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Ditadura LGBT e feminazi

 

Por Breno França e Thiago Neves

 

golpistascomsombra

Outro dia, depois de algum tempo desviando de vídeos do Olavo de Carvalho e compartilhamentos revoltosos de posts do Sensacionalista, desisti da internet e fui assistir à TV. Entre um canal e outro, um sujeito me chamou a atenção. Lenço no bolso de fora do paletó e tanto gel no cabelo que reluzia as luzes no estúdio. O programa estava só começando.
“Boa noite e bem-vindo a mais um debate sobre temas polêmicos da política nacional. Hoje, recebemos lideranças de ideologias antagônicas para elucidar você, brasileiro, eleitor, cidadão de bem que nos assiste.”
Já ia desligando a TV, mas posterguei um pouco mais o trabalho de segunda-feira quando o apresentador chamou o primeiro convidado. “Gostaria de convidar o deputado Dejair Tiro no Gato, do Partido Moralista das Pessoas de Bem.” Um ex-militar, com cabelo tingido de caramelo, que ficava coçando a própria mão e gritava ao invés de falar.
“Boa noite, Guilherme, e boa noite para os milhões de brasileiros a que nos assistem e que não aceitam a deturpação dos nossos valores por parte dessas minorias que anseiam a uma verdadeira ditadura. Vamos nos levantar e defender a democracia, a família, Deus e a liberdade.” Me senti até constrangido de estar assistindo àquilo sem camisa.
Seus adversários eram pessoas ligadas ao movimento feminista e à comunidade LGBT. Confusos, não sabiam muito bem por que estavam debatendo com aquele sujeito. O apresentador não parecia ser um anfitrião preocupado em deixá-los a vontade e já foi introduzindo o primeiro tema: segurança.
“Os líderes das minorias costumam defender bandidos”, começou o deputado. “Ao mesmo tempo condenam as ações policias e pessoas como o deputado estadual eleito por São Paulo, nosso colega Coronel Telhada, membro da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Enquanto isso, o trabalhador que paga seus impostos tem medo de sair de casa e ser assaltado por vagabundos menores de idade. Vocês têm algo a dizer a esse respeito? Vão começar a adotar esses bandidos?”
A plateia aplaudiu e surgiu na tela um homem de feições familiares e tom professoral. “Primeiro, eu não defendo ditadura nenhuma…” Nesse momento, iniciou-se um panelaço nas varandas vizinhas com injúrias ao representante, reivindicando liberdade de expressão. Quando pararam, voltei a ouvir o representante LGBT. “De cada cinco assassinatos em São Paulo, um é de autoria da polícia. O próprio ex-coronel citado pelo senhor coleciona 36 mortes em 32 anos de atuação. Os jovens negros são assassinados longe dos holofotes. Outros vão para presídios superlotados, onde passam a integrar a terceira maior população carcerária do mundo. E mais: um homossexual é morto por dia e a homofobia nem é considerada crime. As maiores vítimas da falta de segurança são justamente as minorias e não homens brancos como o senhor. Portanto, se tem alguém interessado em mudar o rumo da segurança, somos nós.”
Rapidamente, o apresentador mudou de assunto e introduziu o segundo tema: educação. A fala continuou com a representante feminista.
“Gostaríamos de elucidar o quanto o sistema educacional é sexista e ineficiente. Nós sabemos que, hoje, as escolas são um dos locais mais ultrapassados da sociedade. A educação dita o que é coisa de menino e o que é coisa de menina. Romper com esse sistema é admitir perder privilégios que o senhor não está disposto, então perguntamos se o senhor é a favor do sistema que nós temos hoje.”
“É claro que não. A educação brasileira tem muito a melhorar. Considero que tivemos uma grande vitória com o veto ao kit gay, que ensinava o seu filho a ser homossexual.”
O representante LGBT interrompeu protestando. “Não dá pra ensinar alguém a ser gay. É um absurdo alguém dizer isso na televisão.” Uma pequena confusão se formou até o âncora retomar o assunto e dar a palavra ao deputado novamente.
“Como já disse antes até no meu programa de defesa do consumidor, os pais que deram uma boa educação aos seus filhos não podem correr o risco de vê-los contaminados por esse tipo de material. A escola tornou-se um templo de doutrinação marxista. Os valores tradicionais foram substituídos pelo comunismo. Esses professores, sempre em greve, não podem continuar influenciando nossos jovens.”
Tamanha foi a salva de palmas que só consegui deduzir que o tema seguinte era saúde pública depois que o âncora mostrou a bolinha que tinha deixado cair no chão pouco antes.
“Hoje em dia, sabemos que ser gay está na moda. As novelas estimulam esse comportamento e seus líderes incentivam essas demonstrações. Fazem uma caça às bruxas em relação àqueles que se posicionam contra essa apologia. Agora, a mais nova tentativa de destruir a família é legalizar o aborto. Uma vez, o saudoso Eduardo Campos declarou que não conhecia ninguém que fosse a favor do aborto e foi condenado por isso. Vocês são a favor dessa permissividade que vai destruir a família brasileira?”
“Nós achamos lamentável que o senhor trate uma questão de saúde pública como uma tentativa de destruir famílias. Merecemos o direito de sermos donas do próprio corpo e, se necessário, interromper uma gravidez indesejada. As mulheres ricas já têm acesso a clínicas que realizam esse procedimento com segurança. Negar isso às pobres é hipocrisia e mais uma forma de exclusão social. Portanto, nós somos, sim, a favor do direito de escolha.”
“Amor, acorda. O MasterChef já vai começar.”
Foi tudo um sonho. Virei pro lado e reconheci o rosto do representante LGBT. Apesar do alívio, percebi que éramos uma ameaça ao deputado. O nosso golpe ainda vai demorar pra acontecer.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

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