COM O PROJETO DE LEI do Estatuto da Família, que tramita na Câmara dos Deputados, o debate sobre os direitos dos homossexuais e a definição da palavra “família" ficou ainda mais acirrado. Em uma enquete no site da Câmara os cidadãos brasileiros são convidados a responder a pergunta:

“Você concorda com a definição de família como núcleo formado a partir da união
entre homem e mulher, prevista no projeto que cria o Estatuto da Família?”

Até o fechamento dessa reportagem, 52,95% dos votantes — ou 4.383.627 de pessoas — ainda não reconhecem que uma família possa ser formada por pessoas do mesmo sexo.

O projeto Amor igual, desenvolvido por alunos de jornalismo da Escola de Comunicações e Artes, da USP, pretende questionar a validade da definição de “família” presente nesse Estatuto e mostrar os avanços e retrocessos dos direitos dos homossexuais no Brasil.

Além de explicar o que diz a legislação brasileira, contamos a história de seis núcleos familiares que são ignorados pelo Estatuto da Família. Através da humanização dos personagens, nosso objetivo é valorizar a diversidade humana e o respeito pelas mais diversas manifestações de amor, independente do gênero e da orientação sexual de cada um.

O que a Justiça brasileira diz sobre famílias homoafetivas

O PROJETO DE LEI 6583/2013, de autoria do deputado federal Anderson Ferreira (PR-PE), em tramitação na Câmara Federal, institui em seu artigo 2º que “para os fins desta Lei, define-se entidade familiar como o núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

Por excluir expressamente do conceito de família as formações entre dois homens ou duas mulheres, o projeto tem sofrido críticas de diversos setores da sociedade. Além de desrespeitar as famílias homoafetivas, o texto desconsidera outras composições familiares, como as formadas por avós e netos.

No Congresso Nacional, forças conservadoras e religiosas têm impedido o avanço de legislações que garantam a equiparação jurídica a essa população. No entanto, o Poder Judiciário tem tomado decisões favoráveis aos homossexuais, criando jurisprudências para que o respeito aos seus direitos seja replicado nas demais decisões judiciais.

Em 2011, o Supremo Tribunal Federal, instância máxima da Justiça brasileira, aprovou por unanimidade o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo.

Ana Carla Matos, advogada e professora da Universidade Federal do Paraná, explica que a união estável é comprovada por meio da vivência do casal. Já o casamento civil se constitui se observadas algumas exigências formais e é comprovado por um certidão de casamento. Hoje, os casais homoafetivos do país podem optar por qualquer uma das modalidades, ou ainda solicitar a conversão da união estável para casamento.

“Segundo a nossa legislação, (para reconhecer uma união estável) devemos investigar se o relacionamento foi público, contínuo, duradouro e com o objetivo de constituir família. Neste sentido, coabitação, longo período de convivência, conta corrente conjunta e reconhecimento social de que determinados sujeitos formam um casal são possíveis indicativos de uma união estável”, ela afirma.

Matos ainda afirma que o casal pode fazer um contrato ou escritura pública de união estável, que seria uma prova importante de seu relacionamento. No entanto, ela ressalta que o documento não é obrigatório e apenas declara que as partes reconhecem essa condição.

Após alguns funcionários de cartórios se negarem a realizar uniões homoafetivas, o Conselho Nacional de Justiça determinou, em 2013, que todos os cartórios do país são impedidos de se negarem a realizar casamentos entre pessoas do mesmo sexo e converter suas uniões estáveis em casamentos civis.

Ana Gerbase, advogada e autora do livro Relações Homoafetivas: Direitos & Conquistas (2012, Editora Edipro), ressalta que, para casais homo ou heterossexuais, é importante formalizar a união estável em vida e no cartório, inclusive definindo a questão patrimonial, para garantir os direitos do companheiro em caso de morte ou divórcio.

“Na união estável, o regime natural será o da comunhão parcial de bens, se nada for definido de forma diferente. Neste regime, os bens adquiridos onerosamente durante a união serão de ambos”, explica Gerbase.

Ela ainda afirma que, para qualquer casal, é possível fazer a dissolução da união estável ou o divórcio em cartório, se não tiverem filhos menores de idade. “Também pode ser feito o reconhecimento e dissolução da união estável ao mesmo tempo, caso não tenha sido formalizada anteriormente. É importante definir o fim da união, a fim de preservar direitos patrimoniais, por exemplo”, diz.

Linha do tempo dos direitos de homossexuais no Brasil e no mundo

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A homossexualidade na América do Sul

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Adoção

No que diz respeito à adoção, não há uma legislação específica no Brasil que se refira aos casais homoafetivos. A primeira adoção de uma criança por duas pessoas do mesmo sexo aconteceu em 2006, na cidade de Catanduva (SP), quando Dorival Pereira de Carvalho Júnior e Vasco Pedro da Gama Filho adotaram a menina Theodora.

Em 2015, em uma decisão histórica e inédita, a ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu o direito de um casal homossexual adotar uma criança. A história dos pais, Toni Reis e David Harrad pode ser lida abaixo.

