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Química, fármacos e Jabutis

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Estilo de vida saudável

 

Por Ana Luiza Tieghi

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Carlos Alberto Montanari

Professor do Instituto de Química de São Carlos é referência na área da química medicinal e ganhou prêmio de literatura

 Um jovem encantado com a possibilidade de criar novas substâncias, assim era Carlos Alberto Montanari em seus anos de escola. O atual professor do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) e ganhador do segundo lugar de um dos mais importantes prêmios literários do Brasil começou cedo a sua paixão pelo tema. Depois que seu professor de química do ensino médio despertou nele a vontade de conhecer mais sobre essa área tão fascinante da ciência, Montanari nunca mais parou de investigá-la.

O professor e pesquisador fala com tanta naturalidade da química, que faz parecer fácil uma disciplina que, por sua enorme complexidade e abrangência, amedronta a maioria das pessoas. Nunca se contentando com as explicações que recebia e movido por uma grande curiosidade, Montanari enxergou em um simples remédio para dor de cabeça todo um campo de trabalho em seu segmento. “Como poderia uma pequena substância química ser administrada em um organismo tão complexo como o nosso e, depois de algum tempo, minorar ou eliminar a dor?” Ele se perguntou repetidas vezes. A resposta direcionou o rumo de seus estudos. “Descobri que, através da química medicinal, não era apenas possível responder a essa pergunta, mas também criar uma nova substância bioativa com efeitos melhorados.”

Montanari ao lado de Michael Tute, seu supervisor, durante o pósdoutorado

Montanari ao lado de Michael Tute, seu supervisor, durante o pósdoutorado

O nome pode parecer estranho, mas esse é um segmento da ciência que faz parte da vida de todas as pessoas. “A química medicinal consiste da aplicação de métodos químicos para a síntese de substâncias bioativas de interesse farmacológico no tratamento de doenças”, explica Montanari. “Ela é a base para a criação de novos fármacos, desde a fase de descoberta até o desenvolvimento”, sendo responsável pelos avanços na tecnologia das medicações e na consequente melhora de sua eficácia e redução de efeitos colaterais. “Unir o mundo químico com o biológico foi, então, o grande desafio”, ressalta o professor.

Um dos esforços de Montanari para promover o estudo e a pesquisa da sua área foi a criação do Simpósio Brasileiro de Química Medicinal. Também conhecido como BrazMedChem, é atualmente o maior encontro do segmento na América Latina e tem o objetivo de congregar pesquisadores brasileiros e estrangeiros, sempre visando à comunidade nacional. Já participaram do evento pesquisadores ilustres, como o ganhador do Prêmio Nobel de Química em 2001, professor Barry Sharpless. A próxima edição está programada para acontecer em 2014, ainda sem local definido.

Dos fármacos aos Jabutis

O pesquisador ajudou a escrever e organizou o livro “Química Medicinal: Métodos e Fundamentos em Planejamento de Fármacos”, que lhe rendeu o segundo lugar no Prêmio Jabuti de Literatura, na categoria Ciências Exatas, em 2012. Para realizar a obra, Montanari foi motivado pela consciência do papel importante que essa área da química representa e pela vontade de tornar o seu conhecimento mais acessível.

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O livro foi um projeto que levou cinco anos para ficar pronto e teve a participação de mais 15 autores correspondentes. “O grande desafio na preparação da obra foi traduzir o sistema complexo para o entendimento comum de tal forma a permitir completa clarificação dos dados apresentados”, revela o autor.

Cada capítulo do livro foi escrito por um especialista da química medicinal brasileira, sendo que Montanari escreveu quatro deles, focando em sua especialidade, as características estruturais e físico-químicas de pequenas substâncias bioativas.

Tanto trabalho indica que a obra mereceu o reconhecimento nacionalmente alcançado. Segundo Montanari, “o livro foi muito feliz porque conseguiu apresentar conceitos profundos sem perder o rigor da linguagem científica”. Apesar de não ter pensado em prêmios enquanto escrevia a obra, Montanari admite seu valor. “Não fizemos com esse objetivo. Fizemos o livro para atender a uma necessidade educacional fundamental. Só que fizemos com tanto esmero que fomos graciosamente contemplados com o Prêmio Jabuti. Como diria Monteiro Lobato: ‘Resolvemos pôr em prática uma aventura inimaginável, uma viagem ao céu!’”, completa.

