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Paulo Sérgio Pinheiro

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50 anos em prol do livro universitário

 

João Vitor Oliveira

Combatendo a violência e defendendo os direitos humanos

Professor da FFLCH e fundador do NEV recebe prêmio da Fundação das Nações Unidas por sua trajetória profissional

Um jantar de gala na Cipriani 42nd Street, em Nova York. Nele, figuravam cerca de 500 importantes personalidades mundiais entre líderes políticos, diplomatas, celebridades e membros da mídia. A ocasião era o Global Leadership Awards Dinner, ocorrido no dia 16 de outubro. O evento é organizado anualmente pela Fundação das Nações Unidas e a Associação das Nações Unidas dos Estados Unidos para premiar pessoas e organizações que tenham trabalhado na promoção da paz, prosperidade e justiça no mundo.

Quando se formou em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), em 1964, Paulo Sérgio Pinheiro, professor aposentado da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e fundador do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP, não imaginava que estaria ali. Ele foi convidado à cerimônia para receber o Prêmio Leo Nevas de Direitos Humanos.

A homenagem coroa quase quatro décadas de trabalhos focados no combate à violência e voltados para a defesa dos direitos humanos. Professor, advogado, cientista político e diplomata, Pinheiro tem no currículo uma trajetória recheada de funções e postos de destaque mundial, tendo ocupado importantes cargos políticos nacionais e realizado trabalhos em diversos países pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Paulo Sérgio Pinheiro nasceu em 1944, no Rio de Janeiro

O caminho para entrar no mundo da diplomacia, no entanto, não foi o convencional. “Na verdade, eu pensava em ser diplomata, e meus pais queriam muito isso”, declara. “Porém, terminada a faculdade, não passei no concurso para ingressar no Instituto Rio Branco”. Curiosamente, o que reprovou o professor foi o francês, língua que estudava desde pequeno e que falava correntemente.

Ironia ou não, o tropeço abriu espaço para que ele fosse justamente à França, onde completaria seus estudos. Em 1967, como bolsista, fez graduação em Sociologia na Universidade de Vincennes. O doutorado seria obtido em 1971 pela Universidade de Paris.

Voltou para o Brasil no mesmo ano. O destino não foi o Rio de Janeiro, terra natal, e sim Campinas, para dar aula na recém-formada Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). “Algo raro: os cariocas não imigram para São Paulo com facilidade”, brinca. Foi o começo da experiência como professor. É, desde o final da década de 1990, docente na Universidade de Brown, nos EUA, onde leciona Relações Internacionais. Prestou concurso e foi aprovado no Departamento de Ciência Política da FFLCH em 1983.

Da esquerda para a direita: o embaixador Gilberto Saboia; Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda e então Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos; Tadeu Valadares, também embaixador; e Pinheiro, durante reunião em 2001

Na USP, fundou o NEV em parceria com o sociólogo Sérgio Adorno em 1987. O objetivo era fazer pesquisas aprofundadas sobre violência e direitos humanos. A violência sempre esteve presente em seus estudos. “No começo, me foquei mais em história política e social, mas desde meados dos anos 80 trabalho muito com temas como repressão à classe operária e atuação da polícia”, declara.  Ele destaca o papel do NEV de pesquisar a continuidade do autoritarismo na democracia brasileira e diz que temos, até hoje, legados do regime militar. “O sistema de segurança pública é um exemplo. Nunca foi reformado”, comenta. Com o passar dos anos, os temas foram se alargando, as pesquisas se especificando e importantes apoios surgindo. A Fapesp e o CNPq estão envolvidos com o núcleo. “Fomos capazes de montar uma rede internacional. Se no começo éramos seis pessoas, hoje somos sessenta.”

Em 1995, o embaixador Gilberto Saboia indicou Pinheiro para o cargo de Relator Especial da ONU para o Burundi, na África. Aí sim, veio o ingresso na diplomacia. O professor cumpriu a função até 1998. “Eu ia uma ou duas vezes por ano para o país, mas tinha de estar sempre em contato, recolhendo informações.” Teve o mesmo papel de 2000 a 2008 em Myanmar, no Sudeste Asiático.

O professor ao lado da presidente Dilma Rousseff e dos outros membros da Comissão Nacional da Verdade durante a cerimônia de instalação do órgão

Ainda pela ONU, foi indicado pelo então secretário geral, o ganês Kofi Annan, em 2003, para elaborar um estudo minucioso da violência contra crianças no planeta. Visitou mais de 50 países, esteve em todos os continentes e apresentou, três anos mais tarde, o Relatório Mundial sobre a Violência Contra as Crianças, primeiro estudo aprofundado sobre o tema no mundo. Hoje, ocupa nas Nações Unidas o cargo de presidente da Comissão de Inquérito Independente sobre a Síria, que averigua abusos aos direitos humanos cometidos pelo regime repressor do ditador Bashar al-Assad no país. “Passo cerca de dez dias seguidos na ONU em Genebra (Suíça), onde tenho uma equipe de 20 pessoas”, declara. “Fui a Damasco, capital da Síria, e a países da região em junho deste ano. Os conflitos estavam concentrados na periferia, então a capital estava mais tranquila. Não senti medo e não tive problemas. Na verdade, nem pensei muito nisso.” Três dias após a visita do professor, no entanto, um atentado a bomba atingiria o Ministério da Justiça de Damasco, onde ele estivera em sua estadia.

Na política nacional, foi secretário especial dos Direitos Humanos e relator do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) I e II durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso. Participou também, no mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, do PNDH III, como especialista revisor. Apesar do envolvimento, Pinheiro destaca: “Nunca participei ou pretendi me envolver com partidarismos. Meu pensamento estava em cuidar dos direitos humanos”.

Pinheiro foi relator especial da ONU para o Myanmar entre 2000 e 2008

O professor integra, atualmente, a Comissão Nacional da Verdade, que investiga violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988 no Brasil por agentes do Estado. “Eu já havia conhecido todos os integrantes da comissão em alguma etapa da minha vida. Trabalhamos com muita coesão”, comenta. “Conseguimos, no final de setembro, a modificação no atestado de óbito do jornalista Vladimir Herzog, deixando claro que ele foi assassinado. Uma vitória importante.”

E, além de tudo isso, Pinheiro encontra tempo para passar temporadas com a família. É casado com Ana Luiza, pai de três filhos e já tem três netos. A rotina, no entanto, é de ponte-aérea. “Houve um momento da minha vida que cheguei a ter um apartamento em São Paulo, um em Washington e um em Genebra. Para complicar, dava aula na Universidade de Brown, em Providence, Rhode Island (EUA).” O professor vive, hoje, entre São Paulo, Brasília – onde fica pelo menos quatro dias por semana trabalhando na Comissão da Verdade – e Genebra.

Ainda assim, apesar do sucesso, faz questão de ressaltar: “Eu nunca planejei nada disso. Não que eu tenha ficado sentado esperando tudo acontecer, mas você entra numa via e vai seguindo”, declara. “Tudo é parte deste circuito ou desta correnteza que você, em determinado momento da vida, pega e decide percorrer.”

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