Gerbase afirma que o cadastro nacional de habilitação para adoção não faz qualquer discriminação entre casais heteros ou homoafetivos. “Os casais homoafetivos adotam normalmente, sem qualquer problema, principalmente no Rio de Janeiro”, diz.

Matos ressalta: “Essa possibilidade (de adoção por pessoas do mesmo sexo) se ampara na recente decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu plenos efeitos jurídicos à família homoafetiva, o que inclui a parentalidade, bem como na sistemática da Constituição, que, por sua vez, rechaça a discriminação, enaltece a dignidade humana e busca a promoção de uma sociedade livre, justa e solidária. De qualquer modo, o trajeto até o deferimento da adoção ao casal do mesmo sexo deve ter a mesma exigência dos demais. Há recentes e relevantes decisões judiciais favoráveis nesse sentido”.

Em caso de divórcio, as regras para determinar a guarda dos filhos são as mesmas das dos casais heterossexuais, dando preferência para a modalidade compartilhada.

Conheça a história delxs

*A pedido dos entrevistados, nomes de familiares foram mantidos em sigilo

Renata e Denise

Marcílio e Rafael

Ana e Carmem

Toni e David

Alisson*

Família Barros*

Renata e Denise

JANEIRO DE 2011, SÃO PAULO. Na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), em um projeto de extensão chamado Projeto Redigir, que existe até os dias de hoje, os alunos da faculdade ofereciam aulas de língua portuguesa gratuitamente para pessoas de baixa renda. Naquele ano, o projeto ganhou duas professoras novas - a mineira Renata Franco, estudante de publicidade, e a cearense Denise Eloy, estudante de jornalismo - que até então não se conheciam, mas que, com a convivência no projeto, apaixonaram-se e viram nascer um sentimento que já completou vários aniversários.

O começo

Com três meses de convívio no Projeto Redigir, Renata disse a Denise que precisava conversar. Naquele dia, um pouco nervosa, Renata compartilhou que vinha sentindo algo diferente por Denise desde que se conheceram. Uma semana depois, estavam namorando, e, para elas, foi mútua a sensação de que estarem juntas era o que faltava na vida de ambas.

Este seria o primeiro relacionamento homoafetivo tanto de Renata quanto de Denise. Assim, ao longo dos primeiros três anos, além das descobertas naturais de um relacionamento, as duas também passaram por importantes processos de auto-conhecimento. Nesse período, elas também passaram juntas pela experiência de um intercâmbio no Chile, durante o qual moraram juntas pela primeira vez e ensaiaram para o grande passo que dariam no futuro: dividir o mesmo teto.

“Morar junto foi um posicionamento.
Eu não vou deixar de viver e caminhar
porque as pessoas não estão preparadas”

Esse passo veio em 2014, quando Denise e Renata já dormiam juntas todos os dias, já tinham escovas de dente extras em cada casa e conviviam com alguns problemas típicos de quem vive mais na casa de outra pessoa do que na sua própria, como esquecer documentos importantes na casa da namorada. Percebendo que a logística de morar em casas separadas não estava dando certo, decidiram reunir todas as escovas de dentes em um mesmo lugar, com Renata indo morar no apartamento de Denise.

A vida a duas

Apesar de já se conhecerem há bastante tempo, todo dia é uma nova descoberta para elas, que a cada nova página no calendário vão aprendendo a lidar com questões que fazem parte da vida de todo casal que decide morar junto: as diferenças. Denise é mais organizada, enquanto Renata é mais bagunceira. Por outro lado, Renata acorda assim que o despertador começa a tocar, enquanto Denise tem um ritmo próprio para conseguir despertar e começar o dia. No entanto, elas sabem que ceder um pouco aqui e ali mostra o quanto uma é especial para a outra e o quanto gostam de estar juntas. Assim, para agradar Denise, Renata, por exemplo, toma o cuidado de deixar as roupas esticadinhas no varal. Já para agradar Renata, Denise passou a incorporar à sua rotina o hábito de tomar café da manhã, e este, com o passar do tempo, passou a ser um dos seus momentos preferidos ao lado da companheira.

Foto: Acervo pessoal

Todo dia é dia de amor

Quem entra no apartamento de Denise e Renata se depara com pequenos detalhes que indicam com clareza a personalidade de cada uma e, principalmente, o sentimento que as une. Entre as flores e os delicados bibelôs, passando pela estante cheia de livros e pela variada discografia em vinil, há inúmeras fotos das duas, de amigos e de parentes, e que mostram as diversas fases pelas quais passaram desde o começo da relação que vêm construindo.

Segunda Renata, “morar junto foi um posicionamento de: ‘Eu estou certa do que eu quero e, se você não lida bem com isso, é um problema que você tem que resolver’. Eu não vou deixar de viver e caminhar porque algumas pessoas não estão preparadas”, disse Renata.

