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Aziz Ab´Saber
por
Marcela Delphino


Foram apenas os dezessete primeiros anos de vida que separaram Aziz Nacib Ab’Sáber da Universidade de São Paulo, do vestibular à livre-docência ele nunca se desligou da USP. Nasceu e viveu em São Luís do Paraitinga, interior de São Paulo, até os seis anos, quando sua família se mudou para Caçapava, onde freqüentou o primário.

Para cursar o ginásio, ia todos os dias a Taubaté, “recebi aulas de professores bons e de ruins, abri meus olhos para o mundo e para as diferenças”. Quando foi inaugurado o ginásio em Caçapava, Ab’Sáber passou a estudar lá, onde as aulas de história eram dadas pelos primeiros alunos formados em São Paulo na recém-fundada Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH). foto:Francisco Emolo
 

Aos 16 anos veio para São Paulo, “vim sozinho, com muito pouca coisa, para um lugar frio que não conhecia”, recorda o professor. Mudou-se para uma pensão, começou a se preparar para o vestibular e se alistou no serviço militar. O grande esforço o fez adoecer e abandonar a faculdade por três meses, o que gerou a mudança de sua família para São Paulo.

 
Escola Caetano de Campos
Começou a ser aluno da FFLCH, em 1940, no terceiro andar da Escola Caetano de Campos, ao lado da Praça da República. O professor esclarece que sua entrada na USP foi graças à prova de desenho exigida na época. “Não sei por que eu achei que faria aquele desenho melhor que os outros. Nunca esqueço disso, porque foi só o desenho, e não a cultura que fez a diferença.”
 

A primeira atividade de Ab’Sáber como aluno da Universidade foi uma excursão que deixou São Paulo, passou por Sorocaba, Itu, Salto, Campinas e retornou a São Paulo. “Essa excursão foi definitiva na minha vida. Eu senti que iria me dar bem lendo a paisagem, e me decidi pela geografia.” Ainda hoje, Ab’Sáber faz essa excursão sucessivamente para estudar as cactáceas – plantas adaptadas a ambientes áridos – encontradas na região de Salto.

Depois dessa viagem já sentia que não poderia ser historiador. O que confirmou sua preferência por geografia foi perceber que para trabalhar com história eram precisos muitos livros e ele não tinha dinheiro nem para os cadernos.“Eu só passei a comprar livros anos depois, quando tive possibilidade de dar aulas no curso secundário.”

Aos sábados e domingos, Ab’Sáber pegava o bonde e ia até o ponto final, de onde partia sozinho para todas as direções de São Paulo. No futuro, os trabalhos sobre a região de São Paulo foram usados na preparação de sua tese de doutorado. “O curioso é que como comecei esse trabalho muito cedo, fica difícil acrescentar muita coisa a um outro que seja feito sobre ele.”


Em 1944, ao terminar a faculdade, começou a especialização que terminaria em 46, quando passou a fazer cursos de Geologia. Em um deles, foi notado pelo professor, que lhe arrumou uma vaga de jardineiro. Contratado pela USP, era responsável pelos canteiros entre os prédios das faculdades. “Era o jeito de colocar um pé nessa universidade, que era muito fechada”, relembra as palavras de seu professor. Depois de três meses, passou a Prático de Laboratório no Departamento de Geologia e Paleontologia da antiga Faculdade de Filosofia, cargo que ocupou até alcançar a livre-docência, quando passou a dar aulas de geografia física na USP.

Quando veio a ditadura, continuou fazendo suas pesquisas e ensinando de modo a não ser incomodado. “Mas não foi fácil, porque os alunos, não podendo brigar com os ditadores, brigavam com os professores que tinham mais títulos. Eu sofri muito com isso, pois eles colocavam a gente na direita, embora nós fôssemos mais socialistas do que eles”, enfatiza.

Nos últimos anos, passou a estudar geografia social. “Eu estudo as periferias, proponho instalações úteis para as crianças.” O geógrafo fez um projeto de minivilas olímpicas/clube da comunidade e, mais recentemente, organiza uma campanha por bibliotecas comunitárias, levando livros para os lugares mais diferentes.

foto:Francisco Emolo
Os livros são recolhidos e, depois, distribuídos em bibliotecas montadas em comunidades organizadas de bairro, em galpões de escolas de samba e em um presídio feminino. Ab’Sáber está caprichando nas bibliotecas, principalmente para os cursinhos pré-vestibulares. “Claro que existe um intervalo entre o uso dos livros e o hábito de leitura do grupo”, conclui o professor, que considera a educação elemento fundamental para a inserção social.
 

Toda essa trajetória só foi possível, porque o pai de Ab’Sáber, Nacib José Iunes, veio adolescente do Líbano e tornou-se mascate em São Luís do Paraitinga, visitando fazendas remanescentes do ciclo do café. “No meio dessa mascateação ele era muito querido e numa dessas viagens se encantou por uma pessoa muito simples, a minha mãe Justina.” O casal teve três meninos Aziz, Iusf e Luís. O geógrafo, pai de duas filhas, Janaína e Jussara, casou-se duas vezes e tem seis netos, todos com nomes indígenas, Iaci, Iandara, Cauê, Acauã, Iberê e Jassiara.

 

 
 
 
 
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