A crescente demanda energética no Brasil é acompanhada por uma constante dependência da energia das hidrelétricas. Dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) revelam que a capacidade instalada da geração hidrelétrica aumentará 61% até o ano de 2019, enquanto a capacidade de armazenamento não acompanhará este crescimento, subindo apenas 11% no mesmo período. Esta dependência das hidrelétricas é preocupante para os consumidores, e deve impulsionar as empresas geradoras a optarem pela diversificação de fontes energéticas em seus portfólios, como aponta a pesquisadora Luísa Helena Machado Ribeiro, da Escola Politécnica da USP.
Não é de conhecimento geral que geração e distribuição de energia elétrica são desassociadas, ou seja, envolvem um acordo entre diferentes empresas. No Brasil, o acordo entre geradores e comercializadores de energia é realizada em duas esferas de mercado: o Ambiente de Contratação Regulada (ACR) - regulado pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) - e o Ambiente de Contratação Livre (ACL). Em sua dissertação de mestrado, Luísa deu enfoque ao Ambiente de Contratação Livre, que é caracterizado pela livre negociação entre os compradores e vendedores, com preço acordado entre ambas as partes.
Dentro dente ambiente de contratação, Luísa optou por fazer uma análise dos geradores: “na comercialização, eles são a parte que incorre em mais risco, principalmente aqueles que têm um padrão de produção variável, que é sazonal ou intermitente”. As consequências da geração inconstante de energia podem ser desastrosas, resultando na quebra de contratos ou em prejuízo às geradoras que, diante da necessidade de cumprir o fornecimento energético estabelecido, são obrigadas a comprar energia do mercado de curto prazo a preços exorbitantes.
Complementariedade energética
Diante de tantas variáveis, a pesquisa aponta a complementaridade entre fontes como a solução adequada para evitar prejuízos. Diante de fontes com um padrão de produção sazonal de energia, é possível combiná-las de modo que haja compensação energética: quando uma fonte está gerando mais, a outra está gerando menos. O resultado desta sinergia é um perfil estável, implicando em menor risco para as geradoras. “Essa diversificação no portfólio é importante porque dado que os contratos de venda são rígidos e estabelecem uma entrega firme e constante ao longo do ano, a combinação dos padrões para formar um perfil um pouco mais linear evita que o gerador tenha que complementar essa entrega de energia no mercado de curto prazo, que é extremamente volátil”, explica Luísa.
O Brasil possui potencial hídrico para atender a uma demanda de energia que cresce 6 mil MW a cada ano. Porém, a maioria das usinas construídas nos próximos anos deverá ser as chamadas “fio d´água”, ou seja, usinas que não possuem reservatório próprio. Consequentemente, há geração de pouca energia durante o período seco, criando a necessidade de ter fontes complementares à matriz.
Biomassa
Luísa pesquisou a complementaridade entre as hidrelétricas e diversas fontes renováveis, destacando a biomassa como uma alternativa viável. “A biomassa é interessante porque ela não é tão incerta como vento e água, e temos a produção do bagaço de cana justamente no período seco, que é quando ocorre a safra. Concomitantemente, vemos potencial para produção de biomassa justamente no período de baixa atividade das hidrelétricas”, explica Dorel Soares Ramos, orientador de Luísa.
Das usinas a biomassa no Brasil, 82% são provenientes de bagaço de cana. Essas usinas possuem dois períodos de geração bem definidos: um período denominado safra, onde a usina consegue gerar sua máxima capacidade, e outro período conhecido por entressafra, no qual a usina não gera. Dada a relevância dessa fonte no mercado, há uma escassez de energia incentivada para negociação nos períodos onde não há geração. Em contrapartida, nos períodos de safra entre abril e outubro, há uma oferta muito elevada.
Ao investir em fontes complementares, as empresas geradoras obtêm um portfólio mais atrativo e diversificado e adquirem um perfil mais constante, maximizando a receita e protegendo-se dos riscos e incertezas que incorrem na comercialização em Ambiente de Livre Contratação.