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Escolha sem peso

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Escolha sem peso

 

Por Gabriela Stocco

Reprodução

Orientação profissional e apoio da família podem ajudar jovem a escolher sua profissão

O momento de escolha da profissão costuma trazer dúvidas aos estudantes e, algumas vezes, pode provocar uma sensação de angústia pela indecisão, que é compartilhada por suas famílias.

Em 2010, 436.365 alunos concluíram o ensino médio no Estado de São Paulo, segundo dados do Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados).  No vestibular da Fuvest 2011, realizado entre o final de 2010 e início do ano seguinte, se inscreveram mais de 132 mil candidatos de todo o Brasil.

Dessa forma, todos os anos, milhares de jovens brasileiros passam por esse delicado momento de escolha – e, algumas vezes, reescolha – da profissão, que também terá consequências em sua vida pessoal. Além disso, nas últimas décadas essa decisão tem ganhado um peso maior e, em geral, trazido mais ansiedade aos jovens.

Para a psicanalista Deborah Valentini, autora da dissertação “Impasses pedagógicos contemporâneos: um estudo sobre a orientação vocacional em escolas”, apresentada na Faculdade de Educação, “há um tempo, a escolha profissional não era tão estressante quanto nos dias de hoje; observa-se que, atualmente, as escolhas profissionais assumem um status de primeira escolha importante que o jovem faz na vida, quando na realidade ele já fez um bilhão de outras escolhas muito importantes e com consequências para a vida antes disso”.

Ela explica que encarar essa escolha como a primeira traz mais tensão e pressão para que seja correta e definitiva. “As pessoas voltam atrás até em casamentos, por que não poderiam voltar atrás na escolha da profissão?”, questiona Deborah.

Durante sua vida, o jovem passou e passará por muitos momentos importantes, como o da escolha profissional. Mas tratá-lo como mais pesado e imutável do que realmente é só pode trazer um sofrimento que poderia ser amenizado com o apoio da família, informações aprendidas na escola e, quando necessário, ajuda de profissionais.

“As pessoas voltam atrás até de casamentos, por que não podem voltar atrás na escolha da profissão?”, questiona Deborah Valentini

“As pessoas voltam atrás até de casamentos, por que não podem voltar atrás na escolha da profissão?”, questiona Deborah Valentini

Para Deborah, a família pode ajudar criando espaços para conversas e o papel da escola seria o de fornecer informações por meio de palestras, visitas a universidades, entre outras ações. “Em minha dissertação, comecei a levantar por que as escolas estão se ocupando tanto da orientação vocacional, porque esse não era um tema desde sempre das escolas, elas se ocupavam muito mais de conceitos do que de temas transversais”, afirma a psicanalista.

Ela ainda defende que os pais não devem transferir a responsabilidade de ajudar seus filhos a escolherem a profissão para as escolas, mesmo que trabalhem fora. Já a ajuda de psicólogos deve ser procurada quando o sofrimento pela escolha começar a impedir o jovem de fazer outras atividades.

Yvette Piha Lehman, coordenadora do Serviço de Orientação Profissional do Instituto de Psicologia (IP), diz que “a escola tem que incluir a educação para a carreira, colocar espaços não só de estudo e não deixar o aluno tão superprotegido nos muros para depois ir confrontar o mercado de trabalho e a vida profissional”.

“Já a orientação profissional pode ajudar pelo menos a tirar essa angústia que não é só do adolescente, mas da família inteira. Se sentir perdido assim dá uma aflição, porque é o momento em que o adolescente reformula todos os lugares de toda a família. É um projeto novo que está entrando e a família vai se organizar e trazer o futuro para dentro de casa”, afirma a coordenadora.

 

Atendimentos psicológicos

O Serviço de Orientação Profissional do IP tem dupla função: oferecer estágios aos seus alunos de Psicologia e atender pessoas que estejam passando por uma crise com a profissão ou sua escolha. São atendidas cerca de 500 pessoas e a única restrição é que o cliente tenha mais de 14 anos.

ReproduçãoMas Yvette explica que a maioria dos clientes são adolescentes no segundo ou terceiro ano do ensino médio: “O adolescente que nos chega é aquele que, dentro das possibilidades de escolha, vive um momento de crise em função de duas ou três opções, de não saber o que fazer”. Assim, os jovens que procuram o serviço são os que não conseguiram resolver isso sozinho.

