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Não se vê, mas existe

 

Por Isabella Oliveira e Rosiane Lopes

 
Arte: Lívia Magalhães

Quem dera a capa da invisibilidade não fosse só ficção. Todos se esconderiam e existir talvez fosse mais fácil. Só que na vida real as coisas não se resolvem como nos filmes. Aqui, a magia não está em artefatos encantados, mas sim no que enxergamos e no que não vemos. 

Crenças, histórias, sensações e sentimentos passam tão despercebidos pelo olhar humano que parecem não estar lá. Nesse contexto, o claro! Invisível questiona a ideia do ‘se eu não vejo, não existe’. Afinal, muito do que é caracterizado como imperceptível apenas escapou de nossa visão.

Nas próximas páginas descobriremos, por exemplo, que acreditar na força do universo talvez seja o elemento que faltava para realizar um grande desejo, mas cuidado, isso é um segredo. Além de mergulhar no movimentado mercado de trabalho dos fantasmas e perceber que a companhia perfeita pode ser fruto da imaginação.

Nesta edição, convidamos os leitores a romperem a barreira entre o visível e o invisível ao se concentrarem em histórias que, intencionalmente ou não, deixamos de enxergar. Abra a mente. Há muito o que encontrar por baixo da capa.

Expediente – Reitor: Carlos Gilberto Carlotti Junior. Diretora da ECA-USP: Brasilina Passarelli. Chefe do departamento: Luciano Guimarães. Professora responsável: Eun Yung Park. Capa: Carolina Borin e Lívia Magalhães. Editoras de conteúdo: Isabella Oliveira e Rosiane Lopes. Editora de Arte: Carolina Borin. Editora Online: Júlia Castanha. Ilustradoras: Caroline Kellen e Lívia Magalhães. Diagramadores: Amanda Marangoni, Antônio Misquey, Beatriz Sardinha, Bianca Camatta, Gabriel Gama, Lara Paiva, Maria Carolina Milaré, Mariana Carneiro e Rodrigo Tammaro. Repórteres: Diogo Bachega, Duda Ventura, Gustavo Assef, João Francisco Aguiar, João Pedro Barreto, Julia Custódio, Junior Vieira, Karolina Monte, Larissa Leal, Laura Guedes, Lorraine Moreira, Matheus Nistal, Natalia Nora, Rebeca Fonseca, Renato Brocchi, Thiago Campolina e Victoria Borges. Revisores de texto: Emilly Gondim e Valentina Moreira, Endereço: Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, prédio 2 – Cidade Universitária, São Paulo, SP, 05508 920. Telefone: (11) 3091- 4112. O claro! é produzido pelos alunos do quinto semestre de Jornalismo como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso-Suplemento.

Não é só comida

 

Por Ivan Conterno e Sebastião Moura

 

Arte: Jorge Fofano


“A refeição é sagrada”, diz a mãe ao filho todas as vezes que ele senta à mesa. A vã tentativa de fazer o garoto tirar os fones de ouvido durante o almoço faz pouco sentido para ele – “nunca desperdicei um único grão de arroz colocado no meu prato, então o que poderia haver de herege ou desrespeitoso no relacionamento que eu estabelecia com a comida?”

Mas essa mãe não está apelando para o clichê, tragicamente ainda verdadeiro em um país que é basicamente uma fazenda gigante, do “tem gente passando fome, não desperdiça”. O adjetivo santo acena a uma ideia simples, mas poderosa: comida não é só comida. Se alimentar não é só botar para dentro matéria orgânica que vai servir de combustível para mais matéria orgânica.

A gente não quer só comida e bebida. Além de combustível orgânico, o alimento também é sabor, a menos que o paladar esteja com defeito. Às vezes nem nutre tanto, mas mata a fome e economiza algum tempo. Às vezes é uma desculpa para passar um tempo junto da família, dos amigos, da pessoa que se gosta ou com a qual se quer fechar um negócio.

