São Paulo (AUN - USP) - A Agência Européia Espacial (ESA, da sigla em inglês) lançará, em 2012, um satélite para fazer mapeamento em terceira dimensão da galáxia. Chamado de Gaia, o satélite faz parte de uma missão ambiciosa que pretende revelar novos dados sobre a composição, formação e evolução da galáxia.
Esse será o segundo mapeamento 3D da Via Láctea. O primeiro foi realizado entre 1989 e 1993, pelo satélite francês Hipparcos. O esboço do Gaia já fora previsto logo após o lançamento do Hipparcos, quando tiveram a idéia de um novo satélite astrométrico. Uma das diferenças da primeira missão para o projeto atual da ESA é que o Gaia possibilitará informações mais abrangentes da galáxia.
O professor da USP, Ramachrisna Teixeira, afirma que âo que muda com o Gaia é o alcance, a precisão e quantidade de dadosâ. Para exemplificar a diferença de proporções entre as duas missões, o professor comenta: âPara se ter uma idéia, basta citar que, com o satélite Hipparcos, foi possÃvel medir distâncias com boa precisão de aproximadamente 40 mil estrelas, com o Gaia esse número deve passar de 200 milhões. Com Hipparcos foi possÃvel obter distâncias significativas até, aproximadamente, 500 anos luz, com o Gaia espera-se obter valores significativos para dezenas de milhares de anos luzâ.
Para a compilação dessa quantidade de estrelas, o projeto aproveita a medição da paralaxe estelar, método pelo qual os astrônomos determinam a distância da estrela para a Terra. A paralaxe estelar consiste no movimento angular aparente de uma estrela no céu quando observada dos lados opostos da órbita da Terra ao redor do Sol. O método tem suas limitações se feito da Terra, devido ao tamanho da órbita do planeta. Porém, o satélite Hipparcos superou esses limites durante seus três anos e meio de observação.
Já o Gaia proporcionará medidas ainda mais apuradas. âCertamente, após o Gaia teremos outra visão de nossa Galáxia e do Universo como um todo. Tudo deve se passar como se alguém, com uma visão muito ruim, enxergando o pouco que vê de forma embaçada, passasse a enxergar perfeitamente, distinguindo contornos, diferenças, cores, etc.â, explica o professor Ramachrisna, usando uma analogia.
Aspectos técnicos
As observações devem durar cinco anos, tempo suficiente para a captação de todos os dados necessários. O satélite orbitará ao redor do Sol, a uma distância de 1,5 milhão de quilômetros da Terra. A órbita que fará é conhecida como L2, ou segundo ponto de Lagrange, que é uma homenagem a descoberta do matemático francês Joseph Louis Lagrange. A órbita L2 oferece a vantagem de observações ininterruptas, desde que a Terra, a Lua e o Sol estejam dentro da órbita do ponto L2. Deste, toda a esfera celeste pode ser observada no curso de um ano.
O Gaia se constitui de dois telescópios separados por um ângulo muito estável e bem conhecido. Conforme o satélite gira, ele varre o céu com pequenas alterações de seu eixo de rotação, processo este que será feito várias vezes na missão. No plano focal dos dois telescópios, haverá um arranjo de CCDs (sigla em inglês de dispositivo de carga acoplada), mesma tecnologia utilizada na sensibilização da luz nas máquinas fotográficas digitais.
Isso permitirá fazer medidas astrométricas e espectro-fotométricas. As primeiras permitem conhecer as posições, os movimentos próprios e a distância dos objetos observados. Já as medidas espectro-fotométricas fornecem a velocidade radial, o brilho aparente e as cores destes. Além disso, a missão também poderá realizar medidas astrométricas com observações oriundas de outros satélites, como o Hubble.
De acordo com informações do site da ESA (http://sci.esa.int/science-e/www/area/index.cfm?fareaid=26), dentre os objetos previstos de serem observados, estão: planetas ao redor de outras estrelas, asteróides no nosso sistema solar, material congelado de fora do sistema, anãs marrons e supernovas muito distantes.
Preparação e participação brasileira
Enquanto o satélite ainda não é lançado, a agência européia faz suas preparações para a missão espacial. Durante o perÃodo em que surgiu a idéia do Gaia até a elaboração do projeto, diversos estudos foram feitos e tecnologias avançadas foram desenvolvidas. Um dos desafios da missão será colocar o satélite em órbita. Para isso, ele será lançado por um foguete, onde o satélite estará contido por três módulos funcionais.
Apesar de a missão ser essencialmente européia, há cientistas do mundo inteiro participando. O Brasil colabora com pelo menos três pesquisadores: Alberto Krone Martins, aluno de doutorado do Instituto de Astronomia, GeofÃsica e Ciências Atmosféricas da USP (IAG/USP), Eduardo Janot Pacheco, professor do IAG, e Alexandre Andrei, do Observatório Nacional (localizado no Rio de Janeiro).
Alberto Krone colabora com seu trabalho de doutorado, que está centrado na preparação da missão espacial no que se refere à s observações de objetos extensos (galáxias, nebulosas...) e à s chamadas âfontes secundáriasâ ou âfontes perturbadorasâ. No primeiro caso, Krone identifica as galáxias, as classifica morfologicamente de forma simplificada e obtém uma boa astrometria. Sobre âas fontes perturbadorasâ, a pesquisa do aluno de doutorado consiste em ajudar a missão a identificá-las. Fontes perturbadoras são objetos relativamente fracos que podem estar no campo de um objeto observado pelo Gaia, o que perturba a solução obtida para as medidas de grandezas, como movimentos e distâncias.
Mais informações: http://sci.esa.int/science-e/www/area/index.cfm?fareaid=26