As duas não sofreram diretamente com situações de preconceito, mas sabem que ele existe e que, ainda que de uma maneira indireta, ele as afeta. Renata, por exemplo, não se sente à vontade para dizer na frente da família que ama Denise. Já no âmbito profissional, por trabalharem em instituições que não têm um perfil conservador, a orientação sexual de ambas nunca foi um problema no ambiente do trabalho. Seus amigos também não se apresentaram como uma oposição ao amor das duas, pelo contrário, eles entendem que o relacionamento entre Renata e Denise não difere em nada dos outros milhares de relacionamentos de pessoas que se encantam em um primeiro olhar, passam a querer estar juntas, começam a namorar, se casam e constroem um lar - com direito a uma simpática cachorrinha e uma samambaia na porta.

E assim, dia após dia, as duas continuam a acordar cedo, uma ao lado da outra, a dividir o café da manhã, a fazer planos de oficializar a união e de, daqui a alguns anos, aumentar a família que vêm construindo. Vão observando as mudanças de comportamento, de costumes e tendo jogo de cintura para se afirmarem quando necessário e também para se posicionarem, de maneira serena, quanto ao relacionamento e à família que vêm construindo.

Marcílio e Rafael

A HISTÓRIA QUE UNIU A VIDA do produtor de eventos Marcílio de Almeida com o assistente de eventos corporativos, Rafael Inácio, é “bastante rara no meio gay”. Quem assume a casualidade do encontro é o próprio Marcílio, quem confessou ter conhecido seu noivo em um aplicativo gay que funciona aos moldes do Tinder, que aproxima interessados em algo a mais.

“Eu não estava procurando, estava naquele momento solteiro e ‘só ficando’, e ele já estava no final de um relacionamento, um relacionamento já meio que desgastado. Queria por um ponto final, mas precisava de um grande motivo, eu”, brincou o produtor.

Marcílio explicou que os relacionamentos promovidos pelo aplicativo não tem uma boa fama, e que tendem a ser breves. “Todo mundo tem um perfil querendo encontrar o amor da vida, a alma gêmea, e na verdade muita gente quer só sexo”, assinalou.

“No começo, por causa disso, muita gente era contra nosso relacionamento”, disse Rafael.“Porque rola um preconceito”, completou Marcílio. “Quando a gente assume para algumas pessoas que a gente se conheceu através de um aplicativo todos já falam que somos um caso em exceção”.

E são mesmo. Juntos há três anos, o casal lembra que resolveu ir “morar junto”, logo um dia após o término do relacionamento de Rafael. Marcílio contou que as coisas foram acontecendo, e que partir daquele momento eles passaram a dividir o apartamento no centro da cidade. “Ele foi ficando, trazendo uma coisinha ou outra e aí quando vi, já tomou todo o meu guarda-roupa”, disse rindo.

Foto: Acervo pessoal

“Eu não gosto de chocar as pessoas”

“Se você encontrar com a gente na rua e se você não olhar para as nossas mãos e perceber a aliança você acha que somos dois amigos”, disse Marcílio que confessou ser avesso às exposições pessoais. Para ele, a troca de carícias em público deve ser evitada, mas a atitude não se limita a espaços públicos de grande circulação. “Até em ambientes gays a gente se comporta assim”, afirmou.

Apesar da cautela do noivo, Rafael esclareceu que se tiver vontade ou algum momento que for necessário, eles podem sim sair de mãos dadas ou abraçados. Mas não é algo “constante”, já que Marcílio deixou claro não se sentir confortável de expressar carinhos quando há alguém vendo, e o produtor explicou seu posicionamento:

“Uma amiga que tem uma filha de 5 anos, que viu duas meninas se beijando, teve que explicar a homossexualidade para ela. Depois de uma semana essa criança chegou em casa e falou para a mãe que estava namorando com uma amiguinha. Aquilo para mim foi muito chocante. Eu não gosto de chocar as pessoas, eu não gosto de afrontar”, justificou Marcílio.

Foto: Acervo pessoal
Foto: Acervo pessoal

Delícias e dissabores da vida a dois

A vida a dois pode representar um grande desafio para novos casais. Sair da casa dos pais e entrar de cabeça em um relacionamento sério, com ares de casamento, pode enlouquecer. Mas sempre tem suas vantagens. Rafael ressaltou que os momentos em que passou junto do noivo nos últimos três anos foram todos “momentos felizes”, e Marcílio concordou.

“Por mais que tenha uma certa dificuldade, a gente consegue deixar passar de uma maneira bem superficial, que não deixa resíduos, não deixa sequelas. Assim, todo o momento é um momento feliz para a gente que sabe transformar momentos”, contou o produtor.

O assistente destacou, além dos momentos juntos, o que lhe atraiu no parceiro. “Gosto muito dele porque ele é autêntico, ele te fala as palavras que você precisa ouvir naquele momento”, explicou. “Para conselhos ele é ótimo. Eu falo que ele é o que eu precisava para me dar força para seguir em frente”.

