ISSN 2359-5191

16/10/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 82 - Arte e Cultura - Escola de Comunicações e Artes
Novos documentários brasileiros unem realidade e ficção
Cena do documentário Elena (2012), dirigido por Petra Costa

Ao contrário do que ainda pensa a maioria das pessoas, nem todo documentário precisa ser aquele filme de caráter escolar, nos quais um locutor narra diversas informações sobre um tema considerado de grande importância pública. Pelo contrário, “hoje, o que interessa [no ramo dos documentários] são as histórias particulares, a especificidade dos sujeitos – até mesmo a história do homem ordinário, comum”, comenta Mariana Duccini, jornalista e doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.

Em sua tese de doutorado, Ponto de Vista A(u)torizado: Composições da Autoria no Documentário Brasileiro Contemporâneo, Mariana faz referência a um “movimento de retomada do cinema brasileiro”. Esse movimento teria acontecido a partir de meados dos anos 90, quando houve uma reposição das condições de produção cinematográfica no Brasil. Com essa retomada, ocorreram mudanças no posicionamento dos produtores do cinema brasileiro, e isso acabou atingindo o gênero do documentário nacional – resultando, em seguida, no que se chamou de “Documentário Brasileiro Contemporâneo”.

Nesse novo posicionamento algumas linhas alternativas de produção de documentário, que tiveram início na década 1960, começaram a ganhar espaço – como, por exemplo, a preferência pela história pessoal e particular, ao invés dos temas universais. Outras características que podem ser encontradas nesse gênero de documentário são: o envolvimento explícito do narrador com aquilo que é narrado e a menor preocupação com a verdade factual daquilo que é exposto no filme.

De acordo com a pesquisadora, o uso desse recurso comum às ficções na produção dos documentários não retira do filme a capacidade de passar algo verdadeiro. Ao contrário, o uso da ficção resultaria em um tipo de linguagem muito mais efetiva e verdadeira do que o próprio discurso realista. Afinal, o apelo ao fator humano do público torna a mensagem do filme muito mais próxima do espectador. “O documentário está cada vez menos preocupado com a verdade factual, referencial, das coisas. Valoriza-se mais o homem que sabe se autonarrar, contar bem suas histórias”, afirma Mariana.

Interessante notar que há no próprio nome da pesquisa de Mariana uma brincadeira de palavras que carrega todos esses significados. A pesquisadora usa o termo “atorizado”, para se referir à capacidade de atuação, de criação, das cenas e das mensagens presentes em um documentário desse novo formato. Mas, ao mesmo tempo, utiliza o termo “autorizado”, para mencionar a autoridade, ou legitimidade, que esse tipo de filme possui para que possa realizar a função de passar ao público uma verdade – mesmo que através de uma história inventada.

Um outro significado de “realidade”

Antes desse novo formato ao qual se refere a pesquisa, quase sempre foi esperado de um filme documentário que ele tivesse uma pretensão de revelar uma suposta verdade ao público. Essa noção seria uma derivação do que o público sente pelo discurso jornalístico. Mariana, ao relacionar essa visão do documentário realista com a visão que temos do jornalismo, diz que “nós ainda temos a ideia de jornalismo como um discurso muito referencial, baseado na imparcialidade, neutralidade, objetividade e no rigor aos fatos – ou seja, preza-se pelo menor envolvimento possível do sujeito jornalista na matéria narrada. O documentário largou mão disso faz um bom tempo”.

O documentário se distanciou desse movimento realista e situou o conceito de verdade no próprio evento fílmico, ou seja, a verdade está no próprio ato do público de assistir ao filme – e não em alguma questão exterior que foi anteriormente captada pelo cinegrafista. Esse conceito está presente em filmes como: Em busca de Iara (2013), Mataram meu irmão (2013), Elena (2012) e Os dias com ele (2012) – todos bem recebidos pela crítica.

No entanto, ainda que o documentário brasileiro hoje tenha de forma muito mais ostensiva chegado às salas de cinema, isso ainda é muito incipiente em termos de público. O documentário mais visto no Brasil, até hoje, foi Vinícius (2005), de Miguel Pereira Júnior, que teve 270 mil expectadores. Em contrapartida, filmes de grandes produtoras nacionais – como a Globo Filmes – atingem com facilidade números próximos a, no mínimo, um milhão e meio de público sem grandes dificuldades. “Embora a presença dos filmes documentários ultimamente tenha sido mais incisiva nos cinemas, isso ainda é muito precário”, afirma a pesquisadora.

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