ISSN 2359-5191

19/12/2014 - Ano: 47 - Edição Nº: 105 - Meio Ambiente - Instituto Oceanográfico
Comunidade quilombola reside em Unidade de Conservação de Ubatuba
Apesar de ser considerada uma área de preservação pelo governo, Cambury possui uma comunidade residente que vem ganhando cada vez mais força e voz
Região do Cambury abriga população quilombola Fonte: Litoral Sustentável

A praia do Cambury, localizada em Ubatuba, São Paulo, faz parte do Parque Estadual da Serra do Mar e do Parque Nacional da Serra da Bocaina, e é considerada uma Unidade de Conservação (UC) – área desapropriada, utilizada apenas para visitação. Algumas comunidades já residentes nesses espaços de preservação, no entanto, possuem uma dinâmica diferente dentro do território e podem permanecer no local. É o caso da comunidade quilombola residente no Cambury, que apesar de já ter sofrido tentativas de desapropriação do poder público, pode e deve permanecer no local.

A dinâmica territorial e o uso de recursos naturais que se dá dentro dessa comunidade é o objeto de estudo de Dominique Chahine Gallo, mestre pelo Instituto de Oceanografia (IO) da Universidade de São Paulo (USP). “O território do Cambury configura-se hoje como uma zona de uso compartilhado por residentes, com normas regidas pelo Parque Estadual da Serra do Mar (Núcleo Picinguaba) em primeira instância. O território vem sendo gerenciado pelo Governo através de uma UC que de acordo com o SNUC (Sistema Nacional de UC´s), não permite a moradia, ainda que possa haver uso público como ecoturismo, pesquisa e projetos de desenvolvimento local. Percebe-se que o sistema social dali, composto por uma comunidade residente desde antes da definição da UC se tornou viável através de um fortalecimento comunitário agregador, que tornou possível a formação de fóruns de discussão e a ação de atores-chave se movimentando em torno da questão da proteção da sócio-biodiversidade. É claro que parte deles, principalmente os jovens, possuem uma maior intimidade com a modernidade, o que faz com que a comunidade esteja topando cada vez mais com as inovações tecnológicas e culturais, colocando frente a frente o modo de vida tradicional com o moderno”, afirma a pesquisadora.

Hoje, além dos quilombolas de origem negra-afriacana, a comunidade ainda é formada por caiçaras descendentes de índios e europeus, e também por pessoas "de fora", ou seja, que possuem ancestralidades diversas, mas, mesmo assim, fazem parte da comunidade tradicional. Atualmente o território vem sendo alvo de disputa entre grileiros, especuladores, turistas e moradores. "O território vem sendo destinado à proteção ambiental há apenas 35 anos, com o poder público exercendo um maior controle sobre o uso do território e dos recursos naturais. Porém a tradição dos moradores é fato que possibilita a permanência no território, de acordo com a Lei maior que é a Constituição Federal, entre outras políticas", completa Dominique.

Apesar do descaso dos órgãos gestores em certos episódios, o território está sendo gerenciado de forma na qual os moradores possuem cada vez mais poder sobre os recursos naturais, e ainda possuem o apoio de parceiros como ongs, ministérios, visitantes e cooperativas. O uso de recursos naturais renováveis, recursos que podem ser recolocados na natureza ou que podem se regenerar através de processos naturais, também é implementado pela comunidade, o que gera, consequentemente, um uso sustentável na região. Segundo Dominique, grande parte da comunidade é formada por artesãos e pescadores, mas essas são atividades complementares. A atividade principal do território acaba sendo o turismo, devido à grande população flutuante que se instaura em Ubatuba em épocas de férias, feriados e, principalmente, no Ano Novo.

Teorias de Sistema Sócio-Técnicas

Para o estudo, Dominique utilizou, além do Guia de Avaliação de Políticas Públicas, uma metodologia baseada nos estudos de Michel Callon e Bruno Latour, pesquisadores franceses que criaram a teoria dos Sistemas Sócio-Técnicos. "Ela [metodologia] nos fornece uma ferramenta para estudos de caso, pois explica, através de uma abordagem histórico-dialética, a formação de uma rede suportada por pessoas e coisas, que se orientam em torno de um objetivo comum. A reconstrução das redes permite que os atores e suas lógicas de ação sejam analisados de modo que se entendam seus deslocamentos e traduções em torno de uma controvérsia gerada (no caso a manutenção do modo de vida da comunidade tradicional e a preservação integral da natureza), os conflitos e suas resoluções", explica a mestra.

Além disso, para a pesquisadora, o fortalecimento da rede de apoio dos moradores, o turismo sustentável e a preservação natural por parte da comunidade foram os pontos mais relevantes do seu trabalho. "Também acredito, com base em minha pesquisa, que por melhor ou pior que seja a ideia, a comunidade deve estar interessada em desenvolvê-la para que funcione satisfatoriamente ou ao menos sirva como aprendizado. Por isso, a importância de se manter a atividade dos Conselhos e Comitês com a participação da comunidade e o fomento a organização social e cultural local, com a participação das ONGs e outros parceiros, indo de acordo com os objetivos da PNCT´s (Política Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais), da Constituição Federal e do SNUC, as principais leis que tratam sobre minorias e proteção da sócio-biodiversidade e que foram incorporadas no processo organizacional da área de estudo nos últimos ano."

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