vida sexual

 

 
por
Julia Tavares


A
quantas anda o desejo sexual dos brasileiros? Quais são seus medos e as situações que interferem negativa e positivamente no desempenho sexual? A resposta para essas e outras perguntas foi tema do maior estudo sobre sexualidade já realizado no Brasil. Com coordenação de Carmita Abdo, fundadora do Projeto Sexualidade do Instituto de Psiquiatria da USP, o Estudo da Vida Sexual do Brasileiro foi feito com cerca de 7.100 pessoas de todas as regiões do Brasil. A partir dele, a professora escreveu O descobrimento sexual do Brasil , que acaba de ser lançado pela Summos Editorial.

Entre os resultados obtidos, uma revelação: apesar da aparente liberação sexual promovida pela mídia, nos programas de auditório e novelas de TV, nas músicas de Axé e mesmo em comerciais, o brasileiro ainda carrega muitos receios para a cama. O principal deles é não satisfazer o parceiro (55,9% homens e 45,4% de mulheres), porcentagem que ultrapassa inclusive o medo de contaminações com doenças sexualmente transmissíveis (44% para homens e mulheres).


foto:Oswaldo Santos

Carmita Abdo

“Na verdade, a meta da relação sexual está

calcada na satisfação do parceiro, assim

como em ter a comprovação de

que o próprio desempenho é bom”

Carmita Abdo
 

Mas afinal, qual o motivo de tamanha preocupação com a satisfação sexual? “Na verdade, a meta da relação sexual está calcada na satisfação do parceiro, assim como em ter a comprovação de que o próprio desempenho é bom”, observa Carmita, que também pesquisou as situações que interferem negativamente no desempenho. Após o cansaço, apontado por 57,3% das mulheres e 50,1% dos homens, é expressivo o número de referências à ansiedade: 24,9% de homens e 21,4% de mulheres.

“Minha preocupação é fazer com que minha esposa tenha orgasmo, e é mais fácil pensar nela. Quando chega a minha vez, fico ansioso com minha demora, e às vezes perco a ereção”, conta Carlos (nome fictício), funcionário da USP. Ele tem 47 anos e é casado há 23.

Para Aílton Amélio da Silva, psicólogo e professor da USP, boa parte dessas ansiedades são aprendizagens sociais. “A principal preocupação do homem é com o tamanho de seu pênis. Mas são comparações absurdas com atores de filmes pornográficos. A sociedade também prega que ele tem que estar sempre pronto e agüentar mais de uma relação”, ressalta Silva, especialista em estudos sobre o relacionamento amoroso. Com relação às mulheres, ele acredita que o padrão de beleza vigente – “impossível de alcançar”, é uma das causas para aumentar a insegurança e afetar a auto-estima inclusive na cama.

“Minha preocupação é fazer com que minha

esposa tenha orgasmo, e é mais fácil pensar nela.

Quando chega a minha vez, fico ansioso com

minha demora, e às vezes perco a ereção”


Carlos (nome fictício)

 

Do espelho para a cama

“O modelo de mulheres que freqüenta a TV e o cinema é um padrão raro e estrangeiro (olhos coloridos, cabelo e pele clara). O sofrimento com academias, dietas e cirurgias plásticas é comparável ao uso do espartilho para afinar a cintura”, destaca Silva, lembrando que, por não atingirem esse padrão de beleza, muitas dizem preferir ter relações sexuais no escuro. O Estudo da Vida Sexual do Brasileiro mostra que a atração física pelo parceiro é mesmo o maior fator que os homens apontam para o bom desempenho sexual (73,5%), seguido de tempo suficiente e tranqüilidade (69,5%). “Mas os homens reparam bem menos do que elas imaginam. O desejo vai além da estética, tem a ver com o comportamento, charme, segurança e feminilidade, que são aspectos altamente complexos”, garante o psicólogo.

