alimentação

 

 
por
Marcos Jorge


E
m 2001, a Comissão de Segurança de Produtos de Consumo, órgão oficial do governo norte-americano, divulgou uma estatística revelando que, naquele ano, mais de 4 mil pessoas morreram por conseqüência dos chamados acidentes de consumo. E não é só isso, o levantamento também apontou que os atendimentos hospitalares decorrentes desses acidentes acarretavam um gasto ao governo na ordem de 300 milhões de dólares por ano.

Acidentes de consumo acontecem quando um produto ou serviço prestado provoca dano à saúde ou à segurança do consumidor, seja esse dano causado por um simples defeito ou pela falta de informação quanto à periculosidade e quanto ao uso correto do produto. Um corte na mão durante a abertura de uma lata, um machucado resultante de uma freada brusca do ônibus ou sufocamento causado pelo engolimento da peça de um brinquedo por uma criança são situações que podem caracterizar esse tipo de acidente.

Apesar de extremamente freqüentes, não existe no Brasil qualquer tipo de levantamento estatístico que aponte as principais causas, o número de vítimas, ou o custo que o governo tem com os acidentes de consumo. Pensando nisso, a AMB(Associação
Médica Brasileira) e a Pro-Teste (Associação de Defesa do Consumidor) elaboraram um projeto para mapear a incidência e os fatos geradores dos acidentes de consumo em três hospitais da cidade de São Paulo. Colaboraram com o projeto o Hospital São Paulo, da Escola Paulista de Medicina, o Hospital das Clínicas e Hospital Universitário, ambos da Universidade de São Paulo.

O CDC (Código de Defesa do Consumidor) prevê como direito básico a proteção à vida, à saúde e à segurança contra produtos ou serviços considerados perigosos ou nocivos. Ele exige também que o fabricante informe, de maneira clara e adequada, sobre a periculosidade de determinado item colocado à venda. "Quando o produto oferece um risco que não é do conhecimento comum, o fabricante precisa informar devidamente o comprador", explica Dante Kimura, diretor de Programa Especial do Procon/SP. Para entender melhor a questão, Kimura usa como exemplo a faca, um produto sabidamente perigoso e que leva risco ao consumidor. Um corte no dedo provocado pela faca é um acidente normal, esperado, mas se ele acontecer por causa de um cabo de madeira quebrado ou um parafuso solto, está caracterizado um acidente de consumo.

O resultado do projeto da AMB e da Pro-Teste indicou que a maioria dos atendimentos ocorre por acidentes com produtos (73%), sendo as crianças suas principais vítimas com 44% das ocorrências. Já os acidentes decorrentes da prestação de serviço representam 27% dos atendimentos hospitalares, a maioria deles (43%) causados pelo serviço de transportes. Para Marcos Pó, gerente de informações do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), a criança é naturalmente mais curiosa e tem menos noção de risco que o adulto, o que a deixa mais vulnerável. "É por isso que os brinquedos destinados à criança seguem toda uma regulamentação específica", afirma Pó. Um brinquedo comprado no camelô pode parecer inofensivo e extremamente conveniente para o bolso, mas, nesse caso, o barato pode sair muito caro. Muitos deles estão fora das regulamentações de segurança, apresentando pontas afiadas e peças pequenas que, caso sejam engolidas, podem causar sufocamento e colocar em risco a vida do bebê.

Em muitos casos, uma simples informação colocada de forma clara e visível (como previsto no CDC) é o suficiente para evitar um incidente mais sério. Foi o que aconteceu em 1998 quando o Idec testou diversas marcas de chuveiros elétricos. Pó cita o caso de um chuveiro cujo aviso dizia: ESSE CHUVEIRO DEVE SER ATERRADO CONFORME NORMA NBR5410, informação que, apesar de estar visível, pouco quer dizer para a maioria dos consumidores que não entendem nada de instalações elétricas. "O produto deveria ter uma advertência dizendo que ele apresenta risco de choque se não for devidamente aterrado", completa. Mais tarde esses problemas foram reparados e levados em consideração pelo Inmetro na hora de criar uma regulamentação para o produto.

Como no caso dos chuveiros, o perigo muitas vezes pode estar dentro da nossa própria casa. O levantamento da Pro-Teste e da AMB revelou que, no caso de acidentes com produtos, 83% deles acontecem dentro do próprio ambiente doméstico. É preciso tomar bastante cuidado com tanques mal colados na parede que podem cair sobre a criança, alimentos estragados, choques com as instalações elétricas dos chuveiros, paredes do fogão que aquecem demais e podem queimar uma dona de casa mais descuidada ou um botijão de gás com defeito ou sem as informações necessárias, o que pode causar um acidente grave.

Pelo lado do fabricante, é importante estabelecer um canal eficiente de contato com o consumidor. Um SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor) de qualidade é capaz de identificar um produto ou serviço que apresente alto índice de acidentes e permite à empresa tomar as medidas necessárias antes do problema se agravar. Segundo Andrea Galebe, assessora jurídica da Abrarec (Associação Brasileira das Relações Empresa Cliente), "o fabricante precisa ter profissionais treinados, que conheçam o Código e saibam lidar com o consumidor". Caso seja confirmado o acidente de consumo, a Abrarec recomenda que a empresa minimize ao máximo o prejuízo e acompanhe o cliente em todo o processo de ressarcimento do dano, evitando, assim, levar o incidente para as instâncias jurídicas, o que acaba sendo custoso para ambas as partes.

O usuário que se sentir vítima de um acidente de consumo deve primeiramente comunicar ao respectivo SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor) para informar a empresa da periculosidade do produto. Se o serviço não atender às expectativas do comprador, deve-se procurar um órgão de defesa do consumidor e passar as informações da compra (nome, modelo, tamanho, data de validade, lote, etc.), caso o produto tenha que ser retirado do mercado (os chamados recall). Em caso de danos graves, a vítima deve recorrer à Justiça para ressarcimento do prejuízo. "A lógica é que a empresa conhece melhor o produto que o consumidor, ficando sob responsabilidade do fabricante provar a sua inocência", afirma Pó.

 

Serviços


O Idec é uma ONG (Organização Não-Governamental) que trabalha em defesa do consumidor, realizando testes com diversos produtos do mercado. Além disso, publica a revista Consumidor S.A., presta serviços e orienta seus associados em assuntos relativos à defesa do consumidor.

O site do Ministério da Justiça disponibiliza uma lista de recalls anunciados pelas empresas desde 2000 e oferece uma pesquisa em que podem ser encontrados órgãos de defesa do consumidor em todo o Brasil.

O Procon/SP é o órgão responsável pela proteção, amparo e defesa do consumidor em âmbito estadual. Cabe ao Procon orientar, receber, analisar e encaminhar reclamações, consultas e denúncias de consumidores. Além de fiscalizar preventivamente os direitos do consumidor e aplicar as sanções necessárias quando for o caso.