ISSN 2359-5191

16/12/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 119 - Ciência e Tecnologia - Instituto de Estudos Avançados
Pesquisadora analisa mudanças no modo de fazer ciência pós acadêmica
Pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados estuda a tensão entre o modo antigo de se fazer ciência e as mudanças decorrentes de uma sociedade neoliberal

Hoje, parte significativa da pesquisa científica tem um chefe, um interesse privado e, quase sempre, um visa o lucro. Será que sempre foi assim? Daniela Rozados, bolsista da Fapesp e pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados (IEA-USP) estuda em seu pós-doutorado as transformações contemporâneas do que chama-se ethos científico, que consiste no conjunto de normas e valores que orientam os pesquisadores. Estes são como códigos sociais e são tácitos, ou seja, não são expressamente ditos, mas são passados indiretamente. Eles são importantes, pois autorregulam a comunidade científica, assegurando a autonomia da pesquisa.

De acordo com a pesquisadora, a partir do fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o modo de produção do conhecimento cientifico tecnológico mudou bastante. Antes a ciência voltava-se para o cientísta particular, preocupado em entender o funcionamento da natureza. A partir das décadas de 1970 e 1980, a ciência passou a atrelar-se cada vez mais a interesses das empresas e seu objetivo passou a ser gerar produtos tecnológicos capazes de gerar lucro. Isso fez com que o interesse privado em produzir ciência fosse muito maior do que o público.

Antes dessa época, o ethos científico girava em torno de quatro valores principais: universalismo, que consiste na capacidade de avaliar proposições científicas de acordo com critérios impessoais, não sociais e preestabelecidos, de um modo neutro; comunalismo, valor que dita os produtos e os resultados da atividade científica são determinados por um interesse público, podendo circular livremente entre os países; desinteresse, que garante que um cientista não tem motivações pessoais ou extra-científicas influenciando em sua pesquisa e, finalmente, ceticismo organizado, uma postura crítica e cética que todo cientista deveria ter em relação a suas próprias pesquisas e as dos seus colegas.

A mercantilização da ciência tem afetado esses valores de maneira significativa. Segundo Daniela, o mesmo interesse no lucro faz com que o cientista perca sua capacidade crítica, pois ele perde a sua autonomia de pesquisa e de ditar o que é importante na agênda científica, já que quem a subsidia que dará rumo as investigações. O pesquisador é contratado para produzir. “Cada vez menos as pesquisas estão orientadas para um bem público”, diz Daniela. “Vê-se uma crescente associação entre indústria, universidade e o discurso da inovação”. Apesar de introduzir uma novidade no processo de produção e por isso chamar-se inovador, deve-se ressaltar que há a necessidade do fim ser lucrativo. “A ideia de patente rompe com a noção de comunalismo, pois cobra para que a pessoa possa utilizar a pesquisa”. Portanto, pode-se dizer que a ciência neoliberal (ou pós acadêmica) é proprietária - pois há financiadores com interesses -, é local - pois fica focada em problemas de interesses particulares -, autoritária - já que o pesquisador não tem autonomia na pesquisa - e é encomendada, pois no final, precisa-se ter um produto ao final do processo.

A crítica fundamental de Daniela quanto a esse novo modelo é que a ciência subordinada a produtos lucrativos gera uma questão ética: a ciência desvinculada ao interesse público e fortemente vinculada a publicidade. É importante destacar também que um modo de pesquisa não deu lugar a outro. Eles estão, atualmente, em tensão um com o outro. O principal objetivo da pesquisa é analisar a “incorporação da lógica empresarial no mundo acadêmico”, observando aspectos como a produtividade exagerada e desfuncional. O tratamento gerencial das publicações também é um aspecto relativamente novo e que deve ser levado em conta. “Os pesquisadores publicam cada vez mais, não porque descobriram algo novo, mas por pressão”, diz ela.

Daniela avaliará através de declarações públicas, manifestos, editoriais de revistas, blogs e dos códigos de éticas da comunidade científica, a tensão entre o que seriam os valores de um modelo antigo e de um modelo mais recente.

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