São Paulo (AUN - USP) - Um dos fatores de pouca estabilidade na polÃtica externa dos paÃses latino-americanos é atuação limitada dos congressos nacionais em temas internacionais. à o que observa o doutorando Pedro Feliu Ribeiro. Feliu é integrante do projeto Legislativos nacionais, democracia e polÃtica externa: um estudo comparado entre Argentina, Brasil, Chile e México, coordenado por Janina Onuki, professora do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP. O estudo pretende averiguar a atividade dos congressos nacionais dos paÃses da América Latina na agenda de polÃtica externa.
Feliu observa que o Legislativo deveria intervir nos assuntos internacionais de forma mais ativa. Nesses temas, os congressos da América Latina participam apenas como um ator ex post facto (após o fato), ou seja, a iniciativa na polÃtica externa parte do presidente e do Ministério das Relações Exteriores. âO Legislativo passa a ser um árbitro dessa polÃticaâ.
Nos Estados Unidos, graças ao poder de veto sobre as decisões presidenciais, o Congresso tem uma atividade significativa sobre os assuntos internacionais. O mesmo não ocorre no Brasil. O Legislativo brasileiro não está investido da prerrogativa de articular a polÃtica externa. Sua competência é apenas a de aprovar ou rejeitar as formulações do Executivo.
No Brasil, o Poder Executivo concentra fortemente a atividade de produção de leis. Cerca de 80% das normas brasileiras são oriundas de iniciativas do Executivo. Na polÃtica externa, essa tendência é ainda mais acentuada.
O desinteresse de deputados e senadores pela polÃtica externa deriva do impacto limitado dos temas da agenda internacional nas eleições para o Congresso. Além disso, as instâncias do Poder Legislativo não possuem a mesma capacidade operacional das agências do Executivo para conduzir a polÃtica externa. Contudo, a perspectiva do Brasil se converter, nas próximas décadas, numa importante potência regional tem produzido mudanças nesse quadro.
âAgora, com Honduras, por exemplo, o Congresso já prepara uma comissão para ir lá negociar algumas garantias para a embaixada brasileiraâ, afirma Feliu (a missão foi enviada a Tegucigalpa no dia 30 de setembro).
âà difÃcil separar o que é oportunismo eleitoral porque o tema é vigente na imprensa.â O pesquisador considera que os parlamentares sempre almejam a reeleição. Por isso, essa visibilidade é importante. âMas acho que isso é reflexo de algo maiorâ, diz ele. à o que sugerem as 15 emendas constitucionais tramitando no Congresso cujo tema central é o aumento das prerrogativas constitucionais do Legislativo na condução da polÃtica externa.
A participação ativa do Legislativo nos assuntos internacionais beneficia muito a polÃtica internacional de um paÃs. Uma vez que o Congresso produz documentos e promove consultorias, há uma elevação no volume e na qualidade das informações disponÃveis para os gestores do Executivo. Além disso, o Congresso promove o acesso de grupos de interesse no debate polÃtico e também provê maior estabilidade à polÃtica externa.
âNa medida em que o Legislativo cria um ponto de veto forte, não tem risco, por exemplo, de um presidente mudar completamente a polÃtica externa porque ele vai ser vetado várias vezes pelo Congresso. Então, isso gera uma estabilidade maior nos acordosâ, observa Feliu. âAgências que dão grau de investimento aos paÃses consideram, entre outros pontos, a assertividade Congresso na polÃtica externa justamente por causa disso.â
PolÃticas públicas
Averiguar o impacto da ideologia dos partidos polÃticos na agenda internacional dos paÃses estudados é também um dos objetivos da pesquisa. Não obstante, um dos achados mais importantes, até o momento, é que não existem diferenças significativas no modo de realização das votações nominais entre os temas da polÃtica externa e os assuntos referentes a qualquer outra polÃtica pública.
âNos quatro paÃses estudados, o padrão decisório é muito semelhante ao das polÃticas públicas. Há um fator ideológico importante, mas o governo Lula, por exemplo, mostrou que é mais forte a relação governo/oposição do que a ideologia propriamente ditaâ, diz Feliu. âNo governo Lula, você tem o PT tradicionalmente à esquerda, coligado ao PDT, mas junto com o PTB, PMDB, PR. Todos esses partidos votam junto com o PT e isso não acontecia antes.â
Feliu observa que o chefe do Executivo exerce uma força primordial nesse jogo polÃtico. à o chamado âpresidencialismo de coalizãoâ. O presidente amplia e diversifica sua base entre os partidos no congresso e assim tem uma maior capacidade de formar maioria para determinar sua própria linha de polÃtica externa.