ISSN 2359-5191

23/10/2002 - Ano: 35 - Edição Nº: 22 - Saúde - Instituto Butantan
Butantan estuda efeitos locais do veneno de Jararaca

São Paulo (AUN - USP) - Estudar os mecanismos de ação do veneno das serpentes do gênero Botrohps nos locais onde ocorrem as picadas, descobrir quais toxinas do veneno causam os efeitos nocivos nos humanos, e tentar produzir soros mais precisos e esquemas terapêuticos mais eficientes. Esses são alguns dos principais objetivos da série de estudos realizados na Unidade de Inflamação do Laboratório de Farmacologia do Instituto Butantan. "A mais importante espécie do ponto de vista clínico é o Botrohps jararaca, pelo número de acidentes que ele causa, pela gravidade dos acidentes", diz a coordenadora da Unidade de Inflamação e diretora do Laboratório de Farmacologia, Catarina de Fátima Teixeira. "Esses acidentes são caracterizados por reações sistêmicas – que levam a alterações da coagulação sangüínea – e por alterações locais", completa.

Catarina explica que o principal tratamento das pessoas picadas consiste na aplicação do soro anti-veneno (produzido no próprio Butantan), que é eficiente na neutralização da reações sistêmicas, mas praticamente não atua sobre as reações locais. "Embora o indivíduo sobreviva, ele adquire seqüelas, que muitas vezes são a perda das extremidades, ou do tecido onde houve a picada, porque essa reação local progride para a necrose", lembra a pesquisadora, complementando que as reações locais são de natureza inflamatória e miotóxica (as toxinas degradam o tecido muscular). Além disso, há uma intensa dor na região da picada – o que também é estudado.

Reações

A pesquisadora Stella Regina Zamuner informa que o veneno é proteolítico (quebra proteínas, o que ajuda na digestão, pois as serpentes engolem suas presas inteiras), coagulante e hemorrágico. Ela explica que há ações diretas de componentes do veneno que provocam as reações locais, além de ações indiretas, como a indução da liberação de substâncias endógenas pró-inflamatórias. Isso acontece normalmente para proteger o organismo de elementos estranhos ao corpo, mas, no caso da ação do veneno das serpentes, há uma grande liberação dessas substâncias, o que acarreta uma reação deletéria ao individuo picado.

Stella afirma que as reações locais podem se complicar ainda mais, por um processo conhecido como síndrome compartimental. Nesse caso, o edema é tão grande que os vasos sangüíneos são comprimidos e a circulação é interrompida. Os médicos são obrigados, consequentemente, a abrir a região para liberar o sangue (fasciotomia). A necrose geralmente ocorre nesses casos mais graves. Stella alerta ainda para os perigos de se fazer o torniquete no caso das picadas de Bothrops, pois o veneno acaba ficando retido em apenas uma região, que é seriamente afetada.

A pesquisadora utiliza camundongos em seus modelos experimentais, mas há também pesquisas in vitro no Laboratório. Ao injetar o veneno nas cobaias, descobriu-se que há um grande influxo de leucócitos para a região da picada, que, por sua vez, liberam as substâncias pró-inflamatórias. Observou-se ainda que a capacidade de fagocitose dos leucócitos também é aumentada depois da injeção do veneno, e que induz a produção de grande quantidade de substâncias microbicidas e tóxicas ao tecido afetado pelo veneno.

Entre os agentes microbicidas liberados estão o óxido nítrico, radicais livres do oxigenio que, ao reagirem entre si, formam o peroxinitrito, uma substância tóxica extremamente nociva ao organismo. "Então, nós chegamos a conclusão de que os venenos além de efeitos diretos, são capazes de ativar de tal modo os leucócitos que eles começam a produzir substâncias que contribuem para o aumentar os efeitos lesivos locais diretos dos mesmos", complementa Stella.

Acidentes

No Brasil, há cerca de 20 mil acidentes ofídicos por ano, ou seja, uma média de 13,5 casos por cem mil habitantes. Já a letalidade é de 0,45%, ou 90 óbitos por ano. De todos os acidentes registrados, 90,5% são com serpentes do gênero Bothrops, sendo que 54,4% das picadas ocorrem no pé, 28,4% na mão (normalmente com crianças que estão brincando e colocam a mão no local onde está a serpente) e 24,6% na perna.

"Essas serpentes têm hábitos noturnos; durante o dia elas dormem", descreve Stella. "Normalmente, esse acidentes acontecem com pessoas da área rural: eles estão trabalhando, a serpente está dormindo, eles pisam em cima dela e ela pica." O grande problema estudado pelo Laboratório, portanto, é que, mesmo que o indivíduo picado receba o soro e as reações sistêmicas sejam controladas, ele pode perder a região do local da picada e ficar incapacitado para o trabalho.

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