Medos relacionados com sexo, em homens e mulheres

fonte: Descobrimento sexul do Brasil

As mulheres são mais românticas: 77,2% responderam que o relacionamento com afeto e sentimento é o ingrediente principal para a satisfação sexual. Em segundo lugar, o que conta é a intimidade (70,6%) e, em terceiro, a atração física (68,2%). “Eu não conseguiria ter alguma coisa com alguém sem afeto. Acho que a juventude de hoje é diferente. Para mim, essa história de ficar é muito estranha”, assume a funcionária Lúcia, que tem 48 anos e é casada.

Já para a funcionária Maria (nome fictício), a intimidade é o fator mais importante. “Tive um relacionamento de quatro anos em que o afeto se manteve estável, mas o fato de existir intimidade e termos liberdade para dizer o que cada um gostava ajudou no nosso bom desempenho”, acredita ela, que tem 35 anos e é solteira.

Sobre o exagero da preocupação com a forma física em detrimento da intimidade e espontaneidade, Carmita alerta: “Muitos confundem a cama com uma pasarela, mas dessa forma a sexualidade está sendo escravizada. Sexo deveria ser uma questão de naturalidade”.

“Tive um relacionamento de quatro anos em

que o afeto se manteve estável, mas o fato

de existir intimidade e termos liberdade

para dizer o que cada um gostava ajudou

no nosso bom desempenho”

Maria(nome fictício)

Sexo e saúde

Colega de trabalho de Lúcia, Regina diz que sua maior preocupação é a contaminação com doenças sexualmente transmissíveis (DST). A funcionária, de 42 anos, pertence a uma geração que viveu a juventude sem o fantasma da Aids e teve que aprender tardiamente a se prevenir. No Brasil, os primeiros casos da doença começaram a aparecer em meados da década de 80, mas atualmente ela já atinge 600 mil pessoas, segundo dados do Ministério da Saúde de 2003.

“Tenho receio de que o companheiro não aceite usar. Já aconteceu de um namorado dizer que a camisinha irritava. Isso atrapalhava o clima, porque eu não aceitava continuar com a penetração”, conta Regina.

“Tenho receio de que o companheiro não aceite

usar. Já aconteceu de um namorado dizer

que a camisinha irritava. Isso atrapalhava

o clima, porque eu não aceitava continuar

com a penetração”

Regina

Quando a saúde está em jogo, todo o cuidado é pouco. Usar a camisinha depende de cada um, mas no caso de dificuldades sexuais do parceiro (apontada como interferência negativa no desempenho de 14% dos homens e 9,9% das mulheres), o médico pode ajudar. No entanto, dos que sentem dificuldade para chegar ao orgasmo, dor na relação, ejaculação precoce e falta de ereção, só fazem tratamento 5,4% das mulheres e 7% dos homens. “Ambos deveriam cultivar o hábito de consulta anual ao ginecologista e ao urologista. Isso é mais necessário a partir dos 40 anos de idade, pois ajuda a prevenir doenças próprias do envelhecimento e a evitar que outras se tornem crônicas ou incuráveis”, adverte Carmita.

 

 

Dicas de livros

O Mapa do Amor

Ailton Amélio
Gente
312 páginas
R$ 34

O livro do professor da USP foi escrito com base em estudos nacionais e internacionais sobre assuntos como a capacidade de amar, os caminhos para iniciar um relacionamento amoroso e a seleção de parceiros. Além disso, analisa as táticas de paquera e os fatores que limitam o envolvimento, como a timidez.

 

O Descobrimento Sexual do Brasil

Carmita Abdo

Summos
144 páginas
R$ 31

A professora Carmita Abdo, psiquiatra, livre-docente da Faculdade de Medicina (FM) da USP e fundadora e coordenadora do Projeto Sexualidade (ProSex), trata de temas como orientação sexual, fidelidade e compromisso, hábitos sexuais, desejo, orgasmo e doenças sexualmente transmissíveis, entre outros. O livro é fruto do Estudo da Vida Sexual do Brasileiro, realizado com mais de 7 mil brasileiros de todas as regiões do País.