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Engolidos pelo sistema

 

Por Vinícius Bernardes

 

 

Um olho, depois o outro. Assim Maria acorda todos os dias. Coloca os óculos. Calça os chinelos. Toma um banho. Apressada, desce para a cozinha. Coloca a água no fogo. Retira a roupa do varal. Arruma a bagunça da sala. Vai até o espelho. Veste a roupa branca. Está pronta. Pega a xícara. Bebe o café. 5:30h. Hora de sair. Com as chaves em mãos, abre a porta. Corre para o ponto de ônibus.

 

Um degrau, depois o outro. Assim Maria sobe as escadas do ônibus. Está quente. Procura um lugar. Não encontra. Espreme-se no corredor. Segura-se em um dos apoios. Apertada, tenta não cair. O ônibus balança. Coloca os fones de ouvido. Não escuta mais nada. Tenta se desligar. 1 hora. 2 horas. Trânsito. Um passo, depois o outro. Assim Maria entra no Hospital. Lá, os pacientes, em quartos ou em corredores, aguardam seus cuidados. Bate o cartão. Olha para a fila. Tenta não se assustar. Chama o primeiro. Medica. Aplica injeção. Equilibra-se entre a UTI e a Internação. Atravessa o corredor. Entra nos quartos. Alimenta os enfermos. Troca o soro. Está cansada.
Uma garfada, depois a outra. Assim Maria almoça todos os dias. Come apressada. Não saboreia. Engole. Rápida, pega outro ônibus. Segue para o segundo hospital. Lá, a mesma coisa. A imensa fila toma conta do corredor. Chama o primeiro. Medica. Aplica injeção. Equilibra-se entre a UTI e a Internação. “Será que o dia já está próximo de terminar?”. Uma badalada, depois a outra. Assim Maria completa sua rotina. O sino da igreja anuncia o término do dia de trabalho. Mas aquele não era o fim. Correndo, segue para o ponto de ônibus. Pensa nos afazeres de casa. A louça. A janta. As crianças. De volta ao lar, abre a porta. Exausta, verifica se há café na jarra sobre a mesa. Nada. Olha para a sobra da xícara da manhã.

 

Sonhava com o dia em que se libertaria daquela rotina. Mas como? Tudo estava sob sua responsabilidade: o aluguel, a água, a luz. Não podia pedir as contas sem mais nem menos. Teria de se adaptar. Conformada, observa o líquido escuro. Preso em um recipiente de vidro, tentando se adaptar à forma que lhe é imposta. Cansada, Maria pega a xícara fria. Engole o resto de café, como o Sistema a engole dia a dia.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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