Quem prepara a sua refeição? É comida de verdade, comida-comida-mesmo, ou é lanche? Tem comida que vem da Europa, da Ásia e da América… mas e da África, você conhece? Os temperos em pó da sua cozinha, de onde vêm? Você já provou algo novo hoje? Que tal experimentar o que preparamos nesta edição?

As chefs e suas chefes

 

Por Juliana Alves

 

Arte: Adrielly Marcelino

A cada garfada, a patroa e seus filhos saboreavam filet mignon, enquanto ela ouvia, aguada. Ela engolia em seco as ofensas e esperava todos saírem para preencher duas tigelas de banha: para o cachorro e para ela. Cansada de se sentir invisível, arranca um pedaço da carne que não tinha o direito de colocar na boca, mesmo tendo feito com as próprias mãos. Os minutos de revolta de Luiza Batista*, hoje coordenadora da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), tornaram-se semanas de desemprego.

A diferença vai além do filet mignon e da banha. Enquanto os chefes vieram de “berço de ouro” e têm ensino superior, muitas cozinheiras começaram a trabalhar cedo. São aproximadamente 93 mil crianças e jovens em frente ao fogão, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) de 2019.

Já adultas, frequentemente ignoram o ronco do estômago. O “salário insuficiente”, somado com o aumento dos preços dos alimentos, fez com que Luiza diminuísse os itens do carrinho de mercado, deixando de levar as marcas favoritas. O piso salarial da categoria na cidade de São Paulo, de R$1.433,73 reais, não banca nem um churrasco de fim de semana da patroa. “Não se vê mais o iogurte ou o queijo na geladeira por causa da mudança do poder aquisitivo. Quero voltar a comer como antes, alimento não é supérfluo.” 

Para não fechar o mês no aperto, muitas vezes as trabalhadoras não assinam a carteira de trabalho e recebem um salário mais alto em troca. “Quando a funcionária assina a carteira, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é descontado, por isso muitas não querem assinar. Mas percebem o erro quando ficam doentes”, comenta a coordenadora do sindicato.

Depois de décadas de luta pelos direitos das trabalhadoras domésticas, a Lei Complementar nº 150/2015 tornou obrigatório o intervalo de uma a duas horas para o almoço. Caso a funcionária resida no local de serviço, o período de intervalo pode ser dividido em dois momentos da jornada de trabalho, de no mínimo uma hora até quatro horas. Mas o avanço dos direitos não garante que as empregadas sejam tratadas como seres humanos.

Um episódio marcante para Márcia foi a vez que sua patroa pediu o preparo de um jantar para visitas. Após a despedida, os vizinhos ouviram os gritos à funcionária, pois as roupas foram estendidas no varal da lavanderia. Márcia não entendeu por que deveria retirar as roupas já que ninguém entraria lá. Porém ouviu “não vem dar ordem na minha casa, as pessoas vão achar que estão em uma favela”.

Vai além de saborear um filet mignon. Márcia, assim como muitas, não vê a hora de parar de cozinhar para realizar o sonho de ter a própria empresa. “Falta coragem e estudos. Quem sabe um dia.”

*Com exceção da Luiza Batista, todos os nomes foram trocados para preservar o sigilo das fontes.  

editorial | das grandezas do ínfimo

 

Por Sarah Lidice e Theo Sales

 

Arte: Pedro Ferreira e Rebeca Alencar


No meio do caminho tinha uma pedra. Uma pedrinha miudinha que marcou a vida do poeta. Mas podia ser uma borboleta com suas cores vívidas, cujo leve bater de asas pode distrair uma pessoa andando na rua ou até gerar um furacão nos Estados Unidos, como diz a teoria do caos. Ou ainda um grilo que, sozinho, é capaz de desmontar o silêncio da noite. Pequenezas capazes de grandezas. 

Como um certo vírus, que com sua potência replicadora armazenada nas suas duas dezenas de nanômetros, parou um mundo até então imparável. 

