comunidade usp

Vencendo as dificuldades

  • Facebook facebook
  • Twitter twitter
  • AddThis mais
Vencendo as dificuldades

 

Por João Vitor Oliveira

Tratamentos para reabilitação ajudam portadores de deficiência a ter uma vida mais independente

Algumas atividades do cotidiano são feitas tão repetidamente que nem percebemos que tipo de esforço, movimento ou sentidos estamos trabalhando no momento. Levantamos da cama, escovamos os dentes, tomamos banho, trocamos de roupa e preparamos o café da manhã de maneira mecânica, com a cabeça pensando nos afazeres do resto do dia. Mas você, destro, já imaginou as dificuldades que enfrentaria se tivesse que fazer tudo isso com a mão esquerda de uma hora para a outra? Ou como seria ter que, repentinamente, realizar suas tarefas de olhos fechados?

Pessoas com deficiência passam por situações semelhantes e têm que aprender a conviver com isso pelo resto da vida. Segundo o Censo Demográfico 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aproximadamente 24% da população do País – mais de 45 milhões de pessoas – declarou ter algum tipo de deficiência. A maior incidência foi de deficientes visuais, depois motores, auditivos e mentais.

Alunas do curso de Terapia Ocupacional que fazem parte da equipe do Reata realizam atividade com criança deficiente na UBS São Jorge

A atenção a essa significativa população torna-se, assim, importante, e os principais objetivos da Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência giram em torno da reabilitação da capacidade funcional e do desempenho humano dos deficientes. As maneiras de se realizar este processo vão do atendimento médico às práticas esportivas, chegando, atualmente, até ao uso de robótica e jogos computacionais com os pacientes. Mas as forças políticas voltadas para isso estão concentradas, em sua maioria, na atenção básica, também denominada atenção primária à saúde (APS).

A principal estratégia para organizar os serviços de APS no Brasil é o Programa Saúde da Família. Trata-se de um conjunto de ações no âmbito individual ou coletivo que abrange diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde de uma maneira geral, além de medidas de prevenção. É operacionalizado através de equipes compostas por médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e agentes comunitários que ficam localizadas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e que realizam, também, atendimentos nos domicílios locais. “Existem ainda as equipes do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf), compostas por profissionais multidisciplinares – fisioterapeutas, dentistas, nutricionista, entre outros – e que auxiliam as equipes das UBS”, explica Eucenir Rocha, professora do Departamento de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina (Fofito – FMUSP).

Eucenir Rocha, professora do Fofito – FMUSP

Eucenir é coordenadora do Laboratório de Estudos de Reabilitação e Tecnologia Assistiva (Reata), que desenvolve parcerias de assistência com o Nasf na UBS São Jorge. “O atendimento primário, para reabilitação, é essencial”, explica. “Deficientes locomotores, por exemplo, têm dificuldade para realizar várias atividades, de limpar a casa a ir ao banco. Entrando em contato com eles no atendimento básico, nós fazemos o diagnóstico, definimos o quadro de possibilidades e trabalhamos a locomoção na ação cotidiana.” A professora esclarece que é através da atividade, dos exercícios do dia a dia, que a terapia ocupacional promove este processo de reabilitação, possibilitando que os pacientes tenham uma vida menos restrita, mais independente.

Luiz Gustavo Ibata em aula do curso Natação Inclusiva

Igualmente importante é o bem-estar psicológico deles. Uma deficiência adquirida significa um intenso processo de mudança na vida de uma pessoa e, para reabilitá-la e promover sua reinclusão social, é necessário trabalhar pontos como sua autoestima. Não à toa, um dos profissionais que entram no Nasf é o psicólogo. “Você não recupera o corpo se não recupera a emoção e a mente. Tudo que você faz de trabalho corporal afeta emoção e mente e vice-versa. São indissociáveis essas questões”, declara Eucenir.

