logotipo do Claro!

 

Há meditação bastante em não pensar em nada

 

Por Rodrigo Santana

 

HÁ MEDITAÇAO BASTANTE EM NÃO PENSAR EM NADA

São cinco e meia da tarde de uma quarta-feira cinzenta. Saio do metrô, tem muita gente voltando para casa. O ritmo da cidade nas buzinas e nos semáforos contrasta com a fachada sóbria do templo Busshinji, na rua São Joaquim, na zona central da cidade.

 

Entro, sento em uma cadeira na área externa do templo. Aos poucos, outras pessoas chegam. Às seis em ponto, desce um dos praticantes, que será nosso instrutor. Ele faz uma reverência, com as mãos em gassho, palma com palma, como quem faz uma prece. Na sua voz plácida, explica que a prática durará até as oito, quem tiver compromisso nesse período não deve participar.

 

Pelas escadas, somos 20 pessoas conduzidas à parte superior. Tiramos os sapatos, calçamos chinelos, entramos na área onde acontecem as meditações.

 

A luz baixa, as vozes sempre sussuradas, os passos curtos, os pés próximos, o cheiro leve de incenso. É como se no meio do frenesi paulistano houvesse uma ilha calma em que a paz te deixa entrar e depois fecha as portas.

 

Sentamos no zafu, uma almofada arredondada, as pernas estão dobradas, as mãos em posição de mudra cósmico, mão esquerda sobre a direita, os polegares se tocando. Entre as mãos, uma elipse simboliza o formato do universo. “Eu estou no cosmos, o cosmos está em mim”, explica a mesma voz plácida. A coluna ereta, os ombros alinhados, estamos em posição de Zazen.

 

O praticante nos orienta a respirar. “Inspire devagar. Sinta o ar preenchendo o peito. Expire, deixe sair tudo. Respire conscientemente. Pensamentos virão à sua cabeça. Não se apegue a nenhum, sejam eles bons ou ruins. Contemple-os. Do mesmo modo que os pensamentos entraram, eles vão sair. Contemple-os e deixe-os passar”.

 

É difícil conseguir esse estado de concentração. O tempo inteiro pensando nas escolhas que fiz, naquelas que podia ter feito, nas que farei para conquistar o que quero. Em vez de meditar o silêncio, medito sobre as coisas da minha vida. “Contemple os pensamentos e deixe-os passar”.

 

Se não consigo controlar, será que domino meus pensamentos ou são eles que me dominam?

 

Minhas costas doem, minhas pernas estão dormentes até a lombar. Preciso vencer essa dor. A mente é uma casa com muitos habitantes. Preciso conhecê-los todos, sejam eles a dor, a alegria, a angústia, a tristeza. Nenhum desses moradores pode se tornar o dono da casa, são viajantes pousados em uma estalagem. Que convivam sempre bem, e que façam boa viagem.

 

Todas as percepções da mente são transitórias, portanto, todas elas são ilusões. O budismo chama o mundo de samsara: um universo de ilusões que nos enreda em meio a tantas causas e consequências. Preciso perceber a ilusão como ilusão, a mente precisa parar de mentar para perceber o que permanece quando retiramos as camadas de poluição.

 

A respiração dos ansiosos é ofegante, dos apaixonados, dilatada. Minha respiração segue calma. As pontas dos dedos, que se tocavam com força, agora fazem uma pressão leve, como se segurassem um papel de seda sem o amassar. Meu olhar semicerrado, mirando a parede, já quase não vê, as pernas não doem.

 

Quanto tempo se passou depois disso não sei. Um tempo breve, com certeza. A gente só percebe que parou de pensar quando volta a pensar de novo.

 

Seria um erro dizer que o Zazen é um relaxamento. Relaxar é ficar disperso nos nossos pensamentos e sensações, entregue aos caminhos da mente. Sentar em Zazen é o contrário disso: é contemplar esses pensamentos, saber que eles passam, deixá-los passar. Então, com a mente quieta, viver o presente, sem causas nem consequências. Viver sem ser vivido.

 

Alguns templos e centros de meditação que você pode conhecer em São Paulo:

Centro de Estudos Budistas Bodisatva: rua Maestro Cardim, 1024.

Centro de Meditação Kadampa Mahabodhi: rua Artur de Azevedo, 1360. Pinheiros.

Comunidade Zen Budista, Templo Taikozan Tenzui Zenji: rua Desembargador Paulo Passaláqua, 134 – Pacaembu.

Templo Busshinji: R. São Joaquim, 285 – Liberdade.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

Expediente

Contato

Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Bloco A.

Cidade Universitária, São Paulo - SP CEP: 05508-900

Telefone: (11) 3091-4211

clarousp@gmail.com