Questionando aquilo que é considerado grande ou pequeno, pois tudo depende do referencial, convidamos os leitores a olhar atentamente aos pequenos detalhes, àquelas coisas aparentemente insignificantes, mas que fazem toda a diferença.

o fim da picada

 

Por Filipe Narciso e Mariana Marques

 

Arte: Pedro Ferreira e Rebeca Alencar


Antenas, ferrão e um corpo menor do que um dedo, listrado nas cores preto e amarelo. Poucos
animais são tão fáceis de reconhecer quanto as abelhas. E você não pensou em uma abelha qualquer, mas sim na Apis mellifera, espécie já protagonista do imaginário coletivo, também conhecida como abelha europeia. 

O Brasil, no entanto, possui uma enorme diversidade de abelhas sem ferrão. Com visuais distintos, essas espécies se destacam pela polinização por vibração. Segurando suas antenas, elas mexem seus pequenos corpos de artrópode até que o pólen se desprenda e chegue às plantas, permitindo sua reprodução.     

O processo, no qual as elas são especialistas há alguns milênios, é um dos mais conhecidos serviços de ecossistemas. O termo científico pode parecer complexo em primeiro momento, mas é simples de entender: é quando uma espécie realiza em seu cotidiano algo que beneficia direta ou indiretamente o ecossistema em que vive. E o resultado é positivo: plantas polinizadas por abelhas experts são mais produtivas e possuem frutos de melhor qualidade. 

Mas esse não é o único segredo que se esconde por trás do bater de asas de uma abelha. Esses insetos voadores vivem em sociedades organizadas de maneira complexa e a divisão social do trabalho é uma das características que mais chama atenção. 

Na maioria das colmeias, uma operária ocupa várias funções de acordo com a sua idade. Ser babá das larvinhas, resfriar a colmeia com o bater das asas ou o uso de sua saliva, recrutar outras abelhas – será que elas também são submetidas a um alistamento militar? –, proteger-se de predadores, descobrir um local para morar e, claro, polinizar as plantas são alguns de seus possíveis trabalhos. Quando você observa uma operária se ocupando de recolher o néctar das flores, saiba que está, muito provavelmente, olhando para uma abelha bastante  madura, que já teve vários empregos em sua vida.   

Mas essas operárias correm o sério risco de enfrentar desemprego estrutural, pois seus habitats e até mesmo suas populações estão desaparecendo. Além do mais, as condições de trabalho pioraram significativamente devido ao avanço do agronegócio, e com ele o uso de agrotóxicos e pesticidas, nas últimas décadas. Adicional por insalubridade? Não por aqui. 

Com a diminuição da população de abelhas, todos os ecossistemas, que no Brasil já são seriamente ameaçados pelo aumento exponencial das plantações de commodities, são afetados. A perda da vegetação natural, o desequilíbrio na cadeia alimentar e o aumento da aridez do solo são algumas das consequências da ausência dos insetos polinizadores. 

Até mesmo a menor das abelhas pode fazer toda a diferença para uma espécie de planta, que por sua vez pode ser essencial para muitas espécies de animais. Essa reação em cadeia é capaz de impactar biomas inteiros, criando problemas ambientais de longa escala. Mesmo diante de tantas precarizações, essas diminutas trabalhadoras seguem existindo, e  a natureza, resistindo.

colaboraram:

Mariana Victorino Nicolosi Arena, doutoranda em ecologia pela Universidade de São Paulo com estudos focados nas relações entre áreas urbanas e abelhas sem ferrão;

Vera Lúcia Imperatriz Fonseca, professora sênior do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo e bióloga referência no estudo de abelhas e outros insetos polinizadores.

o poder sob a pele

 

Por Ana Paula Alves

 

Arte: Pedro Ferreira e Rebeca Alencar


Com capacidades e propriedades únicas, certo órgão começou a ganhar a devida atenção. Muitos séculos se passaram sem que ele fosse de fato visto. Era considerado sem muita utilidade, algo acessório, mas nos últimos 50 anos, ele passou a ser mais estudado, sua anatomia e importância desvendadas.