“Os centros esportivos têm que ter mais acessibilidade para as pessoas com deficiência” – Elisabeth de Mattos

Para a professora, o Programa Saúde da Família é interessante e investir na atenção primária é o caminho certo, mas a política precisa ser ampliada. No Butantã, por exemplo, existem apenas duas equipes do Nasf, sendo que a região possui mais de 400 mil habitantes. Os profissionais acabam, assim, ficando sobrecarregados.

Esporte e reabilitação

Foram realizados em Londres, entre 29 de agosto e 9 de setembro, os Jogos Paralímpicos de Verão 2012, evento que reuniu os principais atletas com deficiência física ou sensorial do mundo. É claro que, para atingir esse nível, a pessoa já deve estar reabilitada, mas o esporte também desempenha um papel importante no processo de reabilitação de deficientes.

A professora do Departamento de Esportes da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) Elisabeth de Mattos explica: “No caso do deficiente físico, tem o efeito do treinamento, de ganho de força e flexibilidade. Mas, falando de deficientes de uma maneira geral, o esporte ajuda a pessoa a ser mais sociável, confiante, e melhora a autoestima. Principalmente para quem tem déficit intelectual”.

Elisabeth é coordenadora do curso Natação Inclusiva, oferecido pela EEFE. As aulas, abertas a toda a comunidade, trabalham o conceito de inclusão reversa, colocando pessoas sem deficiência em um grupo de pessoas deficientes para realizar as mesmas atividades, que vão de simples brincadeiras ao ensino das técnicas de mergulho e nado. São aceitos alunos com qualquer tipo de dificuldade, menos aqueles com distúrbios de comportamento, que sejam agressivos. Luiz Gustavo Ibata tem 20 anos e é portador de paralisia cerebral. Participa há seis anos do curso. Segundo sua mãe, Ana Rita Ibata, “as aulas são muito importantes para ele, tanto no aprimoramento da capacidade motora quanto no relacionamento com outras pessoas”. Ela explica que, lá, seu filho se sente muito à vontade para interagir socialmente com os companheiros.

Adriano Siqueira utilizando um dos equipamentos desenvolvidos recentemente no Laboratório de Reabilitação Robótica da EESC: o exoesqueleto Exo-Kanguera

Outro exemplo de atividade é o futebol. Uma parceria entre a EEFE e o Centro de Práticas Esportivas da USP (Cepeusp) oferece aulas de futebol de salão para pessoas com deficiência intelectual. A complexidade do jogo coletivo contribui para o desenvolvimento mental dos alunos, além de proporcionar uma atividade de lazer e mais qualidade de vida.

Para Elisabeth, o esporte está mais no atendimento secundário do que no APS. A partir do momento que o paciente estiver liberado da parte médica para poder fazer atividade física, ela se torna um apoio interessante para a reabilitação. A acessibilidade a essa prática, no entanto, é um problema. “O esporte para deficientes é algo que poderia ser mais trabalhado, por exemplo, em nível escolar. É algo que falta na maioria das escolas”, declara, completando: “E não só isso. Se eles pudessem voltar para casa e jogar, com facilidade, futebol, vôlei sentado, a reabilitação seria bem mais rápida”.

Robótica e reabilitação

A Rede de Reabilitação Lucy Montoro, que tem parceria com o Hospital das Clínicas da FMUSP, inaugurou, em maio, laboratório de robótica com quatro equipamentos de tecnologia ultra-avançada que oferecem alternativas inovadoras de tratamento para deficientes físicos.

“A reabilitação robótica trabalha estimulando, por meio de jogos computacionais, a movimentação dos membros que sofreram redução da sua capacidade motora após um AVC (Acidente Vascular Cerebral) ou lesão medular”, explica Adriano Siqueira, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC).

O uso de robótica em reabilitação ainda não é muito acessível para a população em geral. Voltado para pessoas com problemas de locomoção, está, por sua complexidade tecnológica, no nível terciário de atendimento e, em alguns casos, no secundário, quando fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais manipulam os aparelhos desenvolvidos.

