ISSN 2359-5191

05/02/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 9 - Saúde - Faculdade de Saúde Pública
Fazer faculdade de madrugada é alternativa para conciliar trabalho e estudo na rotina diária
Estudo na FSP da USP avalia condições de saúde dos estudantes que optam por esse horário e dos jovens que estão se iniciando no mercado de trabalho
Foto: USP Imagens

Encaixar o trabalho e o estudo na rotina diária é uma tarefa árdua e exige uma briga constante com o relógio. Assim, é necessário pensar em diferentes caminhos para colocar essas duas atividades na agenda. Uma das alternativas escolhidas por algumas pessoas é frequentar a faculdade de madrugada, no período das 5h30 às 8 horas da manhã. No entanto, os indivíduos passam a lidar com uma nova batalha: o cansaço e o aumento da sonolência diurna. Orientada pela professora Frida Marina Fischer, da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, a pesquisadora Andréa Aparecida da Luz buscou avaliar as condições de saúde e trabalho da população que estuda de madrugada e também dos jovens que estavam no ensino médio e já entraram no mercado de trabalho.

Segundo a pesquisadora, a população que realizava a faculdade de madrugada tinha entre 20 e 51 anos. Os motivos para essa escolha eram diversos. A maioria a via como alternativa, pois não possuíam outro espaço no dia para estudar, já que saíam do trabalho entre 18 e 19 horas. Algumas mulheres também relataram que, como não tinham como pagar a creche para os filhos, este horário era uma possibilidade para fazerem uma graduação, enquanto as crianças ficavam com os pais/cônjuge. Além disso, neste período, as mensalidades eram menores.

Já o grupo de adolescente que cursava o ensino médio, para poder dar conta de todas as atividades, acabava estendendo sua jornada noturna e ia dormir muito tarde. “As pessoas têm várias atividades e queixam-se da falta de tempo para alocá-las no dia a dia”, explica a pesquisadora. Ela relata que alguns jovens não ficavam acordados até tarde apenas para estudar, mas também para ter um momento com a família ou mesmo conversar com os amigos nas redes sociais. De acordo com os relatos dos participantes, esse era o único tempo do dia para “desestressar”, pois podiam se distrair sem pensar na escola e no trabalho.

Impactos na saúde

Segundo Andréa, cada pessoa tem seu próprio ritmo de vida. Alterações no ciclo vigília-sono também podem ter impactos significativos na saúde dos indivíduos. Na população que estuda de madrugada foi observado um aumento da sonolência diurna, do cansaço, dores musculares e, por vezes, dificuldades de memória. Uma das queixas relatadas foi quanto à jornada de trabalho ser muito longa. Muitos entram na faculdade para buscar novas oportunidades e mudar as condições em que trabalham.

Outra questão importante diz respeito à alimentação. Essa também é impactada pelos efeitos da dupla jornada de trabalho e estudo. Alguns estudantes relataram sobrepeso depois que iniciaram a estudar de manhã, pois, como passam muito tempo acordados, realizam mais refeições ao longo do dia e comem porções maiores nas refeições principais, como almoço e jantar.

Os adolescentes possuem necessidades biológicas diferentes dos adultos. Uma delas é a necessidade de dormir mais. Porém, devido a sua jornada de trabalho e estudo, têm esse tempo reduzido. A percepção de sonolência dos jovens foi muito mais expressiva, comparada a dos universitários, já adultos, que frequentavam a faculdade na madrugada, aponta a pesquisadora. Eles também, para driblar o sono, começaram a comer bombons, balas e refrigerantes, além de consumirem bastante energéticos e café.

Com relação aos fatores psicológicos, um dos aspectos destacados é o estresse. Os estudantes, para dar conta das suas atividades, precisam reinventar seu dia a dia. Dessa forma, falta espaço na agenda para momentos de lazer como assistir televisão, praticar uma atividade física, ler um livro não acadêmico e ficar com a família.


A guerra contra o  transporte

Uma das principais batalhas enfrentadas pelos jovens todos os dias são as dificuldades com transporte. Ônibus, metrô lotado e trânsito intenso são ingredientes que tornam a rotina diária uma guerra contra o tempo e o cansaço. Muitos estudantes disseram que chegavam a ficar quatro horas dentro do transporte público, menciona a pesquisadora.

Para reverter esta realidade, os universitários escolheram o horário da madrugada, devido às facilidades de mobilidade. Eles conseguiam fazer os trajetos em menos tempo, já que às cinco horas da manhã ainda não há, geralmente, muito trânsito e grande parte das pessoas não saíram de casa.

A inserção no mercado de trabalho

O trabalho é uma das culturas mais enraizadas na sociedade. Segundo a pesquisadora, ainda há uma visão que é preciso tirar os jovens da marginalidade por meio dele. Este cenário influencia muitas famílias a incentivarem os filhos a entrarem cedo no mercado de trabalho.

Na maioria das vezes, essa população possui uma renda baixa e precisa ajudar seus familiares financeiramente. No entanto, para Andréa, as longas jornadas de trabalho de 30 e 40 horas por semana podem ter consequências na formação acadêmica dos estudantes. Ela diz que eles relataram ter dificuldades de prestar atenção nas aulas, de se manterem acordados e atentos, desse modo, tinham problemas para  assimilar os conteúdos.

A pesquisadora destaca que muitos jovens, que estão ainda em desenvolvimento biológico e psíquico, acabam desempenhando atividades com as mesmas exigências de um profissional capacitado. Para ela, as políticas de inserção dos estudantes no mercado de trabalho são interessantes, porém precisam ser repensadas quanto à fiscalização das atividades que eles desenvolvem e da duração da sua jornada diária de trabalho.   

Atualmente, há um atendimento específico para essa população em relação à saúde. Contudo, “é preciso pensar em políticas integradas que vejam os estudantes como trabalhadores, identificando tanto suas condições de trabalho como também suas necessidades psicológicas e emocionais”, ressalta Andréa.






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