Parcelamentos a perder de vista, cartões de crédito, lojas na internet e uma vasta linha de facilidades tecnológicas permitem à população mais acesso ao mundo do consumo. Diante de muitos estímulos e devido à mudança no perfil da sociedade, os brasileiros caminham por uma estreita linha que separa o lado racional do compulsivo na hora das compras.
“Uma grande leva de portadores de cartões, que antes só faziam uso para o saque, passou a utilizá-los no pagamento de compras feitas na hora”, afirma Antonio Luiz Rios, gerente de marketing da Abecs. “Os cartões já são a segunda opção de pagamento, ultrapassando os cheques. Com novas tecnologias, especialmente as ligadas às comunicações sem fio, eles estão mais próximos do usuário, permitindo que a utilização chegue até a feiras livres, barracas de praias e entregas em domicílio.” Mas, apesar da comodidade, um dos efeitos causados no imaginário das pessoas, quando realizam uma compra via cartão, é a idéia do irreal ou abstrato, isto é, a falsa impressão do dinheiro não saindo do bolso. Sobre isso, a professora de Marketing da FEA (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade) Ana Akemi Ikeda comenta: “Os efeitos da tecnologia atingem a sociedade e falta muita educação e consciência sobre o que esses novos meios significam. O mais comum é ver pessoas tomando susto quando vêem seus extratos no final do mês. Ainda esquecem de somar juros e medir o risco de fazer dívidas com parcelamentos longos”.
Alguns grupos, denominados consumeristas, procuram aliviar as tendências ao consumo exagerado. Eles apontam a conscientização das massas como responsável por um freio no contínuo processo de compras sem interrupção. Em um contexto maior, eles citam o desenvolvimento sustentável para evitar a futura exaustão do ambiente. “O próprio uso do copinho de plástico para tomar café é um conforto que custa caro. Ele aumenta a produção de lixo e requer matéria-prima para fabricação. Porém, no Brasil, os impactos ambientais têm pouca visibilidade por ocorrerem num país com dimensões continentais e riqueza de recursos muito grande. Então as organizações consumeristas não conseguem se manifestar com expressão”, diz a professora. A compra compulsiva acontece durante a procura irresponsável e/ou desnecessária e impossível de controlar por bens diversos. Nesse caso, o indivíduo não focaliza o produto alvo da compra, mas a ação da compra. Ao contrário, o consumo compulsivo se refere à busca incessante por determinada categoria de bens.
“Às vezes lamento pela economia que eu poderia ter feito. Já ocorreu de comprar vestidos quase iguais aos que tinha em casa, ou então levar uma peça apertada jurando que ia emagrecer. Mas depois tive que me desfazer deles por não terem uso”. Crime e castigo: Apesar da atividade da compra ser associada a ganhos, nem sempre é o que ocorre. A professora Ana cita estudos feitos ao longo da segunda metade do século 20. Eles mostram que muitos consumidores ficam apreensivos pela possibilidade de outros descobrirem a compra fútil que eles fizeram. A partir daí aparecem sintomas como tensão, timidez e comportamento explosivo. Outro ponto volátil é a função compensatória. Para espantar a baixa auto-estima, insegurança e outros déficits emocionais, o sujeito vai às compras. No entanto, a satisfação se esvazia quando ele percebe a inutilidade da aquisição e os gastos desnecessários. Ana reconhece que as mulheres gastam mais com itens supérfluos. “Já ouvi uma explicação com origens distantes para o caso: o homem, historicamente, esteve incumbido de sair para caçar. Por isso ele é mais objetivo, tem um alvo, uma presa em mente. As mulheres, que ficaram responsáveis pelo lar ou pela coleta, aprenderam a vasculhar o ambiente. Com essa noção incorporada, é normal que demoremos mais nas lojas”, garante.
A movimentação do mercado aumentou significativamente nos últimos 50 anos com o processo de consolidação da independência feminina: “Antes a mulher dependia do dinheiro do pai ou marido. Hoje ela tem o próprio salário e gasta como quer”, diz a professora. Outro público incluído foi o universitário. “Os bancos passaram a dar crédito para os jovens. Quando estão na faculdade, eles ainda são todos duros. Porém, em pouco tempo se tornam profissionais qualificados nos mais diversos segmentos e adentram numa classe social alta e financeiramente próspera.”
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