ISSN 2359-5191

10/07/2012 - Ano: 45 - Edição Nº: 66 - Sociedade - Instituto de Ciências Biomédicas
Alternativas para a “infantilização moral” da USP

 

São Paulo (AUN - USP) - Um mundo ideal é um mundo povoado por pessoas autônomas. Elas agem eticamente porque elas acreditam que essa é a forma correta de coabitar no planeta. Entretanto, a partir do momento em que a Universidade de São Paulo (USP) impõe uma infinidade de normas éticas às pesquisas de seus professores, ela dá a entender que se não houvesse essa selva de regras, as pessoas estariam perdidas e não agiriam com ética alguma.

 

“Às vezes a USP parece uma grande creche, cheia de educadores para controlar o que estamos fazendo. É esse posicionamento que nós chamamos de infantilização moral, pois ele pressupõe que somos incapazes de pensar por nós mesmos”, argumenta o professor Ives De La Taille, do Instituto de Psicologia (IP-USP), em palestra recente que aconteceu no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB-USP).

 

Segundo o professor, a área da psicologia moral se ocupa basicamente com três perguntas. A primeira delas seria: “Existe um desenvolvimento moral ou apenas aprendizagem?”, seguida de “Se houver desenvolvimento, quais são as fases desse desenvolvimento?”. Por fim, a última pergunta seria: “Quais são os processos pelos quais uma pessoa passa de uma fase para outra?”

 

Teoricamente, os pesquisadores nessa área pressupõem que existem 3 estágios de desenvolvimento. O primeiro deles seria a Anomia, caracterizada pela ausência de senso moral e completo controle externo. Normalmente, condiz com a fase das crianças entre 0 e 4 anos de idade. O segundo estágio é a Heteronomia, na qual o controle torna-se semi-interno, condizente com a fase das crianças entre 4 e 10 anos de idade. Por fim, nós temos o estágio de Autonomia, cujo controle é puramente interno. A pessoa faz determinada ação convencida de que essa ação é correta, independente de qualquer controle externo ou regra de prestígio.

 

Segundo De La Taille, na heteronomia a legitimação da regra moral se dá por uma fonte externa (autoridade). “Eu sou heterônimo cada vez que o prestígio de uma fonte externa é o que me faz cumprir uma regra”, diz. Por esse motivo, o estágio de heteronomia possui três características básicas: obedece-se a regra e não o princípio, o respeito é unilateral, a pessoa acaba sendo incoerente, por desobedecer às regras que ela acredita estar seguindo.

 

Uma alternativa a isso, segundo o professor, seria passarmos por um período de dois anos sem criação de regras novas na universidade. “Seria um exercício novo, no qual nós levaríamos as regras para o segundo plano e nós traríamos para o primeiro quais são os princípios que regem essas regras. Quais são os princípios que estão por trás de todas as regras que temos na USP?” questiona o professor. Essa discussão precisa ser feita no seio da comunidade universitária, para que os indivíduos possam ter a autonomia de refletir sobre o peso das suas ações.

 

O paradoxo das regras éticas
Uma chuva de regras e normas tem se abatido no mundo inteiro, em especial no Brasil. É proibido fumar, é necessário exames médicos para tirar habilitação, é proibido dar palmada nos filhos, é obrigado votar, é proibido humor durante a campanha eleitoral, é proibido o uso de celular durante as aulas... Esses são alguns exemplos de regras às quais estamos submetidos diariamente.

 

Segundo De La Taille, nós devemos nos perguntar: essas regras são boas ou ruins? Para responder a essa pergunta, devemos ver o que elas proíbem ou impedem. A maioria das pessoas há de acreditar que elas são regras boas, portanto. Há alguns problemas nisso, porém.

 

Como as pessoas tendem a achar as regras boas, há uma tendência em universalizá-las. As normas são transferidas de uma instância a outra (como muitas regras da medicina são aplicadas à psicologia, por exemplo) e isso gera muito transtorno. Outro problema é a constante ocorrência de situações para as quais não há regras, nas quais as pessoas ficam perdidas, explica o professor.

 

Há de se citar ainda o paradoxo que as normas éticas carregam. “A rigor, porque se cria uma regra? Freud diria que se há proibição, há desejo. Sendo assim, as regras pressupõem o que elas negam. Se o homem diz não, é porque alguém quer o sim. A imposição de uma regra implica o fato de que há pessoas que não a cumpririam caso ela não existisse. As regras insurgem da desconfiança e pressupõem que as pessoas não são éticas”, finaliza De La Taille.

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