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Intervenção discute história de Dona Yayá

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Programa USP Internacional

 

Por João Vitor Oliveira

Cecília BastosSolário da casa foi transfigurado para trazer reflexões a respeito de seu significado social e histórico

Um corredor descendente cercado por muros altos que desemboca em uma pequena área retangular, igualmente rodeada por grandes paredes. O lugar passa uma sensação de clausura. Assemelha-se ao ambiente em que prisioneiros desfrutam de seu banho de sol, ou a estruturas presentes em hospitais psiquiátricos.

Mas não estamos falando de um hospício. Assim é o solário da Casa de Dona Yayá – Centro de Preservação Cultural da USP. Ou, pelo menos, era. A intervenção artística Belvedere, que vai até o dia 30 deste mês, transfigurou o local. “A ideia é discutir o significado social e histórico desse solário”, explica Mariana Vaz, idealizadora do projeto, que contou com colaboração de Mirella Marino, também artista, e José Silveira, arquiteto e cenógrafo.

Antes, o claustro. Agora, o mirante

Antes, o claustro. Agora, o mirante

A mansão, localizada no bairro do Bixiga, Centro da capital, abrigou, por cerca de quatro décadas, Sebastiana de Mello Freire, mais conhecida como Dona Yayá. Nascida em 1897 no berço de uma das mais importantes famílias do interior paulista, a mulher se viu cedo na vida como única herdeira de uma valiosa fortuna após seguidas perdas familiares. Ela era uma figura feminina moderna para a época, independente e frequentadora de rodas sociais de artistas.

Com cerca de 30 anos, porém, começou a apresentar sinais de insanidade mental, tendo tentado tirar a própria vida. Após o episódio, o conselho médico foi de que deveria mudar-se para um lugar mais calmo e tranquilo: a então chácara no Bixiga, afastada do centro da cidade naquela época. Lá foi mantida em confinamento até a sua morte em 1961. Sem herdeiros, a casa foi transferida para a USP como herança jacente.

O local era como um hospício particular. No solário, construído para seus banhos de sol, Yayá ficava trancada, reclusa e isolada de tudo e todos.

“Minha inquietação não é só com o que aconteceu há 60 anos, mas com o que acontece ainda hoje” – Mariana Vaz

“Minha inquietação não é só com o que aconteceu há 60 anos, mas com o que acontece ainda hoje” – Mariana Vaz

“Como eu venho da dança, imaginava fazer uma performance sobre o assunto, mas me pareceu insuficiente”, comenta Mariana. “Era necessário que as pessoas conhecessem o lugar e colocassem o corpo em relação ao sofrimento que Yayá passou nele. A sensação física é muito forte.”

Para a intervenção, foi construída uma plataforma de madeira que ocupa todo o lugar e o transforma totalmente. O corredor descendente, agora, leva para cima. Os visitantes chegam à área retangular em um nível superior ao das enclausurantes paredes. O que antes era confinamento vira um mirante para o belo jardim e a cidade ao redor, área para deleite e contemplação, belvedere. No centro, uma escada desce e leva para um pequeno e claustrofóbico espaço dentro da estrutura erguida, abaixo do mirante, representando o claustro ligado à história do lugar. “Cada visitante tem a oportunidade de experimentar a possibilidade do voo, de ver o solário como um lugar bonito e, ao mesmo tempo, o confinamento na parte de baixo, onde é possível ouvir os passos de quem está acima do mesmo modo que Yayá continuava tendo noção das coisas de fora pelo barulho na casa”, declara Mariana.

Transferida para a USP na década de 1960, a mansão no Bixiga é agora Centro de Preservação Cultural da Universidade

Transferida para a USP na década de 1960, a mansão no Bixiga é agora Centro de Preservação Cultural da Universidade

A artista releva ainda a atualidade da discussão proposta. Afinal, em que medida não temos situações análogas à vivida por Yayá em nossa sociedade? Não vemos ou vivenciamos, diariamente, momentos de clausura e exclusão, nos mais diversos sentidos que podemos atribuir às palavras? “A intervenção é uma maneira poética de discutir a questão da diferença, o padrão de normalidade nas diferentes épocas e como a mulher foi e é tratada”, ressalta.

No dia 30, o último em que a intervenção fica no local, acontece a performance artística “BELVEdalário”, realizada pela própria Mariana.

“Para mim esse lugar fala de muita coisa e traz uma tristeza enorme”, declara a artista. “É muito difícil, muito sofrido entrar nesse solário e, quando o fazemos, é como se fosse possível sentir o que Yayá sentia.”

Local: Centro de Preservação Cultural Casa de Dona Yayá – rua Major Diogo, 353, Bela Vista
Temporada: até 30/6
Visitação: segunda a sexta das 9h às 17h

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