" Acho impossível você ganhar essa guerra
no campo da repressão. Estamos gastando dinheiro e energia no lugar
errado. O lugar certo é a família, a escola, outra área que não a
policial. Quando chega na delegacia, na justiça, a guerra já está
perdida". |
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Poder Judiciário, premido pelas leis, pela quantidade enorme de processos
e pelo eventual descaso em fazer uma análise mais cuidadosa de cada
fato concreto, acaba produzindo, muitas vezes, decisões que não primam
pela proporcionalidade entre conduta e pena aplicada. Muitas vezes,
as sentenças não levam em conta, de forma detalhada, as diferenças
individuais entre os condenados.
Na dissertação de mestrado Investigação acerca dos valores morais
associados à conduta de tráfico de drogas e do juízo moral de seus
agentes, o procurador da República Silvio Luís Martins de Oliveira,
da Faculdade de Direito (FD) da USP, analisa os estágios de desenvolvimento
moral encontrados em traficantes presos e mostra que os condenados
nem sempre são os "monstros pintados pela mídia".
Em seu trabalho, Oliveira procurou analisar os argumentos normalmente
encontrados nos discursos pró e contra o uso e o tráfico de entorpecentes,
e ilustrar o problema com algumas entrevistas. Para tanto, ele ouviu
6 presos, que cumprem pena por tráfico de drogas.
Tratando-se de um procurador da República, seria esperado que a conclusão
fosse rígida, privilegiando a repressão. Contudo, tentando fugir disso,
Oliveira buscou encarar a dissertação da maneira mais desarmada possível.
"A conclusão contrariou o que eu pensava de início. Me livrei de preconceitos
e cheguei a uma conclusão mais para o lado liberal do que para o conservador".
Segundo Oliveira, "essa não é a conclusão direta do trabalho, mas
a idéia que se extrai disso tudo é que a repressão contra o uso e
o tráfico de drogas, nos últimos 100 anos, não levou a lugar nenhum
e não parece que vai levar". Apesar de a amostragem ser insuficiente
para a definição do perfil do homem condenado por tráfico de drogas,
fica claro que nenhum preso é igual ao outro.
Novas soluções
"Tenho observado que existe uma diferença em termos de responsabilidade,
comportamento, moral e interpretação de valores entre os presos. Se
os que estão presos não são iguais, porque devem se sujeitar à mesma
rigidez? Essa generalização é injusta. A lei acabou nivelando por
baixo. O simples fato de conversar com alguém condenado por tráfico
já desmistifica toda uma idéia de que aquela pessoa é um monstro",
revela o procurador.
"A idéia normal da Polícia, do Ministério Público e do Judiciário
é no sentido da repressão. Continuo achando que a droga é um mal.
Ela é algo imprevisível e é justamente esse o perigo. Acho impossível
você ganhar essa guerra no campo da repressão. Estamos gastando dinheiro
e energia no lugar errado. O lugar certo é a família, a escola, outra
área que não a policial. Quando chega na delegacia, na justiça, a
guerra já está perdida".
Essa riqueza do ser humano faz com que uma lei de caráter geral se
torne injusta para determinados casos. Talvez um juiz pudesse fazer
essa avaliação. Mas o volume de trabalho é tão grande que o seu contato
com o traficante é muito pequeno. Como solução para a melhora do sistema
judiciário do País, o pesquisador sugere que as leis devem ser feitas
com base em estudos de criminologia e não sob a influência de casos
concretos isolados. "Em geral elas são feitas de forma muito emocional
como no caso do seqüestro de um ônibus no Rio de Janeiro, em que uma
mulher foi morta. Não há um estudo científico no Brasil nesse âmbito",
lembra ele.
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