"Os clubes de futebol foram atingidos,
tendo que expulsar dirigentes e associados estrangeiros, principalmente
os ligados aos países do Eixo, rotulados como 'Súditos
do Eixo'." |
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Pesquisa
do historiador Alfredo Oscar Salun aponta que na época da entrada
do Brasil na Segunda Guerra Mundial, em agosto de 1942, Corinthians
e Palmeiras foram forçados a expulsar cerca de 150 sócios
de origem estrangeira, inclusive alguns de seus dirigentes. Os dois
clubes estavam entre as entidades atingidas pela legislação
repressora do Estado Novo, especialmente de 1941 até 1945,
quando aumentou o rigor na vigilância da polícia política
aos grupos estrangeiros e seus descendentes.
Equipes mais populares da época, Palestra Itália (antigo
nome do Palmeiras) e Corinthians atraíam grande número
de torcedores de origem imigrante, muitos dos quais operários,
caracterizando-os como times populares. "Quando o Brasil declarou
guerra à Itália, Alemanha e Japão, a vigilância
aos estrangeiros pela Delegacia de Ordem Política e Social
(DEOPS) aumentou, devido a suspeitas de espionagem", conta Salun.
"No Palestra Itália, predominavam os italianos, e no Corinthians
havia também italianos, além de espanhóis, alemães
e até árabes", explica o historiador, que pesquisou
os efeitos das medidas de nacionalização para sua tese
de doutorado no Núcleo de Estudos de História Oral (NEHO)
na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH)
da USP.
Após a entrada do Brasil na guerra, o Conselho Nacional de
Desportos (CND) baixou uma série de regulamentações
para o esporte, em acordo com o projeto nacionalista do regime do
Estado Novo (1937-1945). "Os clubes de futebol foram atingidos,
tendo que expulsar dirigentes e associados estrangeiros, principalmente
os ligados aos países do Eixo, rotulados como 'Súditos
do Eixo'."
Vigilância
A desobediência às normas de nacionalização
poderia levar ao fechamento dos clubes. "No caso do Palestra
Itália, isso gerou rumores não confirmados de que dirigentes
do São Paulo manobravam nos bastidores para tomar seu patrimônio",
relata Alfredo Salun. "Os boatos e a mudança de nome para
Palmeiras, em 1942, tornaram o episódio marcante na história
do clube e dos seus torcedores, ao contrário dos fatos ocorridos
no Corinthians."
A aplicação das leis levou a destituição
do presidente do Corinthians Manuel Correncher, espanhol de nascimento.
"O clube conquistou vários títulos na gestão
de Correncher, considerado uma figura folclórica, comparada
a de Vicente Matheus", conta Salun. "A presidência
foi assumida por Mario de Almeida, interventor indicado pelo CND,
que ocupou o cargo por alguns meses, até o clube escolher um
novo presidente."
"Em um clube é uma história conhecida e celebrada
e no outro, silenciada e apagada", destaca o historiador. Nesse
aspecto, o pesquisador desenvolve um trabalho em História Oral,
com torcedores, jogadores e dirigentes. "Esses clubes não
foram os únicos na capital paulista que foram alvos da repressão,
mas tinham maior torcida e prestígio."
Reuniões de diretoria dos dois clubes só eram feitas
com autorização da DEOPS e a presença de um agente
do órgão. "Os clubes também precisavam de
permissão oficial para jogos fora de São Paulo, especialmente
no litoral, devido a importância estratégica das regiões
costeiras na Segunda Guerra Mundial."
Após as expulsões, Corinthians e Palmeiras realizaram
uma "campanha de nacionalização" para atrair
novos sócios, nascidos no Brasil. "A imprensa da época
viu essa iniciativa como uma prova de patriotismo", diz Salun.
"Os estrangeiros expulsos começaram a retornar aos clubes
após 1945, como reflexo do final da Guerra, de medidas liberalizantes
adotadas pelo governo de Getúlio Vargas e o fim da perseguição
à 'quinta-coluna', espiões e os 'Súditos do Eixo'."
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