“O que eu mais gosto nele é o companheirismo”, completou Marcílio. “Onde quer que eu vá, não importa onde, ele quer sempre estar comigo”.

Mas como nem tudo são flores, Rafael assumiu ter passado por alguns momentos “difíceis” com seu companheiro, principalmente no início da relação, quando assumiu ter ciúmes do Jay, o Pug de estimação do Marcílio. “Era sério mesmo, nós discutíamos sempre por isso. Hoje eu consigo me adaptar um pouco mais, relevar um pouco mais”, ponderou.

Foto: Acervo pessoal

O casamento é uma segurança

Consenso entre os dois, a união oficial desta família traria segurança, mas o assunto faz parte das discussões deste casal que vive junto há três anos – período que pode ser considerado uma união estável.

“Não é oficial, mas a gente está caminhando para isso”, assumiu Rafael .“Ele quer o casamento”, rebateu Marcílio. “Mas eu quero uma coisa simples, por mim eu casaria até escondido, até porque a gente não precisa do papel para nada”.

Marcílio comentou o caso de um casal amigo que morou junto por um período de dez anos, cujo parceiro, viúvo, se viu sem direitos aos bens que construíram, quando a família do falecido o expulsou do apartamento em que viviam juntos, ainda durante a cerimônia do velório.

“Todos sabiam do romance, e no velório a família disse para este meu amigo que ele tinha duas horas para recolher o que ele tinha deixado no apartamento e que era para ele recolher apenas o que fosse dele, e que saísse do apartamento. E eu não queria que isso acontecesse com o Rafa e talvez por isso que a gente pense num papel, como uma segurança”, explicou o produtor de eventos.

Ana e Carmem

UMA APOSENTADA E OUTRA que está “a um passo de se aposentar”, como ela mesma se define. Ana é professora de literatura na Universidade Estadual Paulista (Unesp) e em breve será aposentada. Carmem também foi professora, mas de ensino fundamental, e é aposentada há quase vinte anos: “Mas eu não paro um minuto, não é porque eu sou aposentada que eu não tenho o que fazer”, ressalta.

As duas se conheceram em 1991, em uma festa. Um amigo em comum contou para Ana de Carmem, porque imaginou que elas se dariam bem, mas Ana estava namorando e nada aconteceu. Um ano mais tarde, as duas estavam solteiras e se conheceram pessoalmente, mas ainda não foi neste momento em que rolou o primeiro beijo: “Eu estava até um pouco inclinada, mas ela não deu bola para mim”, diz Ana.

Depois de muitos anos, em 2000, Ana se deu conta que não desistiria tão fácil e procurou por Carmem novamente. As duas estavam namorando nesta época, mas Ana garante que nenhuma das duas estava satisfeita. Essa hipótese foi comprovada, pois Ana e Carmem, em 2015, completam 15 anos juntas.

Foto: Acervo pessoal

Preconceito

“Em coisas muito importantes, eu não sofri preconceito”, diz Carmem que não comentava sobre a homossexualidade com colegas de trabalho: “Não comentava porque era uma época em que não se usava comentar mesmo”.

Ana, por sua vez, agradece pelo lugar em que trabalhou. Lá, todos sabiam de sua orientação sexual e nunca sofreu repressão: “Embora Assis seja uma cidade conservadora, a Unesp é uma bolha mais progressista ali dentro”.

Para a família as duas só revelaram verdadeiramente a orientação sexual quando se casaram, há um ano. “A gente nunca tinha falado, embora sempre juntas, viajando, há quinze anos, todo mundo sabia. Mas a gente nunca tinha falado ‘A mais B é C’”, diz Carmem.

Com os pais mais velhos, elas acreditavam que poderia ter algum estranhamento por parte deles, o que não ocorreu. “Mesmo os nossos irmãos mais reacionários se comportaram bem”, brinca Carmem.

Casamento

Depois de 14 anos juntas, Ana e Carmem decidiram casar em fevereiro de 2014. O objetivo era formalizar a união, para evitar problemas legais em caso de morte ou outras situações, como explica Ana: “Se uma de nós ficasse doente e a outra tivesse que acompanhar no hospital e tomar decisões, o médico iria pedir que alguém da família as tomasse e iria excluir a outra”.

Elas contam que o processo foi como qualquer outro casamento, sem dificuldade alguma. A cerimônia, no cartório, foi apenas para a família e até o famoso pedido de casamento não teve nenhuma cena especial: foi em um ônibus, em Santos.

“[Família] é vontade de estar junto,
embora isso não seja o que acontece
na maior parte das famílias”, disse Ana.

Foto: Acervo pessoal
Foto: Acervo pessoal

Morar juntas e o cotidiano

Carmem sempre morou em São Paulo e Ana morava em Assis, onde dava aulas. Com a perspectiva da aposentadoria de Ana, as duas compraram seu primeiro bem juntas, há três anos, um apartamento em Santos, para onde Ana se mudou.

