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Revivendo histórias através das cores

 

Por Karina Merli e Vital Neto

 
Conceito: Caio Mattos/Desenho: Caio Mattos

Conceito: Caio Mattos/Desenho: Caio Mattos

 

A capacidade das obras audiovisuais de manipularem a realidade chega, muitas vezes, a nos emocionar. Da tonalidade sépia de “E Aí, Meu Irmão, Cadê Você?” (Joel e Ethan Coen, 2000), o preto e branco com detalhes coloridos de “Sin City” (Frank Miller, Quentin Tarantino, e Robert Rodriguez, 2005) aos tons pastéis de “O Grande Hotel Budapeste” (Wes Anderson, 2014), as produções em vídeo têm processos e intenções que muitos desconhecem. Elas exploram os nossos sentidos, principalmente a nossa visão, que se encanta com o amplo universo das cores.

 

E isso não é por acaso. Segundo Mirella Gualtieri, neurocientista especialista em psicologia sensorial e de percepção, o colorido é o que mantém “a característica original da vida” e como os seres humanos não enxergam em preto e branco, filmes monocromáticos criam um distanciamento, ao invés de aproximar o espectador.

 

Justamente para ficar mais perto da realidade, desde o século XIX, quando a fotografia foi inventada, até os dias de hoje, fotógrafos e cineastas continuam criando e aperfeiçoando técnicas para trazer cores aos seus trabalhos. Antes dos anos de 1930, período em que surge o cinema colorido, existia um método chamado colorização, que tinha por objetivo acrescentar cores a filmes originalmente filmados em preto e branco. É o caso, por exemplo, da adaptação da peça de Shakespeare, Rei Lear ( Gerolamo Lo Savio, 1910).

 

Hoje, após diversos avanços tecnológicos, as equipes de produção de obras audiovisuais contam com centenas de profissionais, dentre eles, o colorista. Esse especialista trabalha na pós-produção, sendo responsável por destacar, corrigir e melhorar os tons da imagem através da luz, com base na paleta de cores escolhida pelo diretor, bem como os diretores de arte e de fotografia.

 

A seleção de tons vai de acordo com a ideia que se quer transmitir na obra e pode depender de outros elementos, como a iluminação, por exemplo. O intuito também pode variar. Em “Sin City”, o telespectador consegue compreender o tempo da narrativa através das cores utilizadas. Enquanto na série “Breaking Bad” (2008-2013), os produtores atribuíram paletas específicas a certos personagens para relacioná-los com elementos que quiseram destacar, como o verde nos momentos em que Walter White, interpretado por Bryan Cranston, lutava por dinheiro.

 

Cau Nunes, colorista e sócio de um estúdio de criação, explica que a profissão não se limita ao cinema, mas também está presente na publicidade e em videoclipes. Uma das estratégias utilizadas pelos profissionais para causar sensações ou transmitir ideias ao público é o direcionamento do olhar do espectador para aquilo que se quer destacar, algo atingido através de vinhetas, desfocagem seletiva, e outros elementos de realce visual.

 

Atualmente, também é possível restaurar e colorir digitalmente obras filmadas em preto e branco, como fizeram as séries “America in color” (2017) e “Britain in color” (2019), que transportam os espectadores aos principais momentos dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, no início do século XX. Ross Baker, colorista senior, que atuou nas duas obras, comenta que há diversos desafios ao se trabalhar em projetos como esses, entre eles, o de lidar com películas antigas e finas.

 

Além disso, ele afirma que é fundamental se dedicar ao trabalho de pesquisa para obter o material de referência, como jornais e documentos que mostrem quais eram as cores dos objetos, roupas e paisagens na época dos filmes. A atenção deve ser ainda maior com possíveis mudanças de cor, como uma logomarca que era vermelha e ficou laranja, por exemplo.

 

A neurocientista Mirella Gualtieri afirma que este processo tem o poder de sensibilizar. Cientificamente, isso pode ser atribuído ao fato de nossos cérebros terem as áreas de processamento de cores e de atenção visual próximas uma da outra, algo vinculado à nossa escala evolutiva, explica a especialista. Dessa forma, ao vermos algo colorido, a nossa atenção aumenta. Para Baker, colorizar imagens históricas pode ser uma forma de revivê-las, mostrando às pessoas como seria estar ali.

 

Colaboraram:

Bruno de Mello Baltarejo, coordenador de audiovisual do AvMakers
Cau Nunes, artista visual, sócio e diretor do Estúdio Insólita
Luca Leocádio Soares, colorista da O2 Pós.
Mirella Gualtieri, neurocientista especialista em psicologia sensorial e de percepção, e professora do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP).
Ross Baker, colorista senior da Halo Post production, quatro vezes indicado ao Royal Television Awards

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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