Trajetória acadêmica

Desde o despertar do seu interesse pela química até hoje, Montanari estudou muito. Graduou-se em Química pelas Faculdades Oswaldo Cruz no início dos anos 80, obtendo um mestrado em Química Orgânica pela USP já em 1987. Entre os anos de 1989 e 1991, morou pela primeira vez na Inglaterra, enquanto fazia seu doutorado, também pela USP, em parceria com a Universidade de Londres. Durante esse período, trabalhou no Laboratório Bourne, realizando estudos para a identificação estrutural de pequenas moléculas bioativas.

Cerimônia de entrega do Prêmio Jabuti, onde foi representadopor seu filho, Raphael, na foto ao lado do prof. Plinio Martins, diretor da Edusp

Cerimônia de entrega do Prêmio Jabuti, onde foi representado
por seu filho, Raphael, na foto ao lado do prof. Plinio Martins, diretor da Edusp

Em 1995, voltou à Inglaterra para realizar seu estágio de pós-doutorado sob a supervisão do professor Michael Tute, do centro de pesquisas da empresa farmacêutica Pfizer, na cidade inglesa de Sandwich. “O principal objetivo do projeto era entender as razões moleculares da atividade farmacológica de agentes antileishmaniose”, conta. O projeto deu resultados. “Alguns anos mais tarde, fizemos o depósito de quatro patentes para novas estruturas químicas cujas substâncias apresentam ação antimicrobiana”, relembra Montanari. Foi com Tute que Montanari aprendeu a modificar a estrutura de uma pequena molécula e observar essa mudança em um sistema biológico complexo, técnica que aplica em seus estudos no Grupo de Química Medicinal do IQSC até hoje.

O período que passou na Inglaterra foi fundamental para o desenvolvimento profissional de Montanari. Foi naquele país que o professor adquiriu as bases de seu conhecimento, possibilitando a posterior implantação de sua linha de pesquisa no Brasil, inicialmente na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e depois na USP.

A ética nas pesquisas científicas

Além da pesquisa na área química, Montanari também já trabalhou com a questão da ética na ciência. Durante sua passagem pela UFMG, foi vice-presidente do Comitê de Ética em Pesquisa na universidade. O grupo desenvolvia protocolos para o envolvimento de seres humanos em trabalhos científicos, estabelecendo diretrizes para que esse tipo de pesquisa fosse realizado com responsabilidade.

Foto de 1995, enquanto fazia seu pósdoutorado na Inglaterra

Foto de 1995, enquanto fazia seu pós-doutorado na Inglaterra

Um exemplo dos protocolos criados pelo grupo é a necessidade do conhecimento prévio do paciente sobre o que vai acontecer com ele. “Além disso, o respeito aos valores culturais, sociais, morais, religiosos e éticos também tem que ser garantido”, conta Montanari. A garantia dos benefícios após a realização da pesquisa é outro ponto importante. Criado em 1996, o comitê serviu para guiar outras instituições que também queriam realizar trabalhos com seres humanos.

Atualmente Montanari coordena, com o professor Andrei Leitão, o Grupo de Química Medicinal do IQSC, trabalhando na identificação de novos agentes químicos para o tratamento da doença de Chagas e leishmaniose, com colaboradores em São Paulo, Campinas, Ribeirão Preto, Londres, Cambridge, Houston, Nova Jersey e Berlim.

Nascido em Canitar, uma pequena cidade do interior de São Paulo, o professor agora reside em São Carlos, com sua mulher, Maria Luiza, e o filho do casal, Raphael Montanari. Maria Luiza é pesquisadora da USP e da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), também trabalhando com a área química. Já Raphael é estudante de mestrado em Ciência da Computação, pela USP São Carlos.

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