As aulas de futebol de salão para deficientes intelectuais ocorrem nas quadras descobertas do Cepeusp, às quartas e sextas

Mas o fato é que a tendência é que se torne mais acessível. Siqueira é responsável pelo Laboratório de Reabilitação Robótica da EESC, que realiza pesquisas na área. Ele explica: “A disseminação da reabilitação robótica é um de nossos objetivos. Queremos desenvolver dispositivos mais compactos e de menor custo que, futuramente, poderão ser utilizados por um número maior de pacientes”.

Seja, então, no atendimento primário, secundário ou terciário, os processos de reabilitação são uma realidade na vida de pessoas com deficiência. É essencial o acesso e o aperfeiçoamento deles para que esta população não se encontre socialmente excluída. Conforme declara a professora Elisabeth de Mattos, “reabilitar é tornar hábil novamente, é dar condições para que a pessoa volte a realizar atividades às quais estava acostumada, promovendo sua autonomia e independência”.

Cursos e tratamento para reabilitação

• Futebol de salão para deficientes intelectuais

Público: portadores de deficiência intelectual maiores de 18 anos e aptos à prática de exercícios físicos
Horário das aulas: quartas e sextas, das 14h45 às 16h15
Inscrições: devem ser realizadas presencialmente nas salas 7 ou 8 do Velódromo do Cepeusp, das 8h30 às 16h30
Mais informações: (11) 3091-3361
OBS: curso gratuito

• Natação Inclusiva

Público: portadores de deficiência física, visual ou auditiva
Inscrições: serão abertas em janeiro. Os inscritos passam por um processo de triagem, agendado no ato da inscrição, e os selecionados podem se matricular no curso. Na triagem, é necessário levar laudo médico com o CID10 (Classificação Internacional de Doenças), atestado médico para frequentar piscina e trajes de banho
Período de curso: quatro meses (março a junho)
Preços: turmas de terça e quinta-feira: R$ 225,00 à vista; ou duas parcelas de R$ 118,00; ou quatro parcelas de R$ 60,00. Turmas de sexta-feira (voltadas para pessoas com deficiência cognitiva): R$ 118,00 à vista; ou duas parcelas de R$ 93,00; ou quatro parcelas de R$ 50,00.
Mais informações: (11) 3091-3182

• Rede de Reabilitação Lucy Montoro

Atendimento: as consultas são marcadas somente através de encaminhamento médico
Unidades: Capital: Morumbi, Vila Mariana, Clínicas, Lapa e Umarizal. Interior: Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Campinas, São José dos Campos, Jaú, Presidente Prudente, Santos, Mogi Mirim e Fernandópolis
Mais informações: (11) 3905-8700

Um comentário sobre “Vencendo as dificuldades”

  1. Johnny Notariano disse:

    Eu fico emocionado quando me deparo com um profissional da saúde a cuidar de um deficiente. É algo maravilhoso, estão perto da Divina Sabedoria. O deficiente luta com seus próprios problemas; tende a se isolar; depressivos, mas quando encontram alguém com a capacidade de tirá-los do abismo, voltsm a viver a sorrir e até cantam. Faltam proffissionais na área. O resgate da alegria de um deficiente, só pode ser coisa de DEUS.

Deixe um Comentário

Fique de Olho

Enquetes

As questões nas reuniões do Conselho Municipal de Política Urbana envolvem, indiretamente, transporte e mobilidade. Em sua opinião, qual item seria prioridade para melhorar o transporte público?

Carregando ... Carregando ...

Dicas de Leitura

A história do jornalismo brasileiro

O livro aborda a imprensa no período colonial, estende-se pela época da independência e termina com a ascensão de D. Pedro II ao poder, na década de 1840
Clique e confira


Video

A evolução do parto

O programa “Linha do Tempo”, da TV USP de...

Áudio

Energia eólica e o meio ambiente

O programa de rádio “Ambiente é o Meio” foi...

/Expediente

/Arquivo

/Edições Anteriores