Mesmo namorando há bastante tempo, elas nunca decidiram morar em uma mesma casa. “Na verdade a ideia nunca foi essa, mas a gente tá sempre juntas, para lá e para cá, então no fim a gente mora juntas – ainda que teoricamente cada uma tenha a sua casa”, diz Carmem. “O cotidiano é uma coisa perversa”, revela Ana sobre essa decisão que, para ela, evita algumas crises, já que cada uma faz o que quer em sua casa. Carmem brinca: “Fui eu que tive a ideia deste ar condicionado aqui”, quando Ana completa: “Mas a gente comprou o ar condicionado juntas”.

Mesmo não morando juntas, Carmem denuncia que no começo foi difícil se adaptar a algumas características da personalidade de sua parceira: “Ela era bastante sensível, às vezes eu falava uma coisa e ela chorava, e eu não estava acostumada”. Mas com o tempo tudo se ajustou – parece que Ana não chora mais. “A Carmem é de Virgem, ela é toda organizadinha, eu sou meio bagunçada, então demorou um pouco para encontrar o equilíbrio”, explica Ana.

Elas acreditam que superar estas dificuldades e viver juntas por tanto tempo só foi possível graças à compatibilidade das duas: gosto musical parecido, afinidade política e “ter um mesmo nível de aspirações: uma não é mais ambiciosa do que a outra”, segundo Carmem. As duas também se consideram pessoas fáceis de lidar.

Foto: Acervo pessoal

Família feliz

Perguntada sobre os momentos mais felizes desta trajetória de 15 anos, Carmem é categórica “Momentos alegres têm muitos, praticamente sempre”, enquanto Ana fala simultaneamente: “Todos”.

“A gente briga pouco, então a gente está sempre de bem, sempre na boa, fazendo coisas legais”, diz Carmem que destaca as viagens que fazem frequentemente, como os melhores momentos da vida a dois, e brinca: “Inclusive a gente já combinou que vamos morrer em um acidente de avião, na volta de uma viagem, que é pra morrer juntas, já ter desfrutado a viagem e deixar as dívidas pra quem ficar”.

Super ativas na internet e redes sociais, as duas comentaram sobre a polêmica de beijos entre homossexuais nas novelas. No primeiro capítulo da novela Babilônia, em que as personagens de Fernanda Montenegro e Nathália Timberg se beijaram, Ana não estava assistindo, mas acompanhando pelo Twitter a reação das pessoas: “Estava todo mundo dizendo ‘Nossa, estava tocando Bethânia e elas se beijaram!’, e aí eu coloquei assim no Twitter: ‘Não sei por que vocês estranham, aqui em casa duas velhas se beijando ao som de Bethânia é todo dia’. E quando disseram que elas não iam mais se beijar eu escrevi: ‘Mas aqui em casa as velhas vão continuar se beijando sim’.

Toni e David

Foto: Acervo Pessoal

TONI E DAVID VIVEM JUNTOS HÁ 25 ANOS. Hoje com 50 e 57 anos, respectivamente, o casal mora em Curitiba com os três filhos adotivos: Alyson, Jéssica e Filipe. No entanto, assim como para muitos outros casais homossexuais, formar uma família não foi uma tarefa fácil.

Apesar de casados, eles só começaram a discutir a possibilidade de adotar filhos por volta do ano 2000. A ideia era adotar uma menina e um menino, com cinco ou seis anos de idade. Mas foi apenas em 2005 que eles resolveram dar entrada em um processo de adoção conjunta na Vara da Infância e Juventude de Curitiba, como faria qualquer casal heterossexual.

Para evitar a burocracia que esse pedido pudesse trazer, o caminho mais fácil seria que cada um adotasse uma criança individualmente como solteiro, sem especificar que se tratava de um casal. Porém, eles contam que descartaram essa opção por dois fatores importantes: a luta pela igualdade de direitos garantida pela Constituição Federal; e a garantia de que, caso algum dos dois falecesse, o outro teria direito de ficar com a criança. “Se adotássemos como solteiros, o outro não teria automaticamente o direito da guarda do filho no caso de um falecimento”, explicam.

Luta judicial

Esse processo deu início a uma luta que duraria 10 anos. Por ser o primeiro caso do tipo na cidade, faltava ao juiz precedentes para embasar sua sentença. Somente três anos depois do pedido eles receberam uma decisão favorável. No entanto, eles consideraram a sentença restritiva e discriminatória: eles só poderiam adotar meninas maiores de dez anos. O casal recorreu e, por fim, ganhou o caso na segunda instância.

A história, porém, não terminou por aí. Um promotor do Ministério Público recorreu à decisão e levou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), alegando que casais do mesmo sexo não formavam uma entidade familiar e, portanto, não poderiam adotar conjuntamente.

O cenário começou a mudar em 2011, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união homo afetiva e, com isso, concedeu direitos a casais gays e abriu espaço para que eles tivessem direito à adoção. Nesse mesmo ano, Toni e David conheceram Alyson Miguel, um garoto de dez anos que foi separado da família ainda criança por motivos de maus-tratos e já havia passado por sete diferentes abrigos.

