Entre 1937 e 1945, o ministro Gustavo Capanema encomendou várias esculturas para o prédio do Ministério da Educação e Saúde (MES), que estava sendo construído no Rio de Janeiro. Essas obras de arte faziam parte do projeto do edifício e deveriam estar ligadas à ideia de modernidade e tradição. Com o objetivo de analisar essas esculturas, a pesquisadora Marina Mazze Cerchiaro desenvolve seu mestrado no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP, sob supervisão da professora Ana Paula Cavalcanti Simioni e bolsa da Fapesp.
As esculturas encomendadas foram feitas por diferentes artistas, como Adriana Janacópulos, Bruno Giorgi e Celso Antônio. A pesquisadora explica que o ministro buscou criar por meio das obras uma narrativa que articulasse as ideias de nacionalidade e civilização, o que fez com que elas evocassem discursos de mestiçagem, hierarquia de gêneros, eugenia e família. “No entanto, esse não foi um projeto consensual", explica Marina. "Os artistas apresentaram outras propostas, com discursos que contradiziam o do ministro". Algumas vezes, eles recusaram-se a alterar suas obras e em alguns casos chegaram a subverter as diretrizes de Capanema.
Uma das obras analisadas na pesquisa é Monumento à Juventude Brasileira, de Bruno Giorgi. A escultura foi solicitada pelo sindicato de professores para demonstrar o agradecimento dos alunos do Brasil ao presidente Getúlio Vargas e foi financiada por meio de arrecadação em escolas. “Esse monumento tem clara relação com o projeto político de construção da Organização da Juventude Brasileira, que vinha sendo implantado nesse período no país”, explica Marina. A primeira proposta de Giorgi era a de um casal andando de mãos dadas, mas o projeto sofreu várias mudanças até ser aceita a versão final, com a mulher bem atrás do homem e sem a relação de casal que existia anteriormente.
Escultura Mulher, de Adriana Janacópulos, 1942, Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro.¹
Por fim, a pesquisadora analisa a obra Mulher, para além do ideal eugênico, atentando para o fato de que nessa escultura a mulher não se encontra exatamente na posição sentada. Segundo Marina, a postura revelaria sutilmente uma intenção da artista. “Se você olhar a escultura por trás, notará que a mulher está prestes a se levantar”, afirma. “Nas décadas anteriores, de 1910 e 1920, eram travadas importantes discussões sobre a emancipação feminina. Ao atribuir o gesto de levantar à mulher eugênica, Adriana subverte discretamente o projeto do ministro, dando uma resposta ‘ousada’ a um problema conservador".
¹ Foto: Epaminondas, s.d. Arquivo Gustavo Capanema. Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil. Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro. Reproduzido de: CAVALCANTI, L. Dezoito graus. Rio Moderno uma história do Palácio Gustavo Capanema. Rio de Janeiro: Língua Geral, 2014, p.117.