No dia 23 de setembro estréia nos cinemas Doutores da Alegria – o filme, que conta um pouco da história e do trabalho de 14 anos dessa ONG que já “atendeu” mais de 350 mil crianças em hospitais de todo o País. A intenção desse grupo de atores não é tratar ,muito menos curar o paciente, mas sim levar um pouco de diversão ao ambiente hospitalar.

“O clima dentro de um hospital é muito denso, sobrecarregado”, afirma o médico Valdenir Rezende, diretor do Instituto Central do Hospital das Clínicas da USP, “ninguém vem ao hospital porque quer, as pessoas vêm porque precisam”. Pensando nisso, há seis anos a direção do maior hospital da América Latina resolveu seguir a escola dos palhaços-doutores e estimular iniciativas para “humanizar” o ambiente no HC.

“Nós já tínhamos algumas ações isoladas, mas em 2000 o Ministério da Saúde lançou o Programa Nacional de Humanização Hospitalar, pedindo que os hospitais da rede pública tivessem representantes para sistematizar essas ações”, conta Nísia do Val Rodrigues Guimas, diretora do serviço social do HC. “O que nós fizemos foi juntar todas essas iniciativas e criar algumas outras.”

Uma dessas ações partiu da equipe de nutrição. Nas visitas diárias que faz aos quase mil leitos do HC, a equipe percebeu uma certa aversão à figura do médico, principalmente com relação às crianças. “Elas tinham um pouco de medo da enfermeira ou de qualquer pessoa de branco, porque na cabeça delas isso já remetia a coisas ruins, dor, etc.”, explica Nídia Denise Bucci, uma das nutricionistas.

Nós já tínhamos algumas ações isoladas, mas em 2000 o Ministério da Saúde lançou o Programa Nacional de Humanização Hospitalar, pedindo que os hospitais da rede pública tivessem representantes para sistematizar essas ações”

Nísia do Val Rodrigues Guimas

Foi no setor de internação de queimados, onde a alimentação é fundamental para a recuperação do paciente, que Luciana Solino, colega de Nídia, teve a idéia de criar um teatro de fantoches para “convencer” as crianças, de forma divertida, da importância de comer bem. “Nesse setor a maior parte dos pacientes tem entre um e dez anos de idade e chega a passar até dois meses internada”, conta. As nutricionistas, que até então se viravam para convencer os pacientes a comer bem, agora se vêem envolvidas na elaboração de histórias e exercícios de interpretação para levar adiante o projeto que já foi apresentado em congressos e está se tornando referência para outros hospitais.

As iniciativas, contudo, nem sempre partem da direção das instituições. Às vezes, são os próprios artistas que se organizam para levar um pouco de calor humano à frieza do hospital. Em 2002, quando o maestro Gil Jardim assumiu a direção artística da Orquestra de Câmara (Ocam) da USP criou o projeto
Música & Vida, que organiza apresentações dos músicos em diversos hospitais de São Paulo. Com cerca de dez apresentações por ano, a orquestra tem uma fila com dezenas de hospitais que querem receber o grupo.


“A profissão de músico é um mercado muito concorrido e hostil. A tendência dos alunos é de se isolar dentro de seu próprio mundo e atentar apenas para os problemas técnicos e da orquestra”, afirma o maestro, que leciona na USP há vinte anos e logo em sua primeira apresentação na direção da Ocam levou a orquestra para tocar na Casa do Zezinho, uma organização que atende adolescentes de baixa renda no Campo Limpo. “Eu sempre achei importante não perder a noção de quem você atende com a sua arte.


” A característica do projeto é se adaptar a estrutura do hospital em que vai tocar. Às vezes pode haver um auditório, mas em outras ocasiões os músicos se apresentam no corredor, hall de entrada e mesmo dentro dos quartos dos pacientes. Cerca de quinze dias antes da apresentação, os pacientes, na maioria crianças, já vão criando seus próprios instrumentos para “acompanhar” a orquestra. Chocalhos, latas e apitos são ouvidos ao lado de violinos, violoncelos e instrumentos de sopro, tocando músicas de desenhos animados, sítio do pica-pau-amarelo ou folclóricas.

Os resultados dessas iniciativas não são medidos por tabelas de recuperação ou trabalhos científicos, mas sim pelo sorriso no rosto de cada criança atendida, como foi o caso de uma paciente de sete anos do Hospital São Camilo que, após acompanhar a Ocam, disseram os médicos, saiu de um caso de depressão profunda. “A música vira um bálsamo para todos no hospital. Por ali passa o paciente, passa o funcionário, a enfermeira, os pais e todo mundo pára para ouvir a música”, conta Andréa (?), funcionária da orquestra.





Doutores da Alegria – o filme
A diretora Mara Mourão conta a história dos Doutores da Alegria, ,transporta o espectador para o dia-a-dia dos hospitais e registra a transformação provocada no ambiente com a chegada desses especialistas em “Besteirologia”. O encontro entre o palhaço e a criança altera as relações sociais, fazendo rir e pensar ao mesmo tempo. São cenas divertidas, depoimentos tocantes registrados em hospitais como Hospital das Clínicas, Hospital da Criança e em lugares distintos como Bolsa de Valores, Mercado Municipal e fábricas. A trilha sonora foi especialmente composta pelo músico Arrigo Barnabé.