O primeiro encontro com o garoto aconteceu em setembro de 2011. Após muitas conversas, eles receberam a guarda provisória em dezembro, por um período de seis meses. Apesar dos recursos do promotor contra o pedido de adoção, a juíza responsável pelo caso entendeu que, até a decisão do STJ, o que valeria seria a decisão favorável do Tribunal de Justiça do Paraná.

“Durante o período de habilitação e espera, lemos livros sobre o tema e participamos de vários cursos de preparação para a adoção tardia. No entanto, sabíamos que a adaptação poderia ser um processo marcado por muitas dificuldades”, conta o casal. Um dos maiores desafios, segundo eles, foi descontruir os preconceitos que Alyson já tinha. “Ele chegou a falar que tinha nojo de homossexuais, mas conversamos e ele se desculpou. Essas ideias vieram principalmente das convicções religiosas dos abrigos e das famílias que ele já tinha passado”, lembram.

“Achamos importante dar visibilidade
à questão gay e mostrar para a sociedade
que não se trata de um bicho de sete cabeças"

Foto: Acervo pessoal

O recurso apresentado pelo promotor contra a adoção foi negado pelo STJ em 2014, e a adoção foi validada por uma decisão favorável da ministra Carmen Lúcia do STF somente em março de 2015, dez anos após o pedido. “Se as uniões homoafetivas já são reconhecidas como entidade familiar, com origem em um vínculo afetivo, a merecer tutela legal, não há razão para limitar a adoção, criando obstáculos onde a lei não prevê”, diz o relatório.

Após o processo, eles ainda precisaram superar algumas burocracias para tirar os documentos do menino, já que os sistemas eletrônicos exigiam o nome da mãe. Com a sentença em mãos e visitas aos Correios e à Receita Federal, o CPF finalmente foi emitido.

Outro desafio foi enfrentado na escola, onde Toni e David se preocuparam em conversar com a diretora e os professores para explicar o histórico de Alyson e buscar soluções conjuntas entre escola e família. Segundo eles, a maior preocupação era evitar que o arranjo familiar deles incentivasse o bullying. Com a ajuda de um psicólogo, ele conseguiu se adaptar bem aos estudos. Isso não evitou, porém, as brincadeiras de mau gosto. “Ele contou que alguns colegas escrevem coisas pejorativas sobre a nossa família”, conta o casal.

A relação com Alyson se tornou cada vez mais amistosa e, apesar das brigas e dificuldades para lidar com um filho, eles conseguiram estabelecer uma boa relação. “Para nós, foi um ano de muita aprendizagem, uma vez que estávamos sendo pais pela primeira vez. Crescemos como pessoas e ficamos muito felizes de poder formar uma família. Para completar nosso sonho, só faltava adotar uma filha”, afirmam.

Anos depois de adotar o garoto, eles receberam um comunicado da Vara da Infância e Juventude os convidando para conhecer Jéssica, de 11 anos, e seu irmão Filipe, de 8. Após algumas visitas, foi concedida a guarda provisória das crianças. “A adaptação com Jéssica e Filipe foi mais harmoniosa do que com o Alyson. Depois de um ano juntos, estamos convivendo muito bem como uma família”.

Alisson e companheiro*

*O nome do companheiro de Alisson foi mantidos em sigilo

ALISSON TEM 37 ANOS. É formado em Letras, estuda psicologia e trabalha atualmente na área de telecomunicações. Ele e seu companheiro, de 53 anos, estão juntos há mais de nove anos. Conheceram-se em uma sala de bate-papo na internet, encontraram-se e, depois de seis meses, começaram a namorar. No dia 27 de junho de 2015, oficializaram sua relação em um casamento civil.

De acordo com Alisson, os dois tinham uma vida bem diferente no início do relacionamento. Além de ser mais velho, seu companheiro tem um filho e neto. Ele também conhecia menos do universo homossexual do que Alisson. "Mas tudo foi uma experiência. No começo, tudo é válido", ele afirma. "Você está conhecendo os hábitos e os costumes". Ele acredita que justamente o perfil de seu companheiro permitiu que ficassem tanto tempo juntos. Ele buscava uma pessoa mais velha, que lhe passasse estabilidade e confiança. "Eu acho que eu consegui, para estarmos nove anos juntos".

A decisão de casar veio do receio do que poderia acontecer no futuro. "A gente nunca sabe o que vai acontecer amanhã", diz ele, que mora junto com o companheiro em um apartamento próprio. Antes da liberação do casamento civil homoafetivo, devido a problemas de separação de bens que ocorreram com outros casais após a morte de um dos companheiros, eles decidiram fazer um contrato de união civil estável. Agora, com o casamento legalizado, irão converter a união civil em casamento estável. "Vamos dar à César o que é de César", diz ele.

