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Para te proibir… nem o céu é o limite

 

Por clarousp

 

Por Ana Carolina Aires

“Olha o carro do ovo passando. Ovo direto da granja. Dez reais é a cartela com 30 ovos. Ovos branquinhos, ovos que a galinha chorou! Olha o carro…”

 

 

Quem nunca acordou ao som do carro do ovo? Existem centenas deles espalhados pelas ruas e esquinas do Brasil. O vereador do Recife, Romero Albuquerque, incomodado com um que passa logo cedo perto de sua casa em Boa Viagem, propôs recentemente um projeto de lei que visa proibir esses carros. Os ouvidos de muitos agradeceriam. Já existem tantas proibições consideradas “malucas” propostas nos municípios, que essa nem seria tanto assim.

 

 

Reginaldo Balão, advogado especialista em direito processual civil, entende que o processo legislativo deve ser levado a sério e não deve ser regido por interesses individuais. Em Santa Bárbara d’Oeste, cidade do interior de São Paulo, foi aprovada, em 2015, a lei ordinária nº 3.791 que passou a proibir a implantação de chips e dispositivos eletrônicos no corpo humano, por esses serem considerados a “marca da besta”. Proposta pelo vereador Carlos Fontes, do PSD, o texto da lei não tem nada a ver com teorias relacionadas a série Black Mirror, da Netflix, e é embasado, na verdade, em passagens bíblicas. A intenção endo é impedir que uma ordem satânica seja capaz de rastrear as pessoas.

 

 

Para Balão, uma proposta de lei não deve levar em conta teorias formuladas por uma “mente genial” em particular. Infelizmente, essa prerrogativa nem sempre é respeitada e gasta-se tempo e energia em votações de leis sem real utilidade pública. Apesar dos Estados e Municípios terem autonomia para propor suas próprias leis que atendam às particularidades de cada região, essas devem estar em concordância com os códigos de instância superior, como a Constituição Federal. E a justificativa para a proibição da implantação de chips em humanos desrespeita um pilar importante dela: o Estado laico.

 

 

Brasil afora, encontramos outros projetos de leis que ferem liberdades individuais e mostram-se absurdos, como tentativas de proibir judicialmente a ocorrência de enchentes. No Recife, projetos de leis importantes que buscam proibir mais de 24h corridas de plantão médico, por exemplo, seguem em trâmite na Câmara Municipal com passos de tartaruga. Enquanto isso, mais um carro do ovo passa divulgando seu produto para a clientela e, na mesma Câmara Municipal, um vereador gasta seu seus argumentos porque está cansado de ser acordado de manhã pelo anúncio de som que passa em sua rua.

 

 

Nem o céu é o limite

Por Pedro Graminha

Não, você não leu errado o parágrafo ao lado. É tanta lei que até a chuva forte foi proibida. Isso foi em Aparecida do Norte, em 2007, a 167 km de São Paulo.

 

 

Claro que tudo não passou de uma provocação do prefeito de Aparecida, José Luís Rodrigues, também conhecido como “Zé Louquinho”, após ter sido criticado pelas fortes enchentes que tomaram a cidade no ano anterior. Mesmo assim, o projeto de lei foi proposto e gerou muita polêmica.

 

 

No entanto, essa não foi a única vez que Zé Louquinho fez barulho com suas propostas. Entre suas façanhas, criou projetos proibindo o uso de minissaias e bermudas na época da quaresma – a cidade é um importante centro da fé cristã no país -, o que foi derrubado na Câmara. Além disso, conseguiu colocar dois cachorrões de guarda no cemitério da cidade para evitar furtos e vandalismos. Carismático, o prefeito guarda até hoje um séquito de apoiadores em Aparecida, com direto a grupo no Facebook intitulado “Amigos do Zé Louquinho”.

 

 

Mas a pequena cidade do interior de São Paulo não é o único canto do Brasil que foi palco de leis excêntricas. Em 1997, na cidade de Pouso Alegre, Minas Gerais, um projeto de lei estipulava multas de até R$100 para faixas e banners com erros de português e R$500 para outdoors que desrespeitaçem a norma culta. Já pensou? Outro caso famoso foi a ideia do prefeito Élcio Berti, de Bocaiúva do Sul, Paraná, também em 1997. Preocupado com as baixas taxas de natalidade do município – o que diminuiria o repasse de verbas do Governo Federal – o político simplesmente decidiu proibir a venda de camisinhas e anticoncepcionais. Revoltada, a população protestou e a lei caiu em 24h.

 

 

Mas não ache que são só nos municípios que essas leis peculiares surgem não. O Governo Federal também é um importante celeiro para a imaginação dos políticos. Inclusive, um dos casos mais famosos quando se pensa em absurdos legislativos é a Lei de Contravenções Penais que, em um de seus artigos, prevê penas de quinze dias a três meses de prisão para indivíduos “entregues à ociosidade”. Tal medida ficou conhecida como “lei da vadiagem”, sendo muito usada durante a ditadura, em especial para criminalizar negros e pobres caso não pudessem comprovar trabalho ou estivessem em lugares “indevidos” a sua classe social.

 

 

Por mais “inusitadas” que todas essas leis sejam, há limites para que uma lei seja aprovada. O que garante serem criadas ou não é o bom senso mesmo. A partir do momento que são propostas, devem ser analisadas para saber se não violam nenhum princípio da Constituição e se não interferem em nenhum outro projeto em tramitação. Depois são votadas na câmara e aprovadas pelo poder executivo. É um processo que pode levar poucos meses ou vários anos, ainda mais com a quantidade de lei que é votada todo dia.

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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