São Paulo, 
USP 70 anos
27/01/2004
Teledramaturgia ganha caráter científico com trabalho do Núcleo de Telenovelas
Criado em 1992, o Núcleo de Pesquisa em Telenovelas da ECA foi pioneiro, no meio acadêmico, na pesquisa e na documentação da produção de telenovelas. Um incêndio em 2001 destruiu parte do acervo
Lucas
Telles

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Existe muito preconceito em relação à telenovela, no entanto ela é o produto cultural brasileiro de maior audiência, maior influência na sociedade, o mais sofisticado na produção da televisão aberta e exporta a cultura brasileira para mais de 140 países
O Núcleo de Pesquisa em Telenovelas (NPTN) da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP foi o primeiro grupo acadêmico do mundo formado com o objetivo de pesquisar e documentar a produção da telenovela. O desconhecimento do público e ainda de muitos pesquisadores acerca do Núcleo contrasta com o respeito de profissionais de televisão e de grupos de estudo especializados, que o têm como principal referência na área. "Várias vezes ouvi pessoas comentarem diante da nossa porta: 'aqui não sei o que fazem, são só umas mulheres que ficam assistindo novela", recorda a pesquisadora Maria Ataíde Malcher, do NPTN .

Em outubro de 2001, um incêndio destruiu todas as instalações, equipamentos e o arquivo de materiais sobre telenovelas do Núcleo. "Alguns professores perderam registros de décadas de trabalho e todo o memorial acadêmico e pessoal que tinham em suas salas. As pesquisas tiveram de ser adequadas a uma nova realidade, mas nos esforçamos para não interrompê-las. Nos anos seguintes, conseguimos promover encontros de dimensão inédita, com os maiores pesquisadores estrangeiros e assim tentamos renovar o nosso empenho."

Um dos principais prejuízos causados pelo incêndio foi a perda de um acervo com mais de três mil exemplares de fitas de vídeo, fitas K7, recortes de jornal, revistas, álbuns, pôsteres, suplementos, livros, teses, roteiros, discos, fotografias e sinopses de telenovelas.

O material havia sido reunido a partir de doações de coleções particulares, de órgãos públicos e empresas. "O antigo acervo tinha materiais de todas as emissoras, com raridades como roteiros e capítulos da TV Tupi. A campanha que estamos promovendo para montar um novo - SOS Telenovela: O que Você Guardou de Lembrança pode Ajudar Nossa Memória - não deve recuperar aqueles documentos, mas está reunindo outras raridades."

Desde sua fundação, em 1992, o NPTN produziu seis dissertações de mestrado, sete teses de doutorado, formou dois livres-docentes e publicou nove livros. Atualmente, outras dez defesas estão sendo preparadas. "Hoje vemos que mesmo pesquisadores brasileiros que vão estudar no exterior acabam ligando para a gente, porque a bibliografia vem daqui. No meu mestrado, em 2001, fiz um esboço avaliando as publicações sobre ficção televisiva seriada antes e depois da criação do Núcleo. Verifiquei que todo o material que pude obter, publicado depois de 92, citava direta ou indiretamente nossos trabalhos, quando não eram os próprios", diz Maria Ataíde.

Os trabalhos já realizados tratam de assuntos como a história e antecedentes do gênero, questões sobre a autoria, sobre a linguagem e a relação com o cinema, a seleção de elenco, a influência da tecnologia na produção, relações das novelas e minisséries com a política, com o cotidiano, com a religião, questões raciais e de movimentos sociais, recepção do público infantil e uso da telenovela na pedagogia, entre outros.

Há aproximadamente dois anos, o Núcleo criou uma linha de pesquisa específica, intitulada Comunicação e Ficção Televisiva. Ela possibilita a multiplicação dos conhecimentos da área e a formação de novos mestres e doutores. Além disso, novas temáticas vêm sendo abordadas, como por exemplo, a da internacionalização da telenovela - ou seja, os processos para a exportação, as negociações, as mudanças pelas quais esse produto passou e a recepção do público.

Tratamento científico
Na opinião da pesquisadora Maria Lourdes Motter, atual coordenadora do NPTN, o principal feito do Núcleo foi legitimar a telenovela como um objeto digno de pesquisa científica. "Existe muito preconceito em relação à telenovela, no entanto ela é o produto cultural brasileiro de maior audiência, maior influência na sociedade, o mais sofisticado na produção da televisão aberta e exporta a cultura brasileira para mais de 140 países."

Segundo a pesquisadora, o Núcleo criou novas categorias para o estudo da telenovela brasileira, considerando suas diferenças com outros tipos de arte, como o cinema e o teatro, e também com tipos de novelas produzidos em outros países, como os EUA e o México.

"A telenovela mexicana conta uma história do tipo conto maravilhoso, com falhas grosseiras para os nossos padrões de interpretação, figurino, iluminação. No Brasil, temos histórias complexas, com eixos principais e tramas paralelas, com reconstituições de época, elementos de suspense, de humor, de problemas sociais."

Questões como reforma agrária, violência, drogas, alcoolismo e homossexualidade vêm sendo continuamente tratadas nas produções brasileiras, o que, segundo Lourdes Motter, contribui para ampliar discussões, pautar a imprensa e influenciar a agenda social e política do País. "Mas nem toda temática social tratada na novela tem boa repercussão, para isso é preciso usar a arte e sensibilizar. Cada coisa pode estar sendo bem ou mal feita e este papel de avaliar cabe aos estudiosos."





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Escola de Comunicações e Artes

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(0XX11) 3091-4373, no Núcleo de Pesquisas de Telenovelas, ou pelos e-mails aataide@usp.br e gpnovela@usp.br

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