Ele age na liberação dos Quatro Cavaleiros do bem estar: endorfina, serotonina, dopamina e ocitocina. Os “hormônios da felicidade”. O título não é um exagero, entre outras funções, eles são essenciais para regular e manter o equilíbrio do humor.

A endorfina combate a ação do estresse no corpo, além de poder ajudar em suas linhas defensivas ao fortalecer o sistema imunológico. A serotonina é muito hábil em manter a moral nas batalhas diárias, regulando o sono, apetite, funções cognitivas e ritmo cardíaco. Sua presença pode definir os rumos da luta e sua ausência pode estar relacionada a depressão e ansiedade. A dopamina é essencial para se manter de pé, ajuda a manter a motivação, movimento, criatividade e foco. Por fim, a ocitocina age na memória e formação de laços sociais para manter a união.

E o poder desse órgão não está apenas nessa liberação, mas na sua capacidade de ser estimulado para tal. São cerca de 8 mil terminações nervosas concentradas num pequeno ponto, a glande. O mínimo toque, calor ou vibração é transformado em impulso neural e começa a reação em cadeia. Os vasos dilatam, mais sangue entra, ele incha, aumenta de tamanho e enrijece, ficando ainda mais sensível. Eis a ereção.

Mas ele vai muito além da glande. Seu corpo erétil forma um complexo escondido sob a pele, que se estende por 7 ou 9 centímetros. Assim, o toque na pele também pode causar arrepios prazerosos e fazer um calor correr pelo corpo. Desde carícias delicadas com as pontas dos dedos, até beijos profundos e apaixonados ou movimentos rítmicos de entrar e sair.

E como tal órgão passou despercebido? Simples: ele pertence unicamente a pessoas com vagina. A única função do clitóris era gerar prazer para quem era identificada como mulher. O que não era exatamente uma grande preocupação para a sociedade médica. Ou para a sociedade em geral. Com sua pequena glande aparente, suas hastes e bulbos sob os lábios vaginais, o clitóris pode ser excitado tanto pela glande quanto pela penetração, já que seus bulbos são extremamente próximos ao canal vaginal.

Quando era notado, sua importância era dizimada e o prazer feminino associado apenas a penetração e seu agente. O clássico e icônico Pênis seria a primeira coisa a ser pensada quando as palavras “prazer”, “ereção” e “sexo” fossem ouvidas. 

Assim, o clitóris foi considerado menor.

Escondido dos olhos da sociedade sob a pele, ele faz seu papel como único órgão exclusivamente dedicado ao prazer. Algo que nem o tão viril órgão masculino é.

colaboraram:

Ana Lúcia Cavalcanti, doutora em ginecologia e obstetrícia e terapeuta sexual

Katiuscia Leão, mestre em sexologia clínica e consultora sexual

Fernanda Romeiro, psicóloga e sexóloga

Giulia Cerutti Dalvi, ginecologista e obstetra

adeus ao meu lugar, tão pequeninim

 

Por Mara Matos e Mateus Dias

 

Arte: Pedro Ferreira e Rebeca Alencar


Você aí, vem de onde? Lá de onde eu vim, tudo ainda está no seu lugar?  Poxa, tem muito lugar de onde vir. Aqui no Brasil, existem 5.570 municípios. Mas, cada um é do seu jeito. Cerca de 87% deles têm menos de 50 mil habitantes. E aí é que tá. 

Vistos muitas vezes como pequenos municípios, existem algumas centenas de cidades menorzinhas ainda, que não chegam à marca de 5.000 pessoas residentes. Esses municípios, de tão pequenininhos, podem até desaparecer.

Em setembro de 2021, o Supremo Tribunal Federal  declarou inconstitucionalidade das leis que fizeram nascer 30 municípios no estado do Rio Grande do Sul. Todos eles não beiram nem 5 mil habitantes. 

