacientes, as complicações que podem
ocorrer e, ainda, uma carta de consentimento que deve ser assinada
pelo paciente receptor, após ter sido devidamente informado sobre
o procedimento. "Este protocolo já foi aprovado pela Comissão de Ética
do Hospital Israelita Albert Einstein e pela Comissão Nacional de
Ética em Pesquisa (Conep)", conta a professora. "Agora será preciso
estabelecer uma lista de pacientes aptos a receber o transplante de
ilhotas e a Central de Transplantes deverá credenciar a UIPH do IQ/USP,
o que já está sendo providenciado."
O projeto é apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo (Fapesp), pela Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP),
pelo Hospital Israelita Albert Einstein e pelo próprio Instituto de
Química da USP. A equipe é formada por dez pesquisadores, além da
equipe médica (o endocrinologista Freddy Goldberg Eliaschewitz, a
especialista em transplante Irene Noronha, e os cirurgiões Tércio
Genzini e Marcelo Perosa de Miranda).
Processo artesanal
A professora Mari conta que a maioria das ilhotas isoladas na UIPH
é viva e de alta qualidade. "Os resultados dos nossos testes são muito
bons, quando comparados aos de outros centros internacionais que trabalham
com isolamento de ilhotas", observa Mari.
Para realizar o isolamento, é injetado no pâncreas uma solução de
enzimas digestivas que contêm colagenase. O pâncreas é distendido
(inchado), depois é cortado em alguns pedaços e, em seguida, colocado
numa câmara de digestão, que é agitada suavemente para desmembramento.
O material é colocado em um tubo de centrifugação, resultando em um
material líquido (que é descartado) e um sedimento, que contém, entre
outros materiais, as ilhotas. O sedimento é misturado com Ficoll -
uma solução viscosa usada em Bioquímica para fazer gradientes de densidade
- e centrifugado mais uma vez num aparelho separador de células chamado
COBE. Este procedimento permite separar as ilhotas de células e de
outros materiais indesejados.
Uma vez coletadas, inicia-se o teste de sobrevivência e funcionalidade
das ilhotas, que são avaliadas pela capacidade de produção e secreção
de insulina. Além disso, a professora Mari está investindo esforços
no encapsulamento dessas ilhotas em alginato e em outros materiais,
visando o imunoisolamento. Isso permitiria o transplante na ausência
de imunosupressores. A imunosupressão é necessária para evitar a rejeição
das ilhotas transplantadas, uma vez que é praticamente impossível
encontrar doador e receptor compatíveis.
O transplante de pâncreas (órgão inteiro) e de ilhotas pancreáticas
isoladas visa oferecer alternativas terapêuticas para pacientes que
apresentam hipoglicemia diabética grave ou lesões em decorrência do
diabetes tipo 1 não controlado. A longo prazo, o diabetes pode acarretar
problemas de visão (retinopatia), vasos (má circulação), nervos (neuropatia
diabética) e rins (insuficiência renal).
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