ISSN 2359-5191

01/07/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 48 - Sociedade - Instituto de Estudos Avançados
Para estudiosos, manifestações perderam foco e são desorganizadas

Se as passeatas iniciadas pelo Movimento Passa Livre (MPL) em várias cidades pelo Brasil tinham um propósito bastante claro – a redução da tarifa do transporte público , o mesmo não pode se dizer dos atuais protestos que tomam as ruas brasileiras. Corrupção como crime hediondo, melhorias na saúde e educação são apenas algumas dentre as várias pautas trazidas pelos novos manifestantes. A maioria desses jovens, além de não terem uma proposta objetiva, não são organizados politicamente, o que pode lhes transformar em “massa de manobra”.

Foi o que discutiu o evento promovido pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP no último dia 21. Com a presença de filósofos, psicólogos, sociólogos e outros intelectuais da Universidade, além de um integrante do MPL, a mesa-redonda “O que está acontecendo?” proporcionou um debate sobre os ocorridos nas últimas semanas nas ruas brasileiras e as prováveis consequências disso para o futuro político do país.

Depois da atitude violenta da PM no quarto ato contra o aumento da passagem em São Paulo, as passeatas começaram a agregar muito mais gente, fazendo aumentar o leque de exigências populares. “Claro, a população ficou revoltada. O tiro no olho da repórter da TV Folha foi um tiro no olho de todos nós”, declarou Alexey de Carvalho, pesquisador da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Isso, no entanto, acarretou em uma "fagocitação" das pautas do MPL. “O problema não é o levantamento de outras reivindicações, mas sim a supressão dos objetivos iniciais por movimentos extremamentes conservadores e interesses da mídia hegemônica.” explicou. “Algumas pessoas estão se utilizando do nome da organização Anonymous [rede de hackativismo] , por exemplo, para fazer vídeos com mensagem de golpe. Isso é muito perigoso.”

A falta de cultura política dos novos manifestantes também foi alvo de críticas pelos professores.  Se o MPL, assim como outros movimentos sociais, conta com integrantes politizados e está nas ruas há muito tempo, esta nova onda de protestos é composta por pessoas “entediadas”. Há quase 20 anos o Brasil não presenciava movimentos massivos. Até o governo FHC, o PT era uma oposição organizada e levava os trabalhadores para as ruas. Quando Lula se elegeu presidente, houve uma neutralização da vida política no país, o que fez o brasileiro se acostumar com essa apatia e se afastar dos partidos políticos.

Entretanto, esse afastamento passado se mostra preocupante agora. Para Alexey, há uma vontade de participação política, mas, como não se tem essa cultura, vê-se atitudes absurdas por parte de alguns manifestantes: desde a elaboração de um abaixo-assinado online para uma tentativa de  impeachment da Dilma, até a expulsão de integrantes de partidos. “Primeiramente, não se pode impedir uma presidenta eleita democraticamente de cumprir seu mandato sem haver um motivo razoável para sua saída. Além do mais, se houvesse tal razão, não seria através do Avaaz [rede de ativistas sociais online] que o impeachment se concretizaria”, disse o pesquisador.

Em relação às repressões de membros partidários das atuais manifestações, Alexey ressalva: “Expulsar o PSTU, o PSOL, ou o PCO das passeatas, por exemplo, é como participar de uma festa e querer tirar um dos anfitriões”. Jorge Luiz Campos, membro do MPL, e Arlene Clemesha, historiadora da FFLCH, acresentam a preocupação com o fascismo dessas ações anti-partidárias. “A direita conservadora ‘hackeou’ o movimento. Nós criamos um monstro e agora precisamos controlá-lo”, afirmou Jorge.

Apesar de não se saber exatamente como essas manifestações vão se desenvolver, os pesquisadores consideram que o ponto positivo na tomada do espaço público pelos jovens de classe média conservadora e despolitizada é a percepção de que política se faz nas ruas e não somente em época de eleições ou por ativismo virtual. “Tudo isso serviu para mostrar como a juventude tem sim possibilidade de influir no país”  afirmou o cientista político José Álvaro Moisés. Ele frisa ser também um recado para o modelo atual de partidos políticos e de democracia representativa vigente no Brasil. “Os partidos têm de se reaproximar dos cidadãos. Eles precisam parar de se preocupar somente em se manter no poder e começar a aumentar essa conexão. Só assim a democracia prevalecerá”, concluiu.


Foto: Marlene Bergamo/Folhapress


Leia também...
Nesta Edição
Destaques

Educação básica é alvo de livros organizados por pesquisadores uspianos

Pesquisa testa software que melhora habilidades fundamentais para o bom desempenho escolar

Pesquisa avalia influência de supermercados na compra de alimentos ultraprocessados

Edições Anteriores
Agência Universitária de Notícias

ISSN 2359-5191

Universidade de São Paulo
Vice-Reitor: Vahan Agopyan
Escola de Comunicações e Artes
Departamento de Jornalismo e Editoração
Chefe Suplente: Ciro Marcondes Filho
Professores Responsáveis
Repórteres
Alunos do curso de Jornalismo da ECA/USP
Editora de Conteúdo
Web Designer
Contato: aun@usp.br