São Paulo, 
design
02/10/2006
Conceitos de design de produtos e "gambiarra" podem estar próximos em suas concepções
Estudo analisa que os dois conceitos, apesar de antagônicos, possuem boa proximidade, visto que o objetivo final é o de criar soluções na forma de objetos para as mais variadas necessidades
Antonio Carlos
Quinto

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Enquanto o termo design está ligado ao que é considerado "nobre ou valioso", a gambiarra é justamente o oposto: "o feio, o lixo, o mal acabado"
A "gambiarra", popularmente definida como práticas que se utilizam da improvisação para gerar soluções pode estar relacionada ao conceito de design industrial. De acordo com o designer Rodrigo Boufleur, as duas atividades estão próximas em suas concepções. No estudo A Questão da Gambiarra, apresentado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, o pesquisador analisa a questão e propõe uma reflexão na tentativa de desmistificar alguns preconceitos que envolvem essas duas práticas.

Segundo definição dos dicionários, gambiarra é um substantivo feminino que se refere a uma extensão elétrica, de fio comprido com uma lâmpada na extremidade; serviço elétrico mal feito para obter energia elétrica de maneira ilegal; ou um rosário de lâmpadas. "Popularmente, a palavra está ligada a tudo que nos remete ao famoso 'jeitinho brasileiro' e à improvisação", diz Rodrigo. Contudo, ele ressalta que, assim como o design, a gambiarra também também visa a atender algumas necessidades específicas.

A idéia de estudar o tema surgiu num trabalho de conclusão do curso de graduação de Rodrigo. Na oportunidade ele criou um instrumento musical "improvisado": um "berimbaixo". O artefato era composto de um cabo de machado e pedaços de ferro, entre outros materiais, e que emitia sons. "Era uma mistura de berimbau com contrabaixo", descreve o pesquisador. Ele conta que não se dedicou a aprimorar a idéia, mas que a elaboração do "instrumento" lhe chamou a atenção já para a questão e a proximidade de concepção entre o design e a chamada gambiarra. "A peça acabou se tornando apenas algo estrutural", lembra.

A partir de 2003, durante o programa de mestrado na FAU, Rodrigo passou a analisar bibliografias, refletir sobre o tema e comparar situações. Como parte da pesquisa, visitou uma Organização Não-Governamental (ONG) na cidade do Rio de Janeiro que se dedica a adaptar artefatos para pessoas com deficiência física. "A idéia é tornar a vida daquelas pessoas mais independente. Eles chegam a desenvolver um produto para cada pessoa e de acordo com a sua necessidade", lembra o pesquisador. "E porque não dizer que se trata de um trabalho também de design?", questiona. Afinal, como ele explica, o design pode ser definido como a criação de um artefato que soluciona um problema ou atende a necessidades específicas.

Glâmur
Enquanto o termo design está ligado ao que é considerado "nobre ou valioso", a gambiarra é justamente o oposto: "o feio, o lixo, o mal acabado". Segundo Rodrigo, apesar de antagônicas, uma pode até inspirar a outra. "Uma gambiarra, se for adaptada em escala industrial, poderá ser considerada posteriormente um design. Assim como um design, se adaptado a uma determinada necessidade poderá ser considerado simplesmente uma gambiarra", compara.

O pesquisador enumerou uma série de 21 motivos que levam as pessoas a criarem objetos com necessidades específicas e que resultam em gambiarras. O pesquisador destaca alguns, como a adversidade. "Quando não se tem nada à mão e se recorre ao improviso. Um exemplo disso é uma lanterna que pode ser improvisada com uma latinha de alumínio e uma vela", descreve. A questão financeira, as necessidades específicas e os consertos improvisados também estão entre os motivos que levam à uma gambiarra. "Podemos destacar também os produtos industriais que possuem obsolescência programada, ou seja, aqueles que têm determinado tempo de existência e são frágeis. Para estender sua vida útil às vezes se recorre a uma gambiarra", explica.

Rodrigo lembra ainda que as gambiarras também exercem um importante papel ambiental, principalmente quando se trata do reaproveitamento de materiais. "Um dos maiores problemas da atualidade são os resíduos sólidos e o lixo é o único recurso em crescimento no planeta", observa. Além dos materiais que habitualmente passam por processos de reciclagem, Rodrigo chama a atenção aos que têm atributos particulares e que são encontrados no lixo. Em seu trabalho, ele os denomina de "lixo rico". "Não é comum, mas já é possível encontrarmos objetos como tubos de TV queimados, display de celulares, rodas de bicicleta ou uma bacia de máquina de lavar, entre outros", garante. Ao invés do destino comum desses materiais, o pesquisador sugere que eles possam ser vistos como "matéria-prima instantânea" para o desenvolvimento de outros artefatos.






· vínculos:
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

· mais informações:
(0XX11) 2157-1257, com Rodrigo Boufleur; e-mail: boufler@usp.br; rboufler@gmail.com

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