ISSN 2359-5191

10/11/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 107 - Ciência e Tecnologia - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia
Bactérias obtidas nas primeiras semanas de vida da bezerra influenciam na produção de leite
Estudo avalia condição da microbiota intestinal de bezerras neonatais em relação ao ambiente onde vivem e o primeiro alimento que recebem
Vacas de fazenda leiteira (Imagem: Viviani Gomes)

O bem estar e a saúde das bezerras são essenciais para o funcionamento da indústria leiteira. Seu sistema imune começa a se desenvolver a partir do momento em que o filhote nasce e entra em contato com um ambiente povoado por diversos microrganismos. Os primeiros dias de vida do animal são decisivos para que ele consiga se manter saudável até atingir a fase de reprodução. Com base nisso, a médica veterinária Juliana França dos Reis, em seu mestrado pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP, avalia a condição da microbiota intestinal do bezerro e a interação dessa colônia de bactérias desde o nascimento até o 28º dia de vida do animal.

Dentro do útero da mãe, o bezerro tem um ambiente estéril, onde não há bactérias. Ao nascer, o animal possui um sistema imunológico ainda imaturo, recebendo uma carga de patógenos  microrganismos os quais provocam doenças e estão presentes no ambiente externo  bactérias e vírus que vão colonizar seu corpo. Bactérias consideradas boas, importantes para o corpo do bezerro, também começam a fazer parte da microbiota, da pele, do seu organismo, combatendo as bactérias prejudiciais. Esses desafios ambientais fazem com que ele precise começar a desenvolver respostas imunes a todos esses agentes ruins, para se defender e não adoecer.

Saúde neonatal
O estudo de Juliana analisa como o ambiente no qual o animal se encontra nas primeiras quatro semanas de vida influencia no seu sistema imune. Segundo a pesquisadora, ao trabalhar com a indústria leiteira, o mais importante é que o filhote nasça, seja fêmea, esteja sadio e viva bem os primeiros meses de vida para conseguir produzir leite quando atingir sua idade reprodutora. “No período neonatal, duas das principais doenças que podem matar os bezerros são a diarreia e a broncopneumonia, ambas causadas, dentre outros agentes, por bactéria”, explica. Por isso a necessidade de saber avaliar e interferir para melhora esse período da vida do neonato  maior desafio inicial pelo qual o animal passa  para continuar saudável.

Orientada pela professora Viviani Gomes, Juliana iniciou sua pesquisa em julho do ano passado em uma fazenda em Araras, interior de São Paulo. Uma equipe de cinco pessoas, todas pós-graduandas da professora, se dividiu de tal maneira que, enquanto uma parte estava em São Paulo, o restante ficava no campus de Pirassununga da USP esperando que a fazenda avisasse quando as vacas estivessem prestes a parir. Quando avisados da iminência do parto, o grupo se encaminhava até a fazenda para acompanhá-lo.

Caso corresse tudo bem durante o nascimento, era feita a “colostragem”, ato de dar o colostro, primeiro “leite” da vaca, para o filhote. “O colostro é essencial na transferência de imunidade passiva”, relata. A pesquisadora explica que ele contém as células da mãe, as quais ajudam no desenvolvimento do sistema imunológico do bezerro. Para o estudo, foram testados dois protocolos diferentes: enquanto metade desses bezerros tomou colostro fresco, a outra metade mamou o congelado, proveniente de um banco da própria fazenda. “O fresco tem as células da mãe ainda intactas; o congelado, não”, explica. Esse procedimento é algo bastante corriqueiro em fazendas muito grandes, por isso achou necessário avaliar como esses diferentes colostros vão influenciar no desenvolvimento da microbiota do animal.

Análises laboratoriais
Por fim, foram feitos testes para saber se o bezerro estava saudável e, a partir dai, foi feita a coleta de sangue e fezes. Foram coletadas amostras de 23 bezerras recém nascidas, durante seis diferentes períodos: assim que nasceram e antes da primeira mamada, com 24 a 48 horas de vida, com uma semana de vida, com duas semanas de vida, com três semanas de vida e ao completar sua quarta semana. Todas as amostras, totalizadas em 138, eram trazidas para o laboratório da FMVZ em São Paulo, onde foram feitas todas as análises.

Com as amostras de sangue, foi utilizada uma técnica a qual analisa a população de células da bezerra através de citometria de fluxo, máquina que mostra quais as células presentes na amostra e em qual quantidade. A máquina separa as células de defesa e mostra como está a sua atividade. Já com as fezes coletadas foram semeadas em placas de meio de cultivo e incubadas em estufas. Aquelas as quais apresentaram crescimento foram submetidas a séries bioquímicas, uma sequência de açúcares por ondem passam as bactérias. O resultado - se houve fermentação, produção de gás ou não houve alteração - apontou quais as bactérias presentes nas amostras, indicando que a Escherichia coli e a Proteus spp ocorrem em maior número.

“No início, pudemos observar uma baixa quantidade de bactérias. Porém já com dois dias de vida, houve um pico no número de bactérias”, revela a médica veterinária. De acordo com Juliana, esse aumento de bactérias coincide com os manejos feitos com os bezerros, trocados de lugar e, consequentemente, de ambiente algumas vezes ao longo dos seus primeiros 28 dias. Além disso, os níveis de escore para diarreia  os quais variam entre 0 e 3, onde 0 são fezes sólidas e 3 são líquidas  aumentaram consideravelmente com o passar dos dias, mas voltaram a diminuir nas últimas semanas.

Próximos passos
Para a continuação da pesquisa, será feita uma análise dos resultados obtidos no citômetro com o FlowJo, software que fornece as porcentagens de bactérias fagocitadas ou não pelas células de defesa. Também estão fazendo dosagens de algumas proteínas relevantes em amostras de soro do sangue coletado ao início do estudo. Todas essas informações serão relacionadas com as bactérias já encontradas, as diferentes formas de “colostragem” e o impacto disso na saúde do bezerro.

“Considerando, em larga escala, o quão importante essas bezerras são para a produção mundial de leite, é bastante relevante que um estudo de tal natureza seja feito para que ele possa interferir de alguma forma para melhorar a indústria”, explica Juliana, ressaltando que sempre se leva em consideração a saúde e bem estar do animal. Os patógenos presentes no organismo dela influenciam tanto na qualidade quanto na quantidade de leite o qual produzirá ao atingir a fase adulta. “Se ela é um animal doente, comerá e crescerá menos, demorando mais tempo para atingir a idade reprodutiva e tornando-se um problema financeiro para a fazenda”, conclui. Os resultados parciais do mestrado de Juliana foram apresentados no Gut Health Symposium no segundo semestre de 2014, na cidade de St Luis, Missouri, nos Estados Unidos (EUA).

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