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Como se fosse máquina

 

Por William Nunes

 

 

A câmera

 

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Olá. Sou a Sony, câmera de um prédio de classe média da zona sul de São Paulo. Preciso contar uma coisa que tenho reparado nas pessoas daqui. É engraçado… elas não pegam mais elevador juntas. Acho que esse tal de capitalismo transformou todos em uns robôs autosuficientes, individuais demais.

 

Outro dia, a Sheila, moradora daqui, estava cheia de compras na mão e não estava conseguindo abrir a porta do elevador. Logo atrás vinha o seu Antônio. Mas ela não pediu ajuda, não. Se apressou em colocar as sacolas pra dentro do cubículo e ó… Se mandou pro nono andar. Ela conseguia sozinha! Outra vez foram a Maria do Rosário e a Nena. Eu só observava pelo infravermelho. As duas foram até o vigésimo primeiro mexendo no celular. E nem falaram do tempo! E aí se deram um boa noite, tipo quando o Windows desliga, sabe? Automático. Fico pensando se elas não estavam preocupadas demais com esse tal de dinheiro e esqueceram de se falar, né? Porque é disso aí que muitos humanos precisam pra sobreviver. Sou só uma câmera de segurança, mas sei disso. E me contaram que ai! de quem não tiver… não sobrevive! Então deve ser normal a Nena e a Rosário não terem se falado. Elas precisam sobreviver.

 

É engraçado… o elevador devia unir mais as pessoas daqui do prédio. Parece que tudo o que essa tecnologia e esse tal de capitalismo tocam, eles separam, transformam em máquina. Até os humanos.

 

Mas, enfim, não sei do que estou falando. Eu sou só uma câmera de segurança…

 

Precisamos teclar

 

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Filho, precisamos ter uma conversa. Você não está colaborando com as coisas da casa. Não é justo eu trabalhar o dia inteiro, chegar, e a casa estar uma zona. Eu não aguento mais essa situação e, se as coisas não mudarem, vou ter que tomar algumas atitudes e cortar alguns privilégios, porque a casa é minha. Outra coisa: a gente anda muito afastado, você não conversa direito comigo, não conta pra mim como andam as coisas quando tento puxar papo. Sou sua mãe e acho que mereço um pouco mais de respeito. Vivemos debaixo do mesmo teto e, por mais que as coisas estejam difíceis, somos só nós dois e precisamos um do outro. A gente precisa conversar mais, porque nessa casa não tem diálogo.

 

Visualizada às 13h06

 

Pane

 

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Cinco em ponto. Funcionário 5246 da Volkswagem do Brasil. Era ele quem acordava o despertador. Iniciava. Escovava os dentes. Punha uma roupa. Calçava as botas. Dava um beijo na mulher e ia. Chegava. Batia o ponto. Entrava e agora só via metade dos colaboradores que via antes. A outra metade virou parafuso, metal, fluido em lugar de articulação. Segundo estatísticas, caíram pela metade também as oportunidades de se encontrar, conversar e integrar. O chefe agora o chama. “O funcionário 5246 está sendo desligado”. Pane no sistema.

 

*

 

Cinco em ponto. Funcionário 5247 da Volkswagem do Brasil. Era ele quem acordava o despertador…

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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