ISSN 2359-5191

23/09/2014 - Ano: 47 - Edição Nº: 65 - Ciência e Tecnologia - Escola Politécnica
Veículos elétricos podem revolucionar setor energético no Brasil
Econômicos e ecológicos, os carros movidos a eletricidade representam uma alternativa vantajosa aos automóveis a combustão
O Mitsubishi i-Miev, primeiro modelo elétrico produzido por uma grande montadora em larga escala no Brasil, custa cerca de R$ 200 mil. Fonte: João Paulo Niggli

Os veículos elétricos, carros que funcionam a partir da energia fornecida por um conjunto de baterias feitas de íons de lítio, oferecem diversos benefícios se comparados aos automóveis convencionais, movidos à combustão. A principal vantagem está no impacto ecológico: por não utilizarem gasolina ou etanol, eles não emitem poluentes. No que concerne aos gases do efeito estufa, o valor total de emissão, considerando inclusive os processos de geração de energia, é reduzido em até 7,34 vezes. Além desses benefícios, há também os que afetam diretamente o consumidor. Diminuição de ruídos, redução nos custos de locomoção – um carro elétrico despende três centavos para rodar um quilômetro, contra 25 centavos dos carros a gasolina – e economia na manutenção, já que o motor e a estrutura são muito mais simples do que os mecanismos dos automóveis convencionais, são alguns exemplos.

Apesar de todas essas vantagens, os carros elétricos continuam escassos no Brasil. A estimativa é que, até 2020, a frota máxima chegue a 5% ou 6% do total de veículos de passeio no país, um valor ainda pouco significativo para provocar alterações expressivas no setor ou nas redes de distribuição de energia elétrica. As razões que justificam essa baixa inserção, segundo o pesquisador João Paulo Niggli Silva, do Departamento de Energia e Automação Elétricas da Poli (USP), são variadas.

“A falta de políticas públicas e de investimentos por parte do governo são, certamente, um dos principais obstáculos à entrada dos veículos elétricos no Brasil”, afirma Silva. Hoje, o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) sobre carros convencionais pode chegar a 8% ou até 6%. Já no caso dos elétricos, esse mesmo imposto sobe para 25%, pois ele não entra na alíquota atribuída a automóveis, segundo classificação do ICMS. Assim, o preço final de um veículo elétrico torna-se bastante elevado, podendo variar de R$90 mil a R$200 mil dependendo do modelo, o que dificulta a sua comercialização em larga escala.

Outro fator que prejudica a popularização dos carros elétricos está relacionado ao seu próprio funcionamento. “Existem duas formas de se carregar um veículo movido à eletricidade: através de um carregador de carga lenta, que se assemelha a uma tomada comum, ou por um carregador de carga rápida”, explica o pesquisador. No primeiro caso, o veículo demora cerca de 8 horas para completar o carregamento, o que pode tornar-se um inconveniente em algumas situações. No segundo caso, as baterias do carro atingem até 80% da carga em apenas 30 minutos. O problema, no entanto, consiste na duração da carga de uma bateria: a autonomia média dos veículos elétricos é de apenas 120 a 150 kilômetros, o que desmotiva inúmeros possíveis compradores a adquiri-los. 


Eletropostos instalados no IEE/USP. Um deles é um carregador de carga rápida, e os outros dois são de carga lenta, pública e residencial. O preço médio de um eletroposto de carga lenta varia de R$15 mil a R$20 mil

Silva esclarece também que essas baterias, a longo prazo, podem se tornar um problema tanto para o usuário quanto para o meio ambiente. “Uma bateria feita de íons de lítio suporta, sem perder a sua eficiência, até mil ciclos de carregamento. Após esse valor, ela começa a reter carga, ou seja, a sua duração diminui. Assim, com o tempo o bloco de baterias do carro elétrico precisará ser trocado e, em seguida, devidamente descartado”, explica ele. Segundo pesquisa realizada pelo governo, o cidadão brasileiro percorre com seu carro, em média, 50 kilômetros por dia. Ao partir deste valor, estima-se que um conjunto de baterias de um veículo elétrico duraria cerca de três anos, antes que uma substituição fosse necessária.

Em seu estudo, Silva trabalha ainda com a avaliação de possíveis impactos nas empresas distribuidoras de energia elétrica, no caso de uma inserção efetiva de carros elétricos no Brasil. De acordo com o pesquisador, nessa situação específica algumas estratégias precisariam ser adotadas para suprir a demanda de energia, como implantar tarifas com custo diferenciado para horários de pico de consumo (geralmente entre 19h e 21h) e de baixo consumo, por exemplo. Dessa forma, foram simuladas três hipóteses, através de um software, para analisar como ocorreria a operação das redes de energia.

Na primeira hipótese, o carregamento de veículos é feito sem controle, ou seja, o usuário carrega o seu veículo no horário que preferir. Provavelmente, essa situação iria agravar ainda mais o alto consumo nos horários de pico, o que levaria às empresas distribuidoras a investir ainda mais no seu sistema. Esse investimento, porém, não é benéfico, pois a empresa só utiliza toda a tecnologia desenvolvida em uma pequena parcela do dia. No restante do tempo, o sistema fica praticamente ocioso, e o rendimento dos investimentos é quase nulo.

Já na segunda hipótese, as distribuidoras utilizariam uma medida conhecida como Tarifa Branca, atualmente em processo de regulamentação pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). A função dessa nova tarifa é sinalizar aos consumidores a variação do preço da energia, para que eles tenham a opção de pagar valores diferentes por ela em função da hora e do dia da semana. Assim, possivelmente haveria um interesse dos consumidores em economizar, o que faria com que eles não colocassem o veículo para carregar durante os horários mais caros de energia. Silva acrescenta que, para facilitar ainda mais a adoção dessa medida, muitos dos carros elétricos hoje já possuem uma função para programar o horário de início do carregamento. A Tarifa Branca, portanto, seria uma maneira eficiente de otimizar o uso do sistema nas concessionárias e, assim, rentabilizar o seu investimento.



Fonte: Reprodução/Aneel
 

Na terceira e última hipótese, o carregamento seria totalmente controlado pela concessionária, através de um acordo com o cliente. Assim, mesmo que o veículo fosse conectado, somente a distribuidora poderia determinar o início do carregamento, conforme a avaliação do seu sistema. Apesar de eficiente, essa medida pode ser considerada muito rigorosa, já que priva o consumidor de escolher o horário para carregar o seu veículo.

Através da comparação das análises realizadas nas três hipóteses, concluiu-se que a terceira é a mais vantajosa, pois permite uma frota de até quatro vezes mais carros elétricos do que no primeiro caso (sem prejudicar o sistema). Já a segunda hipótese permitiu um pouco mais do que o dobro de veículos, ainda em comparação à primeira.

A conclusão do estudo, portanto, revelou que o setor elétrico brasileiro, considerando todas as etapas do processo – produção, distribuição e comercialização – está apto a receber uma frota de veículos elétricos de até 100% da frota de veículos de passeio. Porém, Silva reforça que esta estimativa considera a projeção que a EPE (Empresa de Pesquisa Energética) fez para o parque gerador energético até 2020. Assim, com este novo parque a implantação poderia ser executada, sem trazer grandes impactos para o setor.

 

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