APESAR DE SER A PRINCIPAL CAUSA DE CEGUEIRA NO PAÍS, A CATARATA É TOTALMENTE REVERSÍVEL E MAIS FÁCIL DE SER PERCEBIDA QUE O GLAUCOMA, DOENÇA ASSINTOMÁTICA

Principal causa de cegueira no Brasil, a catarata é uma doença completamente reversível. Isso quer dizer que muitas pessoas não recuperam a visão simplesmente por falta de informação. “A pessoa cega por causa da catarata pode voltar a enxergar se for operada. Então, é um problema social de conscientização e de acesso do necessitado ao tratamento”, afirma o oftalmologista Newton Kara José Jr., coordenador do Setor de Catarata do Hospital das Clínicas de São Paulo (HC) e professor da Faculdade de Medicina (FM/USP). Num estágio da vida, todo mundo terá catarata, o que vai depender é seu grau. Uma outra causa de cegueira é o glaucoma, doença assintomática e irreversível.

foto:Cecília Bastos
“A pessoa cega por causa da catarata pode voltar a enxergar se for operada. Então, é um problema social de conscientização e de acesso do necessitado ao tratamento”

Newton Kara José Jr.

Quando se fala em cegueira, em geral, pensa-se em tudo escuro, mas a definição não é exatamente essa. “Existe uma porcentagem de visão, um limite a partir do qual consideramos como cegueira, que não precisa ser o preto total”, explica Kara Jr. O glaucoma e a catarata estão muito ligados à idade, a incidência maior está entre as pessoas com mais de 50 anos. Para explicar o que é a catarata o professor Kara Jr. compara o olho a uma máquina fotográfica, “o cristalino seria a lente, que é a estrutura responsável por focar os diversos raios que chegam aos olhos na retina, que seria o filme. A catarata é a opacidade do cristalino, ao invés de ele ser transparente, fica opaco e os raios não conseguem chegar na retina, que fica embaçada”.

“Foi muito bom operar. Quem tiver catarata não deve esperar, demorei um pouco e meu caso complicou porque também tive glaucoma”, conta Flávio dos Santos, de 80 anos, que trabalhou com desenho e fotografia no Departamento de Agricultura da Esalq, até se aposentar. “Sempre vamos deixando para mais tarde, é a velha história da comodidade. Como enxergava melhor com o olho direito, demorou para perceber a catarata no esquerdo”, conta Santos, que hoje usa colírio diariamente e não deixa de visitar o oftalmologista. “Sempre usei muito a visão, trabalhando com pinturas, desenhos e fotografia. Continuo lendo e assisto a filmes todas as noites. Posso, inclusive, ler anúncios e placas de trânsito.”

“Foi muito bom operar. Quem tiver catarata não deve esperar, demorei um pouco e meu caso complicou porque também tive glaucoma”

Flávio dos Santos


A catarata é mais fácil de ser percebida que o glaucoma, porque os sintomas de diminuição da visão são mais precoces. “Se manifestam principalmente com a claridade, é como se houvesse uma nuvem na frente do olho e as cores ficam mais apagadas”, detalha o professor da FM/USP, que alerta ainda para a possibilidade do aumento do grau de miopia ou diminuição do grau de hipermetropia. Mesmo assim, não é fácil fazer o diagnóstico sozinho, é preciso consultar um oftalmologista. O importante é que depois de operado, o paciente está curado. “Operei o olho esquerdo no HU, foi ótimo, estou enxergando perfeitamente”, comemora Arlindo de Sá, que trabalhava no Matadouro-escola do campus de Pirassununga. Hoje, aposentado, ele conta que “antes da cirurgia era difícil de ler.”

foto:Cecília Bastos

O glaucoma, por sua vez, “é a elevação da pressão intra-ocular, o que prejudica o nervo óptico, responsável por levar a informação dos olhos para o cérebro”, explica Kara Jr. Existem vários tipos de glaucoma, o mais comum é totalmente assintomático, “só se iniciam os sintomas quando estiver bem avançado e pouco se puder fazer. A única forma de prevenção é fazer exames periódicos. Depois dos 50 anos, uma vez por ano”. A maioria dos casos se resolve só com
colírios, não sendo necessário intervenção cirúrgica. Segundo Kara Jr., o atendimento a quem tem acesso ao oftalmologista é muito bom, o problema são as pessoas que não têm acesso, devido, principalmente, à falta de educação. “Somos 14 mil oftalmologistas no Brasil, é até mais do que o País precisa e estamos relativamente bem distribuídos.“

“Operei o olho esquerdo no HU, foi ótimo, estou enxergando perfeitamente”

Arlindo de Sá


“No começo fiquei com medo, nunca tinha passado por uma cirurgia desse tipo. Mas tomei coragem e valeu a pena”, conta Oscar Negretti, que trabalhou como mestre de marcenaria na Instituto de Genética da Esalq. “Foi bom por dois motivos, não senti nada e clareou a minha visão”, conta Negretti, hoje com 81 anos e aposentado. “Percebi a catarata porque a visão estava ficando embaçada e cada vez pior. Parecia que estava sempre cerração”, completa. Segundo o professor Kara Jr., “o consumo de vitaminas C e E e sais minerais, com ação antioxidante, podem levar ao retardo na evolução da catarata, assim como o uso de óculos escuros para diminuir a exposição à radiação ultravioleta”.

A cirurgia de catarata é feita com uma pequena incisão de 2,5 mm na córnea, entra um aparelho que vai aspirar o cristalino dentro do olho. Implanta-se uma lente sintética, não precisa dar ponto e a anestesia é só colírio. O procedimento é muito disponível nos hospitais-escola, o HC, por exemplo, realiza 600 por mês. “É uma cirurgia relativamente barata e o hospital tem interesse em fazer porque é rápida, dá para fazer bastante”, afirma Kara Jr. A aparelhagem moderna está distribuída em várias instituições ao longo do Brasil, então “não falta oftalmologista nem capacidade instalada para ser feita a cirurgia com qualidade, o que falta é a população realmente se conscientizar e conseguir chegar ao hospital”. Além disso, existe a necessidade de elaboração de políticas governamentais para financiar de forma irrestrita a cirurgia, porque em muitos lugares o teto dessa cirurgia é pequeno; o hospital até poderia fazer mais, mas o governo não autoriza além de um certo teto relativo ao repasse do SUS.


São realizadas aproximadamente 400 mil cirurgias de catarata por ano no Brasil, “calculamos que precisaria de 600 a 800 mil para conseguir pelo menos compensar os casos novos que aparecem anualmente”, afirma Kara Jr., “Não estamos mais aumentando o número de cirurgias, porque faltam políticas governamentais de incentivo a isso. Os hospitais estão ociosos, porque o SUS não tem em geral repassado o total de cirurgias, limitando seu número.” No HC, a cada dois meses é feito um mutirão do Projeto Catarata para pessoas que acham que enxergam mal. “Basta comparecer no sábado do projeto e se houver indicação cirúrgica a pessoa é operada, no máximo, até dois meses depois.” O próximo mutirão será em janeiro do próximo ano.

Setor de oftalmologia do HC – 3069-6289