Segundo Yvette, “para quem não faz esse processo na adolescência, vai estourar em algum momento. É um trabalho superpreventivo, de se apropriar de uma definição. Pelo menos essa é a nossa ideologia aqui, defender o lugar da pessoa que escolhe”.

Sobre as desistências, Yvette diz que “há dez anos não tinha isso de desistir na USP. Havia alguns cursos problemáticos que tinham desistência, mas era pontual. Hoje é difuso. Vem gente do quinto ano da Medicina, quarto ano da Poli”.

Para ela, hoje existe uma crise que está invadindo a escolha “os jovens entram com um sentido no curso e, através da vivência universitária, o perdem. Quer dizer, não sabem por que estão ali. Quando recuperam o sentido inicial, começam a entrar em configuração”.

“A hipótese que tínhamos era que o aluno USP possuia um projeto social para ele, e quando houve a predominância de um modelo técnico, o sentido do papel social do aluno se perdeu”.

Yvette observa que a desistência ocorre em três momentos: primeiro, com os que não “escolheram”, mas foram influenciados por pais ou amigos. Depois, quando começam os estágios e a parte prática e o aluno não gosta. Ou ainda no final do curso: “A desistência pode se dar se há uma boa remuneração ou não, porque o aluno quer ter outros projetos e a profissão não dá suporte. Consideramos a profissão como um alicerce que dá autonomia e hoje é esse questionamento. Vou sobreviver, vai me dar autonomia?”, relata a professora.

No entanto, Yvette conta que, após os atendimentos no IP, “73% dos alunos não desistem (do curso). Há uma reconfiguração (pessoal) do curso em função de novas necessidades. O serviço realmente é muito importante, eu acho que a USP tem que ampliar isso em todas as unidades”.

Como os atendimentos são ligados ao período letivo do curso de Psicologia, as inscrições começam perto de março, depois do carnaval, e terminam no final de junho. Já os atendimentos vão de maio a setembro.

Para Yvette Piha Lehman, “a orientação profissional é um trabalho preventivo, é se apropriar de uma definição”

Para Yvette Piha Lehman, “a orientação profissional é um trabalho preventivo, é se apropriar de uma definição”

Yvette afirma: “Há uma curva de demanda que temos que atender até a inscrição da Fuvest, Enem e outros vestibulares. Por isso, até setembro existe maior densidade. Claro que depois continuamos, mas não estamos sob pressão da Fuvest”.

A coordenadora conta que o serviço também dá consultoria para escolas e cursinhos que o procuram, ajudando-os a montar serviços de orientação profissional e organizando eventos sobre o tema.

 

Feira de Profissões da USP

A USP realiza anualmente duas edições de sua Feira de Profissões, uma na capital e uma em um dos campi do interior. Além de conhecer os cursos oferecidos e tirar dúvidas, os alunos podem fazer uma sessão de orientação profissional oferecida pelo IP.

ReproduçãoPara Yvette, a feira é um “contato com o amanhã”. Ela explica que conhecer um local e imaginar-se nele pode ser muito positivo: “Esse espaço social não é uma USP em abstrato, é um lugar que o vestibulando pode ocupar. Almejar um lugar concreto, com caras, com pessoas agradáveis ou não, enfim, concretizar isso pode ser muito saudável e motivador”.

O teste vocacional aplicado é uma preparação para que os participantes possam aproveitar melhor a feira, ao saber quais são suas dúvidas e necessidades e que perguntas fazer. “É uma forma de tentar mostrar como a pessoa hierarquiza a sua escolha. Há algumas categorias: um pesquisa tudo e depois escolhe, o outro vai por impulso, o outro quer o contexto. Mas eles não saem decididos de uma feira, ela serve para estimulá-los e provocá-los para ver do que gostam, ter esse primeiro termômetro”, diz Yvette.

Para ela, a importância de pensar sobre a profissão é estar mais claro do motivo de estar lá e poder defender seu lugar muito mais, ser mais resiliente. “Claro que com a crise de mercado, sobreviver em sua escolha, manter sua paixão é muito importante, porque a realidade ficou muito funcional, automática.”

Yvette afirma: “A escolha da profissão tem que ter um sentido próprio, uma coisa que compromete em fazer essa escolha dar certo. Normalmente, a escolha não é um simples encaixe, não é apenas um fazer, você pode ter habilidade, mas não gostar de fazer. É refletir sobre aquilo que dá mais sentido, que causa orgulho e que proporciona uma identidade social e um lugar social de respeito”.

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