ISSN 2359-5191

04/07/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 89 - Saúde - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia
Estudo obtém evidências para diagnóstico precoce de doença renal em cães
Método mostra-se como alternativa futura para a identificação precoce de lesão renal
A DRC chega a atingir 10% dos cães e 30% gatos acima dos 15 anos de idade. / Imagem: Blog Animal

Silenciosa e tardia em seu diagnóstico, a doença renal crônica (DRC) é um problema comum a alguns animais domésticos e, ainda que poucos suspeitem, chega a atingir 10% dos cães e 30% gatos acima dos 15 anos de idade. Comumente associada à perda de peso, sede excessiva, quadros de diarreia e vômito, além de aumento do volume urinário, diminuição do apetite e queda do pelo, a doença é um fator preocupante quando se fala sobre o encurtamento da sobrevida do animal.

Por seu caráter crônico, a nefropatia tende a ser progressiva, de caráter evolutivo. Como não há um tratamento específico, uma vez instalada, os recursos utilizados visam retardar ao máximo seus avanços: se o animal apresentar vômito, será instituído um tratamento específico para cessá-lo, assim como acontecerá no caso da manifestação de acidose metabólica e outras complicações associadas à doença. Esse tipo de intervenção é conhecido como “tratamento de suporte”.

Atualmente, as possibilidades para identificar a DRC baseiam-se no marcador de creatinina, técnica que só apresenta alterações quando 75% do rim já se encontra comprometido. Em busca de alternativas que permitam maior expectativa de vida e melhores opções de tratamento, a doutoranda Fernanda Chicharo Chacar identificou, dentre as demais proteínas estudadas, uma proteína ligada à vitamina D (VDBP), capaz de detectar, precocemente, a nefropatia em cães. O estudo é resultado de uma parceria entre a Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP e o laboratório da disciplina de nefrologia da Faculdade de Medicina (FM).

Através de uma amostra simples de urina, Fernanda encontrou as proteínas VDBP, RBP e a proteína de tamm-horsfall (THP) em animais que apresentavam uma evolução mais importante da doença, ainda que em estágio inicial.  “Os nossos resultados são bastante interessantes porque foram encontrados em animais do 1º estágio, que são aqueles que muitas vezes não têm manifestação clínica, alteração da ureia ou nas concentrações sanguíneas de creatinina, e que muitas vezes passam desapercebidos numa primeira abordagem”, explica.

Enquanto a VDBP urinária sinaliza a ocorrência de uma lesão no túbulo renal, um segmento do nefron (unidade funcional do rim), através da proteína ligada ao retinol, a RBP, é possível identificar a extensão dessa lesão. Os animais em estágio mais avançado, por sua vez apresentaram menor quantidade da proteína de tamm-horsfall, entendida no estudo um sinalizador de progressão da doença renal. Ou seja, uma vez que esta proteína é exclusivamente produzida pelos rins em condições normais, sua redução ou até mesmo ausência pode indicar o comprometimento dos rins.

Chacar explica que há uma grande variação nos dados que se referem à expectativa de vida após a descoberta da nefropatia. “Há literatura que diz que a sobrevida é de seis meses ou um ano, mas na nossa experiência clínica temos animais com sobrevida para mais de dois anos, por exemplo”. De uma maneira geral, a sobrevida depende do tipo de doença que esse animal tem e da gravidade apresentada. “Identificando cedo, podemos tentar retardar a progressão ao corrigir algumas alterações comuns na doença renal crônica, como anemia e acidose metabólica, por exemplo”. A pesquisadora também aponta a atenção dada pelo proprietário como um fator essencial para que as intervenções clínicas aconteçam antecipadamente.

Vale lembrar que, quando se fala sobre doença renal crônica, algumas raças são predispostas a determinados tipos de nefropatia. “Shih tzu e lhasa, por exemplo, são predispostos à displasia renal; outras raças, como rottweiler e golden, tem predisposição a glomerulopatia. Mas devido à dificuldade em realizar o diagnóstico específico desta e das demais nefropatias, utilizamos o termo genérico doença renal crônica”.

Nesse cenário, outra complicação advinda do diagnóstico tardio é estabelecer sua causa primária, ou seja, o tipo de doença que posteriormente evoluiu para a forma crônica da doença renal.

Fusão de técnicas

Para identificar as proteínas associadas à vitamina D, o estudo utilizou técnicas quantitativa e qualitativa, tendo como referência o guideline, uma espécie de guia constituído por diretrizes e recomendações voltadas a veterinários e clínicos atuantes na área.

“Quantitativamente, precisamos saber a quantidade de proteína contida na urina. Para isso, a técnica rotineira utilizada é a razão proteína x creatinina urinária”. Para essa análise, utiliza-se a eletroforese, uma técnica que permite identificar as proteínas na urina de acordo com seu peso molecular e carga. 

“Porém, ela só diz o peso molecular, então se sei que a proteína ligada à vitamina D tem 55 quilodaltons, essa indicação vai aparecer no gel da eletroforese”, diz. “Por outro lado, também precisamos fazer a análise qualitativa para saber quem são essas proteínas. Não basta eu dizer quanto tem, porque, ao dizer quem são essas proteínas, também é possível dizer onde está a lesão ao longo do néfron.”

A segunda técnica utilizada para provar que a proteína, de fato, era ligada à vitamina D, foi a de western blotting. Num primeiro momento, ela também separa as proteínas presentes na amostra de urina refrigerada a -80ºC por carga e tamanho, mas, com o uso de anticorpos e ligações específicas, é possível obter o resultado qualitativo esperado.


Esquema da técnica de western blotting. Utilizado na pesquisa, o método detecta proteínas em células bem trituradas ou um extrato de um tecido biológico. / Imagem: Fernanda Chicharo Chacar

Entre as dificuldades encontradas durante o estudo, Fernanda aponta a  padronização da técnica - por sua exigência de mão de obra qualificada -  e a seleção dos animais participantes do estudo, considerando a existência de  critérios muitos rigorosos de inclusão e exclusão. “Quando os cães são trazidos ao hospital veterinário da FMVZ, eles normalmente têm afecções. Nesse caso, os animais que tivessem infecção urinária ou quaisquer infecções que pudessem culminar em proteinúria que não fosse por conta da doença renal crônica, eram excluídos.”

A pesquisadora, orientada ao longo de seu estudo pela professora Marcia Mery Kogika, mostra-se otimista em relação à implementação desses métodos no futuro. “O primeiro passo para nós pensarmos nestas proteínas como ferramentas de diagnóstico precoce é aprofundarmos o estudo sobre elas e sobre os métodos utilizados para a sua avaliação, assim podemos aprimorá-los, e no futuro inserí-los com maior segurança na rotina de avaliação do paciente canino ou felino com doença renal crônica”. Para Fernanda, o investimento em educação, principalmente em ensino superior, é essencial, já que contribuirá com a capacitação de mais pessoas para executar as técnicas desenvolvidas. 


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