ISSN 2359-5191

01/07/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 48 - Saúde - Instituto de Química
Pesquisas de medicamentos no Brasil ainda têm forte atraso

A questão dos medicamentos no Brasil tem sido motivo de grandes embates. Pelo profundo avanço nesta área e a inserção dos remédios genéricos no mercado, quebrando de patentes e gerando maior facilidade do acesso para a população, há quase um clamor pelo aumento da produção farmacêutica nacional. Esse percurso, entretanto, tem encontrado aqui diversos entraves que tornam os passos lentos e dificultam o progresso na área.

O professor João Batista Calixto atua no setor de farmacologia da Universidade Federal de Santa Catarina e, a partir de sua vasta carreira na área de terapêutica experimental e seu conhecimento sobre o campo, traça um panorama da pesquisa e inovação em medicamentos no Brasil. Suas preocupações com a produção científica brasileira envolvem tanto um comodismo quanto a falta de incentivo dada aos pesquisadores no país.

Atualmente, a indústria de medicamentos se vale principalmente de componentes sintéticos, somando cerca de 58,8% do total produzido. A extração de plantas, além de cara, é ecologicamente inviável nos dias atuais. Por essa razão, é clara a atuação e dependência da área de química para a produção nesse setor. No cenário histórico, essa configuração se deu muito recentemente. No pós-Segunda Guerra Mundial muitos cientistas alemães especializados na área migraram para os Estados Unidos, fazendo com que laboratórios fossem criados e tornando o país grande expoente na produção farmacêutica.

Atualmente, esse mercado movimenta cerca de um trilhão de dólares por ano no mundo, valor equivalente a quase metade de todo o PIB do Brasil. Essas indústrias, motivadas pela produção desses bens de primeira necessidade, atuam fortemente em pesquisa e inovação. Esse setor é o maior local de investimentos dos países, reservando cerca de 15% da economia mundial. O mercado brasileiro, por sua vez, movimenta cerca de 1,2% desse montante mundial.

O professor comenta a relação entre esses países produtores e seu histórico de base no setor químico, tanto no incentivo a pesquisa quanto na formação básica. Nesses casos, as empresas adquirem a patente logo no início da pesquisa de determinado medicamento. Considerando que em média a exploração e experiências com o material durem cerca de dez anos para serem concluídas, sobram apenas sete anos dos 17 para a quebra das patentes. Durante esse tempo, o produto é lançado no mercado e seu preço é extremamente elevado para aproveitar esse período que os laboratórios ainda possuem os direitos exclusivos sobre ele. Antes de se tornar genérico, o preço do produto e a lucratividade são extremamente explorados.

O Brasil apresenta-se hoje como o sexto maior mercado consumidor de fármacos do mundo. Há no país um forte crescimento de empresas nacionais que se beneficiaram da produção de medicamentos genéricos. “Muitas empresas multinacionais não entraram na disputa pela fabricação desses medicamentos e acabaram por se arrepender”, comenta o professor. Algumas delas, mais atualmente, estão comprando as empresas nacionais produtoras de genéricos para entrar nessa competição.

Por outro lado, o Brasil ainda importa diversos medicamentos e fármacos, elementos que compõem a fórmula da produção de remédios. Isso encarece o custo e limita fortemente o acesso a esses bens, muitas vezes essenciais. Sobre isso, Calixto defende que é necessária uma posição crítica dos cientistas brasileiros ante a desvalorização da química nacional e a contribuição de seu trabalho para a sociedade e no país. Medicamentos cujas patentes ainda permanecem e que são assegurados por lei, como coquetéis e vacinas, consomem parte significativa dos recursos do sistema de saúde pública. O professor alerta para a necessidade de atuar nessas áreas, ainda deficitárias.  

Para tanto, Calixto aponta para um direcionamento das ciências na priorização da pesquisa de ponta e tecnologia, tendência em diversos países em desenvolvimento como China e Coréia do Sul. Nesses países, é nítida a fatia do PIB reservada para a pesquisa e desenvolvimento. “É necessário para o pesquisador saber correr riscos, só assim que são produzidos os trabalhos de ponta”, destaca o professor. Mais do que isso, segundo ele, é necessário cobrar os resultados do investimento, ter um acompanhamento. Nunca se recebeu tanto investimento na área, mas há pouca expressividade nos resultados, se comparados aos demais países do Brics.

O professor destaca a falta de qualidade para o crescimento quantitativo apresentado. Segundo dados da recente pesquisa realizada pela Thomson Reuters Web of Knowledge, há uma mudança pouco significativa na quantidade de artigos científicos mencionados ou citados no caso brasileiro, em oposição principalmente à Coréia do Sul. Isso significa que é necessário também monitorar a produção, o investimento aplicado deveria ser inspecionado com mais rigor para a produção de novos resultados, como defende Calixto. O mesmo acontece no registro de patentes, no qual o Brasil ainda tem pouquíssimas ao ano, e também no número de artigos publicados em revistas como Nature ou Science.

Para que seja fomentada essa cultura e a melhoria na área farmacêutica, é necessário apoiar os estudos em química, base para todos esses ramos. “É preciso inovar com senso de qualidade e assumir os riscos de estar na dianteira, sem temer”, pontua Calixto. Ele aponta para a necessidade de iniciativa, aproveitar o potencial construtivo da juventude e modificar a realidade do país, não se conformando com um individualismo acadêmico.

Há, também, um emergir da produção de medicamentos biológicos e biossimilares que tem de ser executada por pesquisadores brasileiros em razão de seu elevadíssimo preço de importação e fabricação. O professor coordena agora o Centro de Farmacologia Pré-clínica em Florianópolis. Subsidiado pelo governo do estado de Santa Catarina e os ministérios da Saúde e da Ciência e Desenvolvimento, o recém-inaugurado centro de desenvolvimento científico é o primeiro no país e abriga também uma incubadora para desenvolvimento de empresas por estudantes.

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