"O preconceito está muito maior do que
era antes porque os homossexuais
estão se mostrando mais"

A união entre os dois, aliás, foi o que tornou essa entrevista diferente das demais que realizamos nesta reportagem. A pedido de seu companheiro, que não quis aparecer à câmera, Alisson nos concedeu seu depoimento sem mostrar o rosto. A razão está no preconceito que um depoimento desse tipo poderia gerar. Para evitar comentários desnecessários e preservar o casal, todas as gravações foram feitas sem identificá-lo ou citar o nome de seu companheiro. "Quando você é casado, você tem que respeitar o seu cônjuge. Eu tenho que respeitar a vontade dele", ele reafirma.

Foto: Daniel Morbi
Foto: Valdir Ribeiro Jr.

Preconceito

A questão da discriminação, para o casal, é delicada. Publicamente, eles nunca sofreram por situações homofóbicas. Porém, como ele diz, "existem certos momentos em que você fica na defensiva". Assim, as questões externas acabam sendo mais fáceis de relevar. O que deixa marcas, entretanto, são as relações com familiares. Enquanto a família de Alisson se mostrou aberta à declaração de sua homossexualidade, situações discriminatórias já aconteceram entre ele e a família de seu companheiro. "Às vezes, a gente quer aprovação da família, e você não tem. Isso me chocou um pouco, me deu uma desestabilizada".

O preconceito, para ele, tornou-se muito mais evidente nos dias de hoje. As recentes representações de casais homoafetivos na mídia são válidas, porém, ao mesmo tempo, tornaram-se uma espécie de termômetro para determinar as reações das pessoas. "O preconceito está muito maior do que era antes, porque os homossexuais estão se mostrando mais", ele afirma.

Este preconceito levou o casal a decidir que não irá adotar filhos. Eles chegaram a visitar orfanatos, mas, no fim, decidiram contra. Alisson sempre teve o sonho de ter uma criança, porém tem receio de que seu filho sofra pelo fato de ser criado por um casal homoafetivo. "Eu sei me defender. E uma criança?", ele questiona. Para ele, o Brasil ainda é um país muito arcaico e questões que à primeira vista podem parecer pequenas, possuem uma carga muito forte. Por exemplo, uma comemoração de dia das mães na escola. "A vida é muito pesada. Tudo que for possível para simplificar minha vida, eu vou simplificar".

Porém, a falta de um filho não faz com que Alisson e seu companheiro não tenham formado uma família. Essa família é definida por ele pela confiança que um tem no outro. "Ele tem os seus pontos a serem melhorados e eu também. A gente respeita isso. Respeita a individualidade de cada um", ele diz. Além disso, a força que eles têm de certos familiares os ajuda a continuar juntos.

Para Alisson e seu companheiro, o significado da palavra "família" não é o que parte da sociedade pensa ser. Família não é somente pais e filhos. Ninguém é obrigado a seguir os ideais de família que a sociedade impõe. A "sabedoria" popular diz que um homem deve plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho para ter uma vida plena. Alisson e seu companheiro não acreditam nisso. A felicidade não depende dessas normas sociais.

Família Barros*

*Os nomes dos familiares da entrevistada foram mantidos em sigilo

UMA MÃE, DOIS PAIS E TRÊS FILHOS. Essa é a família Barros que vive em João Pessoa, na Paraíba. Anna Barros, advogada, é a única filha da família e é a porta-voz dessa história. O texto a seguir foi editado a pedido da Anna para proteger e dar tranquilidade a sua família que já foi alvo de preconceitos na cidade por diversos motivos, entre eles, por fazer parte de uma relação homoafetiva.

“Tenho muito orgulho da minha história, e quero muito contá-la para o mundo, através da minha ótica”, contou, orgulhosa, a advogada.

Anna começou explicando sua árvore genealógica, que é “pouco comum”: sua mãe é de Belém do Pará e depois de casar com o pai biológico da paraibana, eles se mudaram para João Pessoa para acompanhar o cargo de sua mãe que era professora do Instituto Federal da Paraíba (IFPB).

“Quando chegaram aqui, minha mãe engravidou. Seis meses depois que eu nasci, meus pais se separaram”, explicou Anna, que confessou não ter uma relação muito próxima com seu pai biológico, que retornou, após o divórcio, para Porto Velho

Sem família na cidade, a mãe da advogada se dedicou ao trabalho para tentar se adaptar a nova rotina. Foi no IFPB que ela conheceu o pai –de criação- de Anna, “esse cara é o meu pai”, afirmou a paraibana. “Não tenho lembranças dele não existir na minha vida”.

"Eu nunca consegui entender porque uma pessoa é discriminada só por ela ser gay”

Aos cinco anos, Anna ganhou de presente mais um pai. O marido de seu pai de criação é para a advogada parte de sua referência paterna. “Tudo o que era para o pai, na escola por exemplo, eu fazia para os dois, e a minha mãe também tem essa relação, apesar de hoje viverem separados”, assinalou a jovem.

“A família deles me adotou, as famílias me adotaram”, contou a emocionada advogada. A família de Anna hoje é composta por sete pessoas: os “dois meninos”, seus irmãos mais novos (de quatro e seis anos), adotados pelos pais, uma tia que mora junto com eles, sua mãe e ela mesma. “Essa é a nossa família, quando a gente viaja, viaja todo mundo junto, quando é Natal, aniversário, é sempre assim... e a minha mãe é madrinha dos meninos”.

Separados, os núcleos familiares se mantém próximos, explicou Anna. Apesar de viverem em casas separadas, pais e mãe da advogada buscam sempre se reunir aos finais de semana naquilo que já se tornou uma “espécie de ritual”. Anna disse que toda sexta-feira eles vão para o apartamento do casal, que é maior, e ficam juntos até a segunda-feira. Durante a semana, a irmã mais velha é a responsável por buscar os mais novos na escola.

“Lugar muito retrógrado”

Com pouco tempo de formada, a advogada lamentou viver em uma cidade a qual considera um “lugar muito retrógrado”. Para ela, é uma preocupação constante observar a argumentação conservadora e homofóbica de colegas da faculdade de direito.

“Fico preocupada porque essas pessoas vão ser os operadores do direito do amanhã. Estudava com gente que dizia que ‘gay não tem que adotar porque não, porque não pode’, sabe?” .

A bacharel lembrou que durante a faculdade, em um certo momento, perguntou para uma professora, após a equiparação da união homoafetiva com a união civil, se os casais gays poderiam adotar, e a docente confirmou que sim, se havia a equiparação este seria um direito, mas que a preferência para os juízes ainda se manteria para os casais heterossexuais.

“Esse povo uó”

*Uó: na gíria gay significa algo desagradável, ruim.

Motivada a lutar pelos direitos das minorias, a advogada confessou que seu maior sonho é se tornar procuradora da república, uma fiscal da lei. Para ela, só assim, com um cargo relevante, é que vai conseguir conquistar o respeito da maioria das pessoas para suas lutas cotidianas.

“Quero botar pra lascar nesse povo uó mesmo, porque é só assim, que, infelizmente, as pessoas te respeitam. Sem isso, você não é nada, você é só um excluído”, lamentou.

"Ei, tu é filha de gay, é?". “Sou”.

Durante a época escolar, Anna se lembrou de alguns momentos em que percebeu a resistência dos colegas em relação a sexualidade dos pais. Ao ser apresentado aos pais de Anna –seus dois pais e mãe- um dos estudantes ficou chocado e incitou os colegas a perguntarem a Anna se seus pais eram gays. “Nunca me importei muito com isso, respondia ‘sim’. Para mim sempre foi muito natural”, ponderou.

Os anos se passam, mas as histórias se repetem. O que Anna viveu no colégio, hoje atinge seus irmãos mais novos. Aluno de uma tradicional escola cristã da cidade, o irmão de seis anos teve que ser transferido de colégio após receber questionamentos agressivos de seus colegas sobre a formação de sua família.

“Como era no início do ano letivo e ele era muito pequeno, a gente optou por mudar de escola”, explicou a paraibana. “A gente nota que as escolas não estão preparadas para estes novos modelos de família, mesmo eu, quando estudava a quinta série, passei por coisas parecidas”.

A advogada lembra que em uma das aulas de “Orientação Humana”, de sua escola, o diretor, que era “ex-militar”, ensinava que família era constituída apenas por pai, mãe e filhos. “Só que eu olhava para a minha [família], em que no começo só tinha mãe, depois eu tinha dois pais, e meu pai biológico morava em outro canto… aí eu me sentia, assim, tão mal pessoalmente”, contou.

“Não me sentia parte do grupo”, lamentou Anna. “Você vê que as escolas não estão preparadas para se adaptar a essas novas famílias que não são novas, a gente só pôde botar a cara no sol agora. Você não vê um igual, você acha que você é sozinho no mundo. Não tem mais ninguém assim”.

“A gente não se esconde, mas não damos explicação”

É para garantir a segurança da família, que os dois pais de Anna resolveram se casar oficialmente. O documento, contou a advogada, foi feito para a proteção, dentre outras coisas em caso de morte eventual. Mas confessou que são poucos os que conhece que tiveram essa oportunidade.

“Não conheço ninguém que tenha dois pais ou duas mães, porque eu noto que a geração dos meus pais é muito conservadora, e foi muito difícil para eles saírem do armário. Eles são muito mais reservados, é diferente para a minha geração, em que meus amigos são gays abertamente”, disse Anna.

Nossa equipe

Amor igual é um trabalho elaborado por sete alunos de Jornalismo do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE) da Escola de Comunicações e Artes (ECA), da USP. O projeto fez parte das disciplinas Jornalismo Online e Projetos em Televisão.

Ana Paula

Daniel Morbi

Fabio Manzano

Fernanda Maranha

Larissa Teixeira

Gabriela Stocco

Valdir Ribeiro Jr.

Daniela Osvald

Professora da disciplina “Jornalismo Online”.

Mônica Nunes

Professora da disciplina “Projetos em Televisão”.

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