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Jogo da oportunidade

 

Por Mateus Feitosa

 

 

Suas mãos estavam sujas e calejadas, mas isso não era um problema. Ao girar a chave na porta do carro o cheiro de seu interior tomou conta da garagem, e, assim que o sentiu subir em seu nariz, as cicatrizes de sua mão pareciam estar se curando sozinhas. O táxi novo só não brilhava mais que seus olhos. O sufoco havia passado. Queria chorar, mas não iria. O amanhã estava aí e nunca foi tão promissor. Entretanto, as coisas nem sempre foram assim.

 

 

Tudo começou com uma ideia. “A oportunidade sempre está lá, basta saber como enxerga-lá”. Pelo menos era isso o que sempre ouvia de seu pai. Ele saiu de casa cedo, com uma ingênua determinação. Caminhava com o mundo em suas mãos, nuas e sem nenhuma marca do trabalho. Foi para a cidade grande, que crescia sem pedir licença. Começou pequeno, porteiro de um prédio de luxo. “Colha os frutos de seu trabalho, todos começam em algum lugar”, lembrava de seu pai. Recebia pouco. Via as pessoas passando perto de seu balcão, sempre com pressa e com algum lugar para ir. Às vezes parecia que sabiam mais que ele, que tinham um rumo. Se fosse embora, alguém perceberia sua ausência? Ninguém sabia seu nome, era o “porteiro”. Pouco importava, faria seu nome.

 

 

A cidade pedia e ele atendia. Começou a fazer bico em construções. Deu entrada em um apartamento ao lado de uma das obras em que trabalhava. O lugar tinha três tímidos andares, era feito de tijolos que de tão desgastados já não brilhavam mais e pareciam estar prestes a sucumbir a qualquer momento. “Guarde, conte e invista seu dinheiro”, dizia o pai em sua cabeça. Contava seu dinheiro como contava o preço de cada grão de arroz que comprava. Vivia um dia atrás do outro, caso pensasse demais perderia tempo.

 

 

Viu seu trabalho ganhando vida, em pouco tempo o prédio estava pronto. Três tímidos andares feitos de tijolos que sangravam de tão vermelhos. Nunca mais entraria lá, seu serviço estava completo. Apenas seu novo vizinho que teria todo aquele espaço para si só. Já ele, desfrutaria de seu feito somente da janela de seu minúsculo apartamento. “Trabalhará para os outros para que um dia trabalhem para você”, as palavras do pai pesavam em sua mente. Das suas mãos aquele lugar tinha nascido e a elas jamais voltaria.

 

 

Tudo bem. Usou o dinheiro da obra para colocar um táxi em sua garagem. O amanhã estava aí. Queria chorar, mas não iria. Sua mão já não doía tanto. Dali a pouco passou de um táxi a oito em seu comando, uma nova empresa.

 

 

Um dia seu vizinho entrou no táxi. Levou-o até o centro da cidade, mas, sem carteira e sem vergonha, seu passageiro pediu para deixar fiado. As coisas caminhavam bem, até que, como o motor do seu carro, o país parecia não funcionar. Recebia a mesma quantidade de dinheiro, mas ele já não valia mais a mesma coisa. Guardava tudo em sua poupança, até o dia que o Presidente pediu emprestado. Não tinha mais como sustentar sua nova empresa. Não importava, sua salvação estava ali. Seu vizinho iria investir em seu negócio. Mas, poderia ser fiado?

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

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