Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cinquenta. Esse primeiro verso do poema “Eu sou trezentos...”, de Mário de Andrade, confirma a figura múltipla que foi o escritor. E não apenas escritor: Mário atuou também nas áreas de música, estética, arquitetura, folclore brasileiro e artes plásticas. Com o objetivo de compreender a poética do artista, Cristiane Rodrigues de Souza realiza seu pós-doutorado no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP, sob supervisão da professpra Telê Ancona Lopez.
Em seu projeto de tese O lirismo amoroso e o fazer poético em Mário de Andrade, Cristiane analisa o fazer artístico do poeta e tenta compreender as aproximações entre a face musical e a face amorosa de sua poesia. Na obra de Mário, os ritmos populares e os versos amorosos se entrelaçam: “Ao lado do resgate das expressões populares, aparecem nos poemas de amor de Mário de Andrade reflexões e formas de elaboração dos versos que revelam o entendimento de Mário de Andrade sobre o fazer artístico”, explica a pesquisadora.
Na obra de Mário de Andrade, as expressões populares em seus versos amorosos se confundem e mesclam-se com os ritmos e a música popular: “Foi possível perceber que a retomada de estruturas musicais populares marca, de maneira evidente, a experiência amorosa do eu lírico”.
Cristiane conta que o interesse pelo tema veio à tona em sua iniciação científica, e perpassou suas pesquisas de mestrado e doutorado: “Durante a pesquisa para o doutorado, ficou clara a relação que se estabelece entre a música, presença constante no pensamento estético do teórico, e os versos de amor de Mário de Andrade”, afirma a pesquisadora.
A criação poética do escritor se modifica ao longo de suas fases, mas todas elas são percorridas por uma face musical. Mário alcança uma expressão maior de si mesmo e de seu povo através da melodia de seus poemas, que representam a voz do brasileiro, a sonoridade das cidades e as diferentes tonalidades regionais do Brasil.
Para a pesquisa, estão sendo analisados alguns poemas de amor presentes nas obras Remate de males, Livro azul, Poesias, Lira paulistana e outros poemas de livros de 1941 e de 1946, que são importantes na trajetória amorosa-musical do poeta.
Água do meu Tietê
Onde me queres levar?
- Rio que me entras pela terra
E que me afastas do mar...
[Extraído do poema A Meditação sobre o Tietê, de Mário de Andrade, um dos poemas utilizados na pesquisa]