O uso da internet, especialmente das mídias sociais, para a articulação de movimentos e a organização de protestos ou manifestações políticas é chamado de ciberativismo. Mas, além do uso intenso da conexão em rede, os movimentos ciberativistas, por mais distintos que sejam, possuem outra característica em comum: uma forte tendência anticapitalista. É o que identifica a pesquisadora Silvia Ramos Bezerra em sua tese de doutorado, apresentada à Escola de Comunicações e Artes da USP.
Silvia fez um estudo teórico do ciberativismo e analisou as principais manifestações ocorridas entre os anos de 2010 e 2013. Com isso, percebeu que o fenômeno se caracteriza pela organização de movimentos sociais em torno de um ideal crítico à estrutura capitalista, além de ser baseado na horizontalidade (sem hierarquia entre os movimentos e suas decisões), na luta por mais participação política e no uso da internet como um espaço de discussão crítico e democrático.
Essas características se fizeram presentes nas Jornadas de Junho de 2013, manifestações que iniciaram-se depois do aumento da tarifa do transporte público e que, posteriormente, passaram a adotar diversas pautas como melhoria da educação, saúde e fim da corrupção. Já nas manifestações ocorridas no dia 15 de março deste ano, que defenderam pautas como fim da corrupção, impeachment da presidente Dilma Rousseff e intervenção militar, a pesquisadora afirma que isso não pôde ser observado, o que afasta o movimento do conceito de ciberativismo.
“Em junho de 2013, você tem um movimento que pede horizontalidade, abertura, para que as pessoas participem mais diretamente da política, que são características do ciberativismo. Por outro lado, no dia 15 de março, um movimento que possui uma quantidade expressiva de pessoas que pedem intervenção militar, o que significa menos democracia e menos participação”, explica.
Surgimento e perspectivas
A pesquisadora explica que a própria internet já surgiu como uma ferramenta de oposição. Mas, segundo ela, os movimentos sociais e a esquerda em geral demoraram para aderir ao seu uso, principalmente por um “preconceito arraigado devido à concepção de mídia burguesa”.
Por conta dessa resistência, segundo a pesquisadora, a rede ciberativista brasileira só começou a ser construída em 2001, no primeiro Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre. “Diversos movimentos sociais passam a utilizar estas ferramentas após as deliberações do Fórum Social Mundial de 2001, em que se reconhece a importância destas para os movimentos de luta social contra o capital”, explica.
Para Silvia, o uso da internet como ferramenta de oposição e articulação de movimentos sociais tende a crescer cada vez mais. “Acredito que a gente ainda tem muita coisa para ver acontecendo no país. A internet vai ficar como importante ferramenta durante muitos anos.”