Um desses municípios é Pinto Bandeira, que antes era distrito, virou dono de si em 2013, e pode ficar de fora da Emenda Constitucional 57/2008, que reconhece municípios criados até o final de 2006 pela lei de cada estado. A partir daí, para um novo município existir vai ter que ter uma lei federal complementar.

Com cerca de 3 mil habitantes, a cidade já tinha sido emancipada pela primeira vez em 2001, e em 2003 voltou a ser distrito – pobrezinha. Desde que se tornou dono do próprio nariz pela segunda vez, o município tem progredido, segundo o vereador Cesar Augusto Tumelero,  que também comentou a sensação de abandono durante o período em que fizeram parte de outro município. 

Bruno de Toni, morador da cidade, conta que a decisão despertou em si o sentimento de tristeza, visto toda a história e a luta que a região passou, antes de sua emancipação e enquanto buscavam se tornar um município novamente.

Nova Roma do Sul, limítrofe à Pinto Bandeira, é outra cidade que pode desaparecer. Diferente de sua vizinha, o que põe em risco sua sobrevivência é a PEC 188/2019. O projeto propôs a extinção de municípios com menos de 5 mil habitantes a fim de reduzir os gastos com estruturas administrativas. Segundo a Confederação Nacional de Municípios, 1.212 municípios estão ameaçados pela proposta.

Caso aprovada, esses pequenos municípios, a grande maioria com menos de 10% de renda proveniente de fontes próprias, têm até 2023 para provar que chegarão a esse nível de renda ou serão incorporados a um município vizinho e deixarão de existir. 

O prefeito de Nova Roma, Douglas Pasuch, concorda com a redução de gastos, mas acredita que o foco deveria ser melhorar o direcionamento deles. Teme-se que a PEC aprofunde a desigualdade entre municípios com mais atividade econômica e os de menor. 

Entre os danos administrativos que proporciona, está a mudança da  legislação base de planejamento orçamentário e os recursos vinculados para saúde e educação, o que afetaria  a forma de operação dos municípios e as políticas ofertadas, afirma Luciana Royer, doutora em urbanismo.

Outros, como Roger Leal, professor de direito constitucional, veem com bons olhos. De sua perspectiva, os pequenos municípios passariam a compor cidades com melhores condições financeiras e que podem se bancar. Ainda seriam reintegrados, supõe, àqueles com que guardam laços importantes pela história e proximidade geográfica.

A PEC ainda não foi votada e segue em tramitação no Senado com a última proposta de modificação sendo realizada em setembro de 2021. 

Nos municípios, o que resta é só a incerteza.

dez passos quadrados

 

Por Ana Carolina Guerra e Cadu Everton

 

Arte: Pedro Ferreira e Rebeca Alencar


Levantar da cama, dar dois passos para chegar na cozinha. Sair da cozinha com apenas um passo e já tomar banho, que rápido, não? Ler um jornal enquanto reina em seu trono não é necessário, pois você pode assistir diretamente do banheiro as notícias que passam na televisão da sua sala. Como isso é possível? A parede entre esses dois cômodos é inteiramente de vidro, e o apartamento possui apenas 10mᒾ. 

Esse é o caso do menor apartamento da América Latina, localizado no condomínio Palmeiras-Nova Higienópolis, inaugurado em 2019, no bairro de Santa Cecília, no Centro de São Paulo. As residências do prédio variam de 10mᒾ a 77mᒾ.

Esses pequenos imóveis, de até no máximo 35 mᒾ, são chamados de microapartamentos. Segundo o Sindicato das Imobiliárias, em 2021, esses empreendimentos foram responsáveis por 29% dos lançamentos em São Paulo. Não há dúvidas que essas residências vieram para ficar.

Lucia* mora em um microapartamento há um ano. Ao abrir a porta do seu imóvel pela primeira vez, se assustou com a falta de espaço. O tamanho não foi o que pesou em sua escolha, como ela diz “é o que o dinheiro dá para pagar”.

