logotipo do Claro!

 

Em cena: ruídos no silêncio

 

Por Igor Truz

 

teatro

Um quarto escuro. Silêncio absoluto. Poucos feixes de luz revelam uma inesperada silhueta em frente à porta. Na ponta dos pés, com passos cuidadosos, a sombra avança com cautela pelo local.

 

O parágrafo acima retrata um suspense. O caminhar na ponta dos pés revela o mistério, a preocupação em não fazer ruído.

 

Isso não tem sentido para os surdos.

 

“Existem imagens relacionadas aos sons, como entrar de mansinho em uma sala. Para eles [surdos], não tem sentido”, explica Fabiano Moreira, diretor da Companhia Alvo de Teatro, que hoje desenvolve o ousado projeto Teatro para Surdos, um esforço conjunto para inclusão e aperfeiçoamento artístico.

 

O plano é ambicioso. Esqueça o intérprete em Libras no canto do palco, concorrendo com as cenas pela atenção do público. Não se trata de traduzir, mas sim de oferecer condições para que os surdos consigam sentir a experiência de acompanhar de maneira plena o espetáculo.

 

“A peça em Libras é a mesma coisa que em japonês. Você só vai falar a língua deles”, sentencia Fabiano, com um tom de voz baixo, calmo, mas gestos vigorosamente expressivos, que gritavam aos olhos. Já está no clima do projeto.

 

A ideia de fazer barulho é o objetivo central da Alvo de Teatro. Após um ano de estudos, a intenção é conseguir, nas encenações, transformar sons, falas, música, tudo que se pode ouvir, em movimentos corporais.

 

Os atores iniciarão, em breve, o primeiro ato do projeto na escola municipal Helen Keller, no centro de São Paulo, com apresentações de trechos de seus espetáculos adaptados para 200 alunos surdos.

 

Os jovens não serão coadjuvantes. A atuação será ativa. A deficiência, neste caso, será a qualidade indispensável para o trabalho de consultoria dos estudantes que, não apenas dirão o que entenderam das adaptações, mas também apontarão os caminhos para melhorar as atuações.

 

“O viés do trabalho é de aperfeiçoamento artístico”, lembra Fabiano, deixando claro que na relação com os alunos não existe hierarquia e sim a troca de conhecimentos e experiências. O líder da Companhia, que começou na dramaturgia organizando peças bíblicas, quer mergulhar no universo dos surdos para evoluir como ator. Explorar e aprender para ir além e tentar construir as bases metodológicas para produções teatrais mais inclusivas ao público com deficiência auditiva.

 

Antes disso, no entanto, ele e seus companheiros precisarão se reinventar. Acostumados com técnicas convencionais, os atores deverão encontrar maneiras criativas para se comunicar em silêncio. Assim como em um mergulho real, Fabiano não espera vida fácil no mundo sem sons: “é como tentar respirar debaixo d´água. Aquilo vai te fazer falta na peça”.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

Expediente

Contato

Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Bloco A.

Cidade Universitária, São Paulo - SP CEP: 05508-900

Telefone: (11) 3091-4211

clarousp@gmail.com