ISSN 2359-5191

24/05/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 63 - Sociedade - Faculdade de Saúde Pública
Pesquisa analisa efeitos da revelação da orientação sexual sobre vivência plena da homossexualidade
Recortes raciais e geracionais também foram levados em conta pelo estudo
Os movimentos sociais LGBTs ainda vão às ruas em protesto à violência de sexualidade./ Fonte: Reuters

Expressar abertamente a direção do desejo sexual e afetivo ainda não é um direito livre numa sociedade onde a heterossexualidade é norma. Embora alarmante, a dissertação de mestrado do pesquisador da Faculdade de Saúde Pública da USP, Luiz Fabio Alves de Deus, também não se esquiva de concluir que se revelar gay, atualmente, é sobretudo estar exposto à violência.     

A pesquisa, empenhada na análise da revelação da orientação sexual, explorou grupos de características sociodemográficas distintas, em diferentes contextos sociais. A partir dos relatos de cerca de mil e duzentos homens gays nos distritos da Consolação e da República na cidade de São Paulo, foi possível constatar que existe uma tendência crescente de discriminação à medida em que se ampliam os cenários de revelação da sexualidade.  

De acordo com os resultados, o indivíduo seleciona determinados ambientes sociais durante o início, mas também ao longo da saída do armário. Luiz de Deus explica que essa seleção de circunstâncias é importante porque o pronunciamento da sexualidade confronta rígidas normas sociais, o que pode provocar retaliações financeiras, afetivas, sociais, além de impactos na saúde física e psíquica do sujeito. A saída parcial do armário, portanto, seria uma estratégia de mitigar o impacto que a revelação pode gerar na vida de uma pessoa.

“Aqueles que compartilharam abertamente a não heterossexualidade em todos os contextos sociais investigados, por exemplo, apresentaram maior tendência de ter sido vítima de discriminação e violência. Essa constatação nos informa sobre uma cultura de naturalização da hostilidade contra a população homossexual que atravessa, inclusive, todas as instituições sociais".  

A questão racial é outro pilar relevante do estudo. Examinando o espaço amostral da pesquisa, a diferença entre brancos e negros que se assumiram é estatisticamente significativa. Dos que se afirmavam brancos, 96% revelaram a orientação sexual, enquanto para os indivíduos autodeclarados pretos, a estatística alcançou 91%. De acordo com o pesquisador, essa discrepância provavelmente é devida à possibilidade de dupla estigmatização sofrida por negros na sociedade.

“Não bastasse existir um estereótipo social muito forte a respeito da virilidade e da masculinidade de homens negros, ainda há o racismo. Para eles, a saída do armário pode ser mais complexa, pois uma vez que se assumem gays, se expõem a outro preconceito. É uma dupla carga de discriminação".

Além disso, a influência da faixa etária também demonstrou ser um fator determinante. Segundo a análise da dissertação, isso se relaciona com os direitos adquiridos nas últimas décadas e, ao mesmo tempo, à maior proliferação do debate sobre o tema. “Para as gerações mais jovens, esse processo tem sido bastante diferente do que para as pessoas mais velhas, que tiveram que assimilar suas identidades sexuais numa conjuntura muito mais opressora”, assinala Luiz.  

Explorando a perspectiva dos ambientes específicos em que as sexualidades foram reveladas, a pesquisa, financiada pela Fapesp, ainda discute possíveis razões que podem ter motivado essa triagem. De acordo com os dados coletados, 96% da população estudada se revelou no contexto da amizade. Na família, esse número cai para 80%, no trabalho para 76% e, na escola, para 75%. Os contextos que se mostraram mais hostis foram o familiar e o escolar.

“O processo de saída do armário geralmente não se inicia na família, no entanto, por se tratar de um ambiente de controle de comportamentos, condutas que sugerem o desejo por alguém do mesmo sexo podem gerar atitudes hostis. O mesmo acontece na escola, sobretudo por conta dos estereótipos de gênero. Então, mesmo que o indivíduo não seja gay, ele pode sofrer homofobia se se comportar de maneira destoante aos preceitos da masculinidade.”  

Orientado pela docente do Departamento de Psicologia Social da USP, Vera Facciolla Paiva, Luiz de Deus acredita que a sua pesquisa pode contribuir para a provocação de que a violência homofóbica ainda persiste na sociedade. Ele ressalta que a mudança desse cenário só será possível diante da ampliação do debate acerca do direito e da legitimidade de diferentes expressões da sexualidade.

“O poder público e as instituições têm uma responsabilidade e um papel fundamental na existência, persistência e disseminação da homofobia. É imprescindível compreender os mecanismos que autorizam essa violência e criar estratégias que possam combatê-la, sobretudo quando ela se manifesta em contextos sociais formadores, como a família e a escola.”  




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