“Acredito que eu teria um sentimento maior quanto ao tempo distante que não tive com a família”. É assim que o astronauta brasileiro Marcos Pontes se imagina na pele de Cooper, protagonista do filme Interestelar (2014). No longa, o astronauta pousa em um mundo próximo a Gargantua, um buraco negro em que, para cada hora gasta, sete anos se passam na Terra. O princípio pode parecer ficção, mas é ciência: conhecido como Teoria da Relatividade Geral, o conceito foi criado por Albert Einstein e considerado a maior descoberta do século 20.
“O cientista lançou uma série de estudos entre 1905 e 1915 e desmontou a ideia de que o tempo se comporta de maneira uniforme em todos os pontos do universo”, conta o diretor do Instituto de Física da USP, Marcos Martins. Segundo ele, Einstein introduziu que o espaço e o tempo formam, na verdade, a mesma coisa: o espaço-tempo. Quanto mais intenso é o campo gravitacional — como é o caso dos buracos negros —, maior a deformação do espaço-tempo, capaz de fazer com que os relógios nestas regiões andem mais devagar do que aqueles com menor influência da gravidade.
Para chegar a esse resultado, Einstein observou o fato da velocidade (V) depender do espaço (S) dividido por tempo (t). Para que a velocidade da luz fosse constante em qualquer referencial, era preciso modificar os outros dois fatores. “O tempo é uma coisa muito enraizada na nossa cultura. Sentimos o tempo passando da mesma forma, sabemos que nossos ancestrais também… Mas Einstein sentiu que o tempo devia participar dessa mudança e não se deixou prender por pré-conceitos”, comenta Martins.
Quem quiser viver a experiência de Interestelar, entretanto, terá que enfrentar no mínimo três mil anos-luz até o buraco negro mais próximo da Terra. O V616 Monocerotis fica na Constelação de Unicórnio e não produz uma dilatação do tempo tão intensa quanto a do filme: enquanto Gargantua possui 100 milhões de vezes a massa do Sol, o V616 Mon tem cerca de nove, o que torna seu campo gravitacional muito menos intenso. Mas como diz Cooper, “nós sempre nos definimos pela habilidade de superar o impossível”.
Fontes:
Marcos Pontes, primeiro astronauta brasileiro a ir para o espaço; Marcos Martins, professor do Departamento de Física Experimental e diretor do Instituto de Física da USP; Airton Deppman, professor do Departamento de Física Experimental da USP; Alexandre Suaide, professor do Departamento de Física Nuclear da USP; Elcio Abdalla, professor do Departamento de Física-Matemática da USP; e Beatriz de Brito, medalhista de bronze na 8ª Olimpíada Latino-Americana de Astronomia e Astronáutica.