Mediadora: Nossa mesa redonda de hoje vai tratar da divisão de profissões por gênero e
como essa classificação prejudica a todos, mas principalmente às mulheres, que sofrem
opressão e exploração no ambiente de trabalho. Quem quer começar?
Damiana: Posso começar? (todos assentem). Trabalho como pintora de casas há três
anos e as mulheres para quem eu trabalhei sempre me admiraram por desempenhar essa
função. Elas me dizem “nossa, você é muito corajosa, uma guerreira”. Já os homens
olham sempre com curiosidade e um pouco ressabiados. Quando estou fazendo a parte
de fora das casas, as pessoas param para olhar. Mas eu amo a minha profissão, não
tenho vergonha.
Manoel: Eu estou desempregado há três meses. Faço faxina e essa é uma área que ainda
oferece bastante vaga. Mas tenho certeza que serei rejeitado se oferecer meus serviços
individualmente. As pessoas estão acostumadas com mulheres fazendo isso. Não sei se
elas deixariam um homem entrar na casa delas.
Giulia: Essa diferença entre essas profissões consideradas femininas ou masculinas tem
a ver com a maneira que as pessoas são criadas. Professor de ensino infantil, que cuida
de criança, é uma categoria esmagadoramente feminina e se enquadra na ideologia de
que as mulheres são mães por natureza e nasceram pra cuidar de crianças. No ensino
universitário, tem muito mais homens, porque tem a ver com a intelectualidade, que não
está ligada à ideia da mulher emocional e não racional. É uma ideologia falsa, porque os
homens podem sim, e devem, cuidar das crianças e têm totais condições de serem
professores infantis. E as mulheres têm capacidade de serem professoras universitárias e
não são inferiores.
Márcia: Eu sou a Márcia, trabalho na construção civil, no estado do Pará, e sou da
diretoria do sindicato da construção civil. Dentro do canteiro de obras, o sistema
machista é muito opressor e as mulheres sofrem muito assédio moral. A mulher é
considerada o sexo mais frágil, falam que ela não dá conta de carregar as coisas, de
desempenhar as tarefas físicas, que o trabalho da mulher não pode ser classificado por
não ter a função. Nós estamos lutando pra que elas sejam classificadas e qualificadas,
porque nós temos pedreiras, ajudantes de obra, marceneiras, carpinteiras. Fora isso, tem
toda a questão do assédio sexual. Quando a mulher vai atrás de um emprego, ela tem
que ser bonita. Se ela é bonita, tem que sair com o encarregado, o mestre de obras. Se
elas saírem com outros trabalhadores do canteiro, elas são mal faladas. Elas não podem
se relacionar com ninguém. E se elas forem brigar pelos direitos delas, elas são
castigadas. Não podem se envolver com o movimento sindical, é muito difícil angariar
mulheres para a luta.
Mediadora: Que horror, Márcia. É inacreditável que ainda passemos por isso. Para
finalizar as falas, chamamos a Sílvia, membra da executiva nacional do Movimento das
Mulheres em Luta.
Sílvia: É muito grande a opressão que as mulheres sofrem no trabalho e essas pautas
precisam ser incorporadas às reinvindicações dos sindicatos e às lutas por melhores
condições de trabalho no geral. A segregação do trabalho por gênero faz com que as
mulheres que decidem optar por transgredir essa norma sejam vistas como incapazes de
desenvolver a atividade profissional e acuadas dentro do próprio emprego. Para fazer
com que as mulheres se sintam fortalecidas inclusive pra lutar contra a exploração, é
preciso que isso seja combatido nas organizações de trabalhadores e convença os
homens da classe que isso é uma imposição da ideologia machista.
Wana: Mas quando começamos a nos mobilizar, nós mobilizamos também as outras. Eu
trabalho como motorista e já recebi o testemunho de muitas mulheres que tomaram
coragem para tirar habilitação e até procurar esse emprego depois de me verem
dirigindo ônibus. Não podemos perder as esperanças.
Mediadora: Agradecemos a presença de todas e todos e até o próximo debate.