ISSN 2359-5191

30/08/2002 - Ano: 35 - Edição Nº: 15 - Sociedade - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia
Projeto com índios alia prática clínica e intercâmbio cultural

São Paulo (AUN - USP) - Trabalho de extensão realizado pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP alia atividade social e prática veterinária, cuidando de animais das comunidades indígenas guarani localizadas na zona sul de São Paulo, no bairro de Parelheiros. Alunos do quarto ano de graduação, da disciplina “Gerenciamento em saúde pública e saúde animal”, bem como voluntários, atendem as aldeias Krucutu, com aproximadamente 200 pessoas e Morro da Saudade, onde vivem em torno de 700.

As tribos, nômades, vivem de caça, pesca e artesanato. Localizados próximos à represa de Guarapiranga, em que os peixes são contaminados, a terra é ruim para plantar e não há caça, nem sementes para fazer colares, ao índios vão e voltam para o litoral. Devido às condições tão precárias de sobrevivência, a alimentação das quase 160 famílias – somando as duas aldeias – vem basicamente de doações e é insuficiente. As crianças são subnutridas e muitas vezes morrem por falta de comida.

O projeto “Aldeias Krucutu e Morro da Saudade”, que irá completar dois anos em outubro, começou a convite da Seção de Assistência Comunitária do Instituto da Criança, ligada à Faculdade de Medicina (FM) da USP, que cuida da saúde dos guaranis. O tratamento médico precisou de acompanhamento veterinário porque os índios – principalmente as crianças – têm contato estreito com gatos e cachorros, que acabam transmitindo doenças como sarna, carrapato, piolho, bicho de pé e verminoses.

No primeiro semestre de 2001, começaram os treinamentos das equipes e o preparo do material para, em julho, iniciar as atividades junto à comunidade indígena. Sob a coordenação da professora Sônia Regina Pinheiro, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva (VPS), os alunos tratam dos animais, cadastrando-os e dando-lhes remédios e vacinas. Também realizam atividades educativas com a tribo.

Os resultados parciais são significativos: a população de cães e gatos ficou mais saudável, houve redução das doenças referidas acima na comunidade. Isso possibilitou ao Estado aplicar os R$15,00 por criança, gastos até então, em outras áreas. Mas a solução gerou um novo problema. O desequilíbrio do ecossistema triplicou o número de animais. Hoje eles são aproximadamente 50 em Krucutu e 100 em Morro da Saudade. Pelas estimativas dos alunos da FMVZ, para cada criança nascida, nascem em proporção 13 cães e 45 gatos.

Para contornar a superpopulação e restabelecer o equilíbrio, a equipe de Sônia propôs à aldeia esterilizar os animais. Os índios não estão convencidos de que querem isso, então haverá um teste com um pequeno número de animais para que as mudanças possam ser observadas e a decisão tomada pela tribo. A professora acredita que os índios aceitarão a idéia. “Eles já perceberam que não há comida para todos, porque os animais comem o mesmo que eles e, além disso, os turistas não apreciam o excessivo número de cães e gatos”, diz.

Convivendo com a diversidade cultural

Sônia lembra que trabalhar com os índios é um constante desafio. “Não se pode olhá-los a luz dos nossos princípios de ‘homem branco’. É preciso buscar sempre a forma como eles estão pensando.” Por problemas de diferença cultural, muitos erros foram cometidos no começo do programa.

O principal deles foi a forma de registrar os cães e gatos: inicialmente esse registro era feito pelo nome não-guarani que a criança que levava o animal para ser examinado desse aos veterinários, pois eles não entendiam guarani. Mas as crianças mudam com freqüência esse nome, uma vez que a identidade é dada pelo nome guarani. Além disso, os cachorros e gatos não têm dono, porque tudo é comunitário; assim, em cada ocasião o animal era trazido por uma criança diferente. Foi adotado um método de etiquetas num colar, com a numeração correspondente à ficha. Mas ainda assim há dificuldades. “A etiqueta não pode ser muito colorida ou bonita, pois nesse caso as crianças colocam sem seu próprio pescoço como enfeite”, comenta Sônia.

Apesar dos obstáculos, a coordenadora acredita em ganhos para os dois lados, índios e alunos. Segundo ela, os primeiros têm a chance de melhorar sua qualidade de vida com os programas de assistência. Eles buscam, ajudados pelo projeto, criar alternativas para os meios tradicionais de sobrevivência, sem perder a identidade. Os alunos, por outro lado, aprendem a trabalhar em situações adversas. “Nas aldeias não há luz, a água vem do rio, e não há dinheiro. Eles precisam adaptar o conhecimento adquirido em laboratório a uma situação de pobreza extrema.”

O projeto caminha para formular um modelo de ação a ser estendido a outras comunidades indígenas próximas a centros urbanos do País. Ainda em São Paulo, no Pico do Jaraguá, há outra comunidade guarani, que não é atendida pela FMVZ. Ela convida unidades da USP e outras faculdades para participarem do projeto, para que ela se torne multidisciplinar e possa se ampliar, até fisicamente. “Cada faculdade pode ajudar na sua especialidade: Agronomia, Educação, Comunicação”, conclui.

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