Para o corretor imobiliário Carlos Magno Diniz, conseguir moradia para seus clientes na região central da cidade, com fácil acesso a transporte e serviços, como farmácias, universidades e escritórios, não é uma tarefa simples e nem barata. Os jovens são os que mais buscam essas praticidades. 

De olho nesse mercado, construtoras têm apresentado microapartamentos como solução para um público que está disposto a morar a poucos passos da faculdade e do trabalho, mesmo que isso lhe custe viver em um ambiente em que não haja espaço para se dar muitos passos.

Mas não se engane quem pensa que o valor das habitações diminui tanto quanto a metragem. De acordo com a subprefeitura da Sé, onde está situado o bairro Santa Cecília, o metro quadrado médio da região central é de 4,3 mil reais, mas devido à especulação imobiliária é possível encontrar na mesma localidade microapartamentos com o metro quadrado custando até R$9,5 mil. No fim das contas, você acaba pagando mais por menos.

Para quem busca morar perto de tudo, esses pequenos imóveis até parecem uma opção interessante à primeira vista. Mas se você pensar em dividir com mais alguém, não terá muito espaço para isso, nem privacidade. Portanto, caso isso aconteça, não se esqueça de colocar uma cortina na divisória do banheiro… reinar no trono enquanto alguém te olha do quarto, que é sala e que é cozinha, pode não ser uma experiência lá muito agradável.

colaboraram:

*O nome da entrevistada foi alterado a pedido da fonte

Paula Freire Santoro, urbanista especializada em habitação

na justiça, tamanho não é documento

 

Por Iasmin Cardoso

 

Arte: Pedro Ferreira e Rebeca Alencar



Adhuc sub judice lis est, compurgatio, erga omnes, ex adverso, onus probandi, pacta sunt servanda, quid pro quo… Precisa mesmo saber de juridiquês para poder entrar com qualquer ação na justiça? Preciso de todas as leis ou vou precisar contratar um advogado para interpretar para mim?

Não necessariamente. Para as “pequenas causas”, existe o Juizado Especial Cível, ou JEC. São causas com valores menores a 40 salários mínimos, sendo que para menos de 20 salários a pessoa nem precisa de advogado. Para não ficar abstrato: em ações com valores de até 24 mil reais dá para entrar sozinho com o processo.

São brigas de vizinho, compras online que não chegaram, problemas com companhias aéreas dentre outras situações simples. Mas existem restrições previstas na lei. Por exemplo, cobrança de pensão alimentícia nem pensar no JEC: é caso de vara de família!); Porém questões menos complexas, mas importantes para a vida das pessoas, vão para o JEC.

Um exemplo são os casos de Suzy Everton, que entrou no juizado especial três vezes. A primeira foi uma cobrança indevida de seguro de banco, outra foi uma questão no fechamento de conta em outro banco, e a terceira foi devido a um defeito em um produto que a empresa não respondeu. Em especial na segunda causa, Suzy, uma pessoa que paga as contas em dia e não deve dinheiro, ficou com “nome sujo” por conta da questão.

Vale ressaltar: só pessoas físicas – pessoas mesmo, não empresas, podem procurar o JEC, basta reunir os documentos pessoais, comprovante de residência e provas. Foi o que Suzy fez. Ela foi com um advogado às audiências, mas de resto pode resolver muita coisa sozinha. Todos os casos dela foram solucionados no JEC. Suzy ficou satisfeita com o atendimento e diz que foi tudo muito rápido (a média de tempo fica em torno de um mês).

É previsto na lei que criou os juizados especiais em 1995 que eles devem prezar por agilidade, simplicidade, informalidade e economia processual. A primeira audiência é de conciliação, com um profissional treinado para isso. Busca-se acordo entre as partes em ambiente neutro com alguém mantendo a ordem. Apenas em caso de não acordo ou se a pessoa recorrer que o processo vai para o juiz.

Claro, nem tudo são flores. Há quem procure os JEC sem nem ter tentado falar com o outro lado, além de existir uma sobrecarga normal dos próprios JECs. Por exemplo, em Porto Velho (RO), entram 600 processos em um único juizado especial todo mês, enquanto que no centro de São Paulo (SP) ficam em torno de mil. Isso sem falar que o judiciário tem de lidar com alguns advogados usando robôs para entrar com mais de 10 mil ações de má-fé em um único dia.

Mesmo com esses problemas, o juizado especial é talvez a principal via de acesso à justiça. É uma forma de dar assistência nos trâmites da lei à pessoa que, como a Suzy, vão atrás de seus direitos.

colaboraram:

Bárbara Brisa Ladeira da Silva, assistente jurídica do Juizado Especial Cível da PUC-SP

Cláudia Gomes, advogada que atua em pequenas causas em Recife

Guilherme Ribeiro Baldan, juiz de Direito titular do 4º Juizado Especial Cível da Comarca de Porto Velho e ex-presidente da FONAJE (Fórum Nacional de Juizados Especiais)

revelações da imensidão

 

Por Matheus Nascimento

 

Arte: Pedro Ferreira e Rebeca Alencar


Fé que foi de lá! Que foi do sopro no corpo de barro ungido pelas mãos benevolentes do Deus cristão. Que foi da manifestação dos orixás que rege cada candomblecista e umbandista em suas diferenças. Que foi do poder de vibrações divinas ou do sopro de Alá na particular estrutura de um feto humano. 


Nessa mesma maré: a ciência, afirmando que foi de um ser microscópico. Até o surgimento de uma espinha dorsal, do mais remoto vertebrado da Terra.


Afinal, de onde viemos? No mar das religiões estamos navegando num barco, cheio de redes, que traz consigo desde o resoluto ateu ao afirmado crente.


A fé são as ondas, que o levam para frente. E o comandante? Cada um diz o seu. No final, o silêncio domina, pois somos como pequenos peixes em um oceano de religiões.


Para muitos, o comandante é uma força que guia. Mas como a fé nos auxilia? Para alguns, ela dá uma resposta; para outros, segurança. As religiões possuem nas suas teologias o poder da atração de fiéis, e isso ocorre através da mistura das nossas referências religiosas, familiares e culturais. Elas nos capturam: nós, criaturas soltas pelo mar com desejo de pertencer. 


Mas nela ainda existem conexões difíceis de se explicar. Quanto vale apostar na fé, se no íntimo ninguém tem acesso a uma conclusão verdadeira sobre a vida e na maioria das vezes não sabe por que adere aos dogmas da sua crença?


O pensamento espírita reflete que a inteligência humana ainda é pouco capaz de compreender o que há por trás da grandiosidade do Universo. Essa é a manifestação da dificuldade humana de compreender o fator extraordinário presente nas religiões.


São inúmeras as culturas que ao longo da história produziram suas próprias respostas para o descontentamento do ser humano com o divino. A cada evolução da humanidade surgem respostas, mas a dúvida persiste. 


O que causa essa sensação de medo e ao mesmo tempo de confiança em um Ser Superior é explorado através das revelações. E elas podem vir como uma profecia, uma visão, uma ocasião que justifique essa força invisível. Mesmo assim, seguimos navegando neste barco que aproxima espiritualmente o Criador à criatura. 


E para que nele a paz seja plena, ninguém pode afundar. Porque existe um ponto comum em todas as crenças: o de que a plenitude espiritual só é alcançada quando se reconhece a insignificância da humanidade na Terra. 


Não temos certeza, por isso seguiremos dizendo: “Fé que foi lá!”


colaboraram:

Alexandre Lopes, diácono

Aluísio Júnior, membro da Igreja Bíblica da Paz e professor de teologia cristã

João Simoncello Filho, diretor da Associação Presbíteros de auxílio a padres

Marta Antunes Moura, vice presidente da Federação Espírita Brasileira

Ìyá Inaê D’Yemanjá, umbandista e cartomante

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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