ISSN 2359-5191

29/05/2002 - Ano: 35 - Edição Nº: 10 - Sociedade - Centro de Estudos da Violência
Continuidade de práticas de tortura volta a ser denunciada

São Paulo (AUN - USP) - A recente divulgação do relatório sobre a morte de Fernando Dutra Pinto recolocou em pauta o tema da tortura e maus tratos. O relatório foi elaborado pela Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos, a CTV, cuja presença no caso deu-se por um convite da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Para acompanhar os trabalhos da polícia médica oficial, a comissão, por sua vez, solicitou a colaboração da USP com a indicação de um médico patologista da Faculdade de Medicina, Paulo Hilário Nascimento Saldiva.

Sobre o envolvimento da universidade neste caso, o coordenador-executivo da comissão, Fernando Salla, diz que sempre que a CTV ou o Centro de Estudos da Violência (CEV) se envolve em situações como esta, eles solicitam a presença de mecanismos que dêem apoio, sustentação e confiabilidade aos procedimentos adotados. O caso de Fernando Dutra Pinto mostrou que esta intervenção é importante para dar clareza, apresentar novas hipóteses e envolver a USP com os problemas da comunidade, diminuindo o distanciamento tão criticado. “O ganho é para todo setor”, afirma Salla.

O papel da comissão foi colocar em dúvida os resultados obtidos por Saldiva. Todos os argumentos deveriam se sustentar para que o resultado fosse o mais confiável possível, isento de qualquer dúvida, já que a universidade estava sendo envolvida publicamente. O laudo apontou como causa da morte uma infecção pulmonar ocasionada por bactéria que se alastrou a partir de um ferimento nas costas. Além de questionar esta conclusão, a CTV procurou informações dentro do contexto do sistema prisional que pudessem sustentar esse argumento baseado em exames. E essas informações existiam: houve tortura e maus tratos, além de atendimento médico insuficiente e tardio que, aliados, agravaram o quadro clínico em um tempo tão curto.

Esta questão delicada que é a manutenção da tortura dentro das prisões foi levada ao conhecimento de autoridades públicas. A Ordem dos Advogados do Brasil já tinha chamado a atenção para esta situação, mas nada havia sido providenciado. “É impressionante como temos continuidade das práticas, como ela é muito pouco alvo de punições.” Não há afastamento dos policiais envolvidos – muitas vezes eles são apenas deslocados de função dentro da mesma unidade –, continuando a ser uma presença ameaçadora e intimidadora. Mesmo tendo uma situação constitucional favorável, um regime democrático e instrumentos legais para combater há dificuldade na superação destes problemas, na quebra desta rotina. Para Salla, acabar com a impunidade, somado a outros procedimentos, é um dos passos para extinguir a tortura e maus tratos.

A importância do relatório, segundo Salla, foi colocar a questão da tortura como presente. “Ele não trouxe dados novos, mas a questão foi recolocada. As pessoas ficam incomodadas, dando apoio ou xingando.” O debate, então, é trazido à pauta política, para que não fique uma questão técnica: “precisamos combater a criminalidade, comprar mais carros, equipamentos, colocar a Rota... Além de ser técnica, a questão é fundamentalmente política.” Ele sabe que estes são aparelhos resistentes a mudanças e a inovações. “E é por isso, com certeza, que há manutenção da impunidade e continuidade da prática da tortura no Brasil.”

Leia também...
Agência Universitária de Notícias

ISSN 2359-5191

Universidade de São Paulo
Vice-Reitor: Vahan Agopyan
Escola de Comunicações e Artes
Departamento de Jornalismo e Editoração
Chefe Suplente: Ciro Marcondes Filho
Professores Responsáveis
Repórteres
Alunos do curso de Jornalismo da ECA/USP
Editora de Conteúdo
Web